São Paulo, domingo, 06 de julho de 2008

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Inexperiência do mercado trava evolução do marketing

BOMBARDEIO DE MARCAS E FALSIFICAÇÕES CONFUNDEM PÚBLICO CHINÊS E DEVEM ESTABELECER EM PEQUIM RECORDE DE DESPERDÍCIO DE VERBAS DE PROPAGANDA EM OLIMPÍADAS: US$ 1 BILHÃO

Frederic J. Brown - 28.set.06/France Presse
Em Pequim, pedestres passam por outdoor com propaganda da Nutrilite estrelada por Liu Xiang

FÁBIO SEIXAS
EDITOR-ADJUNTO DE ESPORTE

O bombardeio começou em 2001. O estopim, a escolha de Pequim como sede dos Jogos. O alvo, o mercado chinês, com 1,3 bilhão de habitantes, 290 milhões deles classificados como "de alto poder aquisitivo". Um eldorado que repentinamente se abriu para as marcas ligadas à Olimpíada.
Mas repleto de armadilhas.
Da mesma forma que o esporte chinês busca transformar potencial em realidade, o marketing esportivo ainda não adquiriu uma expressão. As receitas que funcionam no Ocidente nem sempre resolvem na China. O resultado é desperdício.
Valor estimado em US$ 1 bilhão só em ações de marketing olímpico em território chinês.
A conta é do grupo britânico Fournaise, um dos líderes mundiais em estudos de retorno de ações de marketing.
No mês passado, o Fournaise divulgou o resultado de seu Relatório de Efetividade dos Patrocínios Olímpicos. Segundo o estudo, dos US$ 5 bilhões gastos pelos patrocinadores oficiais de Pequim-2008 antes da Olimpíada, US$ 1 bilhão não gerará retorno. Irá para o lixo.
A exemplo dos últimos Jogos, há duas classes de patrocínio. São 12 cotistas "top", que terão suas marcas mais visíveis. E há 11 cotistas de segundo nível, parceiros da organização.
Segundo Jerome Fontaine, CEO do Fournaise, 75% das campanhas ligadas aos Jogos nos últimos meses não tiveram os resultados esperados na China. A média no país é 40%.
"Pequim deve bater o recorde de desperdício de patrocínios esportivos da história do Movimento Olímpico", afirma Fontaine. "Nas empresas que investiram, isso já gera batalhas entre os marqueteiros e o pessoal da área financeira."
O xis da questão está no amadurecimento incipiente do consumidor chinês, problema que foi escancarado em pesquisas de lembrança de marca.
Ouro chinês mais valorizado em Atenas, nos 110 m com barreiras, Liu Xiang tem como patrocinador a Nutrilite, marca de suplementos alimentares. Nas pesquisas com o público chinês, porém, outras 20 marcas que nunca tiveram relação com o astro foram mais citadas.
Outra pergunta da pesquisa, que ouviu 1.500 pessoas em cinco cidades do país, pedia para os chineses espontaneamente mencionarem marcas patrocinadoras da Olimpíada. Entre os entrevistados, 85% não conseguiram citar 2 das 12 marcas principais. E apenas 9% conseguiram lembrar de uma das nove patrocinadoras chinesas.
"Há uma derrama de publicidade em um universo que entrou há pouco tempo no mercado. É difícil entender o quanto desse público tem alguma percepção de marca e o quanto simplesmente não tem percepção nenhuma", declara Marco Aurélio Klein, professor de marketing esportivo da Fundação Getúlio Vargas. "E há outro complicador: os produtos falsificados, que só aumentam a confusão", completa.
Diretor de marketing esportivo do escritório brasileiro da Momentum, multinacional envolvida em ações na China para clientes como Coca-Cola e Johnson & Johnson, Alessandro Martinelli avalia que o conhecimento de marcas dos chineses ainda é muito baixo.
"A relação esporte-marcas é quase inexistente. Estive na Universidade de Pequim, um dos centros de formação de atletas, e não vi uma marca de nada. Vi apenas referências ao governo", afirma Martinelli.
Segundo ele, a Coca-Cola só conseguiu sucesso em uma de suas campanhas porque se empenhou em ações locais.
"Houve um envolvimento absurdo da população, mas porque foram feitas ativações locais da marca. Hoje, o sistema tradicional não funciona."
Ironia diante da luta chinesa para se inserir no mundo moderno. Ou capricho de quem sabe ser gigante. E, talvez, o início da resposta que os marqueteiros buscam e que pode mudar não só o mercado como a cara do esporte olímpico.


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