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Má educação
Repetência deixa de ser exceção
MAIS DA METADE DOS JOVENS BRASILEIROS JÁ REPETIU O ANO; ÍNDICE DE REPROVAÇÃO É
ALTO MESMO NAS CLASSES A E B
[Por Antônio Gois, da Sucursal do Rio, e Gustavo Hennemann, Colaboração para a Folha]
Um país que ostenta uma das
maiores taxas de reprovação do
mundo não poderia produzir outro
resultado que não o revelado
pelo Datafolha: mais da metade
(54%) dos jovens brasileiros já
repetiu o ano na escola.
Esse percentual é maior entre
homens, nordestinos e mais pobres.
O problema, porém, não é
restrito a esses grupos. Quase metade
(44%) dos jovens das classes
A ou B, por exemplo, já repetiu.
Índices tão altos talvez tivessem
justificativa caso isso melhorasse
a qualidade da educação
brasileira. Não é o que acontece,
como lembra Ruben Klein, da
Fundação Cesgranrio. "Se repetência
funcionasse, o Brasil teria
indicadores maravilhosos na
educação. A escola tem que funcionar
para que todos aprendam
e não sejam reprovados."
Para a professora da Faculdade
de Educação da USP (Universidade
de São Paulo) Sílvia Colello,
os altos índices de repetência resultam
da falta de diálogo entre
o jovem e a escola. "De um lado,
há um jovem que não valoriza o
saber. Do outro, escolas que dialogam
pouco com a realidade do
aluno. O saber tem de ter sabor.
Um desafio dos professores é recriar
esse sabor."
Giovanna Cappellano de Carvalho,
16, que repetiu o primeiro
ano do ensino médio em um colégio
privado de São Paulo em
2006, diz que a relação com os
professores influencia muito no
seu desempenho. "Se o professor
dá uma aula que me envolve,
presto atenção e faço o que ele pede."
Ela conta que brigava muito
com a professora da disciplina em
que reprovou. Mas assume sua
responsabilidade. "Vi que estava
perdendo tempo e amadureci."
O pai de Giovanna, Marcelo de
Carvalho, 41, diz que, após a reprovação,
decidiu mudar a filha
de escola e matriculá-la em cursos
técnicos. "Ela desenha bem,
gosta de arte, de moda."
Para ele, a reprovação também
teve efeitos positivos. "Você joga
uma grana fora e expõe falhas no
relacionamento com os filhos.
Mas foi uma ruptura. Ela percebeu
que a própria irresponsabilidade
causou coisas ruins."
Apesar de concordarem que a
reprovação deve ser combatida,
diretores de escolas particulares
de São Paulo afirmam que, em
alguns casos, reter um estudante
pode ser positivo.
"Uma reprovação não cai de
pára-quedas", diz Fátima Trindade,
diretora-geral do Colégio Pio
XII. Ela considera que muitas vezes
a reprovação faz o aluno rever
decisões e escolhas.
Para o diretor-geral pedagógico
do Colégio Dante Alighieri,
Lauro Spaggiari, o aluno pode ganhar
segurança e passar a render
mais. "Quando a família e a escola
apóiam, ele se sente mais forte e
percebe que era necessário."
Coisa de menino
Os números do Datafolha mostram
que os meninos repetem
mais do que as meninas: enquanto
63% deles já reprovaram, entre
elas o índice cai para 46%.
"Temos uma cultura de escola
primária que é mais feminina,
que valoriza o asseio, o comportamento,
enquanto o menino é
mais beligerante, mais ativo", diz
o coordenador do programa de
pós-graduação em educação da
USP, Romualdo Portela.
Sílvia Colello também vê influência
cultural. "A mulher é mais
incentivada a ser dócil e a lidar
com as regras do jogo. Mas isso
não signifi ca que aprenda mais",
afirma a professora.
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