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Nuzman
Folha - Investiu-se no esporte
brasileiro dinheiro que o esporte
brasileiro jamais teve. Parece lógico que a cobrança suba de maneira
proporcional a isso...
Carlos Arthur Nuzman - Depende
da ótica. Se eu colocar R$ 200 milhões nas mãos de jovens e disser:
"Vocês agora vão aprender e ser
médicos". Nesse espaço de tempo
eles não vão ser médicos.
Não posso estar nunca de acordo que entra um dinheiro, e o resultado tem que aparecer agora.
Vou falar com resultados. O voleibol: eu fiz três gerações vencedoras porque tinha base, estrutura administrativa, técnica. Não
sou nenhum santo, nenhum inventor. Para cada geração dessa,
você teve: medalha de prata de
Los Angeles começou em 75 para
76, nós tivemos oito para nove
anos. A equipe campeã olímpica
de 92 começou em 82, são dez
anos. A equipe campeã mundial
de 2002 começou seu trabalho na
faixa de 1990, 92. Você está falando de dez anos para 12 anos. É a
média dos esportes estruturados.
Folha - E o sr. está no cargo há nove anos.
Nuzman - Sem dinheiro, não
adianta contar o número de anos.
Folha - Em nenhum momento da
história olímpica brasileira alguém
teve tanto dinheiro como o sr. agora. Num país que tem muitas prioridades para investir e que tomou a
decisão de investir no esporte. É
natural que o país faça essa discussão e que vá cobrar resultado.
Nuzman - Aceito qualquer discussão. Se você quer colocar que
eu recebi muito dinheiro e que os
resultados são ruins, você coloca
como quiser. Apenas vou me dar
o direito de dizer o que eu acho.
Não é um problema de ter ou não
cobrança. A análise, na minha
opinião, deve ser equilibrada.
Folha - O que é uma análise equilibrada?
Nuzman - Você vai dizer que
confederações existiam na mala
do carro, que não tinham nenhum funcionário? Não vai.
Folha - Mas não tem hoje nenhuma confederação dentro da mala
do carro, certo?
Nuzman - Há dois anos ela tem
sede. E aí ela tem que se preparar
administrativamente e depois tecnicamente, formar seus técnicos,
e dos seus técnicos ter um número de atletas que ela possa desenvolver um trabalho, e que os resultados possam aparecer.
Folha - E quanto tempo demora
para começar a aparecer?
Nuzman - Eu sempre disse isso: é
uma faixa de dez a 12 anos. Disse
isso à Folha não tem o quê: quanto tempo tem aquela entrevista?
Folha - Mas não é estranho o sr.
ter dito isso em 29 de junho de 95,
quando tomou posse, e dizer isso
de novo hoje, nove anos depois?
Nuzman - Nunca disse que uma
matéria é mentirosa. Aprendi isso: não reclamar de árbitro e de
matéria. A única coisa que eu tenho é: você não pode botar na minha boca o que eu não disse.
Folha - Mas, por exemplo, tem
aqui: Folha, o "Globo", o "Estado"
e a "IstoÉ"...
Nuzman - Sim, mas escuta, sem
dinheiro...Quanto dinheiro tinha
no cofre do comitê, na conta,
quando eu assumi?
Folha - O sr. que me conta.
Nuzman - Qual o dinheiro que tinha para a Olimpíada de Atlanta,
um ano depois? Essa é fácil. Se não
tiver na Folha, eu lhe digo.
Folha - O sr. que me diz.
Nuzman - De cabeça eu não sei.
Se você achar que esse número
transforma o Brasil numa potência olímpica, eu vou duvidar da
sua capacidade de analisar.
Folha - Não há nenhuma comparação possível com Sydney do dinheiro que o sr. teve agora.
Nuzman - Ah, isso não tem. De
forma nenhuma.
Folha - Não é estranho, na cabeça
das pessoas, em resultados: por
que a gente botou...
Nuzman - Como um sujeito vai
ser médico? Fez vestibular, no dia
seguinte está sendo um grande cirurgião?
Folha - Esse não é um discurso
muito simplista? Essa é a sua terceira Olimpíada, e a qualquer momento de cobrança de resultado o
sr. fala que tem que esperar de novo um tempo de maturação.
Nuzman - Não estou dizendo
que deve esperar um tempo de
maturação, se é a primeira, se é a
segunda, quinta ou sexta Olimpíada. O que deve ser analisado
são as condições. E o que eu quis
dizer com o médico é que você
não transforma um atleta do nada
em um medalhista.
Folha - Mas o Brasil saiu de 12 medalhas em Sydney. Não é normal as
pessoas esperarem um salto?
Nuzman - Para ganhar medalha
olímpica, tem que ter resultados
sul-americanos, em competições
internacionais, no Pan-Americano, uma longa escalada. Até porque, esse dinheiro que você acha
que é tanto, eu quero lhe dizer
quanto tem a Austrália: US$ 100
milhões/ano. Os EUA têm um
pouco mais de US$ 100 milhões.
Folha - E nenhum centavo público.
Nuzman - Mas ganha US$ 240
milhões do Comitê Olímpico Internacional.
Folha - Também não é dinheiro
público. Em nenhum deles você está tirando dinheiro do hospital para dar para o esporte.
Nuzman - Isso é você que está dizendo. Se você pegar o diagnóstico do esporte brasileiro, feito no
ano 2000, para que o Brasil possa
se transformar numa potência
olímpica, são R$ 103 milhões/ano,
com aumento de 10% ao ano, você vai ver que esse recurso da lei
Agnelo/Piva representa 35% a
40% desse valor. Não é com esse
dinheiro que vamos transformar
o Brasil em potência olímpica.
Folha - Mas é mais dinheiro que o
Ministério do Esporte tem hoje.
Qualquer gerente é cobrado por resultados, ainda mais uma pessoa
que tem milhões...
Nuzman - Sim, o problema que
existe é que para fazer uma escalada de crescimento você tem que
aguardar. Se eu pegar o voleibol, a
geração que foi medalha de prata:
o Brasil foi sétimo na Olimpíada
de 76, sexto no Mundial de 78,
quinto na Olimpíada de 80, vice-campeão do mundo e olímpico
em 82 e 84. Se essa entrevista estivesse sendo feita no ano de 1980,
estaríamos conversando o seguinte: tinha que ter um resultado
melhor em Moscou. Já devia ter
uma medalha em 80. Só que não
era ainda o momento.
Folha - Dentro desse raciocínio, o
sr. considera natural o Brasil ter um
resultado em Atenas com menos
medalhas do que Sydney?
Nuzman - Não vou falar de medalhas. Vou dizer: a melhoria do
esporte brasileiro é qualitativa.
Melhoria de um todo. Se você vir
os resultados em Sydney, não estou falando de medalhas...
Folha - Está falando de quê?
Nuzman - Estou falando de uma
maneira geral.
Folha - O que é uma maneira geral?
Nuzman - Quem era 50º e está
em 30º, ele está melhorando.
Folha - Mas o Brasil caiu de posição em Sydney. Então não se pode
falar isso no quadro de medalhas.
Nuzman - Você acha que o Brasil
foi pior do que a Turquia, que teve
quatro ouros num esporte? Criticar é fácil. Por isso estou procurando colocar de uma maneira
que não haja injustiça.
Folha - O que é um critério justo?
Nuzman - É ter equilíbrio na análise, pesar o que entrou de recurso, o que ele pôde treinar, a capacidade que tem de absorver.
Você faz a horizontalidade, entre dinheiro, estrutura, ter técnicos, atletas e poder participar de
uma preparação que seja equiparada às melhores forças do mundo para que ele possa amanhã ser
analisado. Isto leva tempo.
Folha - Nessa equação do sr. não
entra resultado.
Nuzman - Para melhorar e chegar a uma busca de medalhas, ele
vai ter que escalonar e ter resultados. Esses resultados devem ser
levados em consideração quando
se analisa certa modalidade.
Não vou dizer que todas as modalidades evoluíram. Nem tenho
essa obrigação. Vou defender que
a maioria melhorou, teve aumento com resultados qualitativos. Se
isso vai ser traduzido em medalha
ou não, é outra questão.
Folha - Esse raciocínio que o senhor aplica para cada um aplica-se
para o "sujeito" Brasil.
Nuzman - Estou de acordo.
Folha - Aí volta a pergunta inicial.
Caso o Brasil não apresente essa
melhoria, isso é resultado natural?
Nuzman - Não vamos fazer entrevista de "se". O "se" deixou de ser
campeão uma porção de vezes.
Folha - Pergunto "se" porque o senhor não colocou objetivo.
Nuzman - Estou colocando: o
objetivo é melhoria qualitativa.
Folha - O investimento feito agora vai ter um retorno em resultado?
Nuzman - O resultado é uma melhoria qualitativa do esporte olímpico brasileiro. Posso dizer agora
que já houve uma melhoria. O
Brasil aumentou o número de
modalidades, que é o recorde, o
recorde de número de atletas, especialmente a rama feminina. É
um resultado inquestionável. Não
estamos falando de medalhas.
Nós tínhamos "X" modalidades,
agora temos "X mais não sei o
quê", tivemos um número de atletas de 225 de Atlanta, 205 de
Sydney, agora 240 e poucos. Essa
é uma melhoria qualitativa.
Folha - Isso é fruto da lei Piva?
Nuzman - Vamos colocar que é
fruto de um trabalho das confederações, não se pode tirar o mérito
do trabalho das confederações.
Agora, é óbvio que os recursos da
lei Agnelo/Piva foram importantes, cruciais, porque passaram a
ter regularidade em termos de os
valores chegarem às confederações mês a mês. Então você pode
ter planejamento, projetos, uma
execução que te permite cobrar,
analisar, dizer se está bem feito ou
se está malfeito, individualmente.
Folha - O que seria um bom resultado em Atenas?
Nuzman - Veja bem: não estou
em momento nenhum deixando
de respeitar essa nossa entrevista
em não querer dar a vocês um resultado numérico de medalhas.
Só que eu nunca fiz isso, nem na
minha época do voleibol. Nem
quando tinha chances de ser medalhista olímpico.
Folha - Mas o sr. pensa nisso?
Nuzman - Nunca. Se eu te disser:
nunca escrevi, nunca parei e disse:
aquele cara de repente pode ganhar uma medalha. Longe disso.
Folha - Mas na entrevista, por
exemplo, no dia 1º de outubro [de
2000, quando foi feito o balanço da
campanha em Sydney], o sr. falou
que esperava 12 medalhas.
Nuzman - Onde eu disse isso?
Folha - Tem a declaração no jornal.
Nuzman - Escuta: é uma maneira
de falar de uma concepção. Você
vai para uma Olimpíada de Atlanta, para uma de Sydney, que teve
dificuldades maiores, fuso, temperatura, às vezes você leva isso
em consideração. Mas eu não
penso em número de medalhas,
não tenho classificação de quem
vai para a final, quem não vai, isso
não está na minha cabeça. Não
sofro antecipadamente.
Folha - Qual a maneira de medir?
Se não é medalha, como o sr. vai
poder dizer: foi um bom resultado
ou não foi um bom resultado?
Nuzman - Você quer que eu seja
muito franco com você?
Folha - Por favor.
Nuzman - Você vai pegar modalidade por modalidade, vai fazer
uma análise do que ela era, do que
ela é e o resultado que ela obteve.
Aí você vai ver que essa modalidade que está num crescimento inequívoco, e que por qualquer motivo, ganhou ou não ganhou medalha, esse resultado não pode ser
desmerecido, porque esse esporte
está em crescimento. Essa, para
mim, é a análise que eu faria.
Folha - Então é melhorar a colocação?
Nuzman - Melhorar a colocação
de cada modalidade. Isso quando
eu digo que é a melhoria qualitativa, é isso, a qualidade. Fui décimo
e agora fui oitavo. Eu melhorei.
Folha - O COB precisa ficar com
um terço do dinheiro do esporte
em vez de o dinheiro chegar na
ponta, chegar ao atleta?
Nuzman - Não quero que vocês
digam: "Pressão dentro das quadras, piscinas e pistas, com essa
porcaria de estrutura que tem". É
proporcional. Pegue quantos funcionários nós temos, quanto a
gente gasta, e compare com ministérios, outros comitês.
Você sabe como eu tenho que
me estruturar financeiramente
para prestar contas ao TCU? Eu
tenho um departamento de contabilidade e um departamento financeiro. Porque na hora que der
o problema, que eles vão lá para
fazer auditoria. Mandam auditores, pegam a documentação inteira, e temos que ter gente analisando isso tudo, dia a dia, porque a
rotatividade de gastos é diária. Temos 28 confederações e mais 2 de
esportes de inverno. O número de
funcionários que nós temos hoje é
pouco. Deveríamos ter mais. Só
que não posso gastar mais.
Folha - Mas não é estranho ter
uma proporção tão grande sendo
gasta longe das quadras, não tem
um problema maior então?
Nuzman - Quantos funcionários
tem a Folha de S.Paulo, quanto a
Folha gasta para poder colocar o
jornal na rua, no nível que coloca?
Folha - Não tenho a mínima idéia.
Nuzman - É só pegar quantos a
Folha manda à Olimpíada. Será
que a Folha precisa de tanta gente
na Olimpíada, em detrimento de
outros coitados de jornais?
Folha - É uma boa pergunta, assim como a pergunta que eu fiz.
Nuzman - Então nos devemos
respostas.
Folha - Mas o entrevistado é o sr.
Nuzman - Mas eu também tenho
direito de entrevistar. Não é possível que eu não tenho o direito. Eu
fui fazer faculdade de jornalismo
para poder aprender o outro lado.
Não vamos buscar, não vamos
descobrir o milagre da multiplicação dos pães. A estrutura que nós
temos, ela é clara, são prestadas
contas, ninguém ganha absurdo
de dinheiro, nós temos um plano
de cargos e salários aprovado pelo
tribunal de contas.
Montar uma prestação de contas dessas é um troço gigantesco.
Eu não quero ser melhor do que
ninguém. Eu não quero é ser pior.
Se eu errar, vou errar sem ter o
dolo, errar como qualquer um erra. Como qualquer um de nós faz.
Folha - O TCU teve dificuldade em
analisar as contas relativas à lei Piva. Como está a prestação de contas das confederações, das passagens aéreas?
Nuzman - Eu não vou discutir
critérios com o Tribunal de Contas da União pelo jornal. Nenhum
documento nosso de prestação de
contas é feito sem que nós apresentemos a origem. Tipo de contrato de aluguel, nós fazemos. Tipo de recibos, nós fazemos.
Nós gastamos 29,9 [% da Lei Piva] em passagens [em 2003]. Nós
não, as confederações. É um nada.
Se você não fizer intercâmbio, e
para fazer intercâmbio tem que
viajar, pagar passagem aérea, você tem confederações, que têm
patrocínios, que usam só para para passagem aérea, porque é mais
fácil prestar contas.
Folha - Mas a questão talvez seja
menos de volume e mais do fato de
haver ou não uma licitação.
Nuzman - Como? Claro que tem.
Existe uma licitação. Nós apresentamos sempre. A gente teve os
melhores preços que tem no mercado, nenhuma companhia pode
dizer o contrário. Nós temos os
preços de cada uma delas.
Folha - A atual de vocês é a Tamoyo, certo?
Nuzman - Isso é agência. Isso é
outro. Preço é: pode ser a Varig,
pode ser a Lufthansa, pode ser a
TAM. A agência não altera, o que
vale é o preço que está cobrando a
companhia aérea.
Folha - Isso não é licitação, é uma
cotação normal de agência, não?
Nuzman - Ela faz, tem que fazer.
Folha - É a Tamoyo que faz licitação para o COB?
Nuzman - Faz, faz.
Folha - E o COB faz alguma licitação para a Tamoyo?
Nuzman - Faz.
Folha - E há quantos anos ela é a
agência do COB?
Nuzman - Não sei se tem dois
anos.
Folha - Mas ela não foi para
Sydney já? Ela estava em Sydney.
Nuzman - Estava em Sydney.
Mas a gente está falando da lei.
Em termos da lei...escuta, a agência não muda, entendeu?
Folha - Então não há licitação para a agência.
Nuzman - Há.
Folha - Então por que não muda?
Nuzman - Porque ela ganha.
Folha - Mas se há uma licitação,
existe a possibilidade de mudança.
Por que o sr. está dizendo que ela
não muda?
Nuzman - A licitação que tem, eu
até posso te dar o modelo como é
feito. Existe um modelo que é feito que o TCU aprova. A gente faz
dentro da legalidade que tem.
Folha - Então por que mesmo assim ela nunca muda então?
Nuzman - Se ela ganha, e ela continua...Por que que vai mudar, se
ela está ganhando? Por que vai
mudar?
Folha - Mas por que o sr. falou "a
agência não muda"?
Nuzman - Como a agência não
muda?
Folha - O sr. acabou de dizer.
Nuzman - Não muda, não. As
companhias mudam, porque têm
períodos de alta e de baixa. Ela faz
a licitação e tem os documentos
todos.
Folha - Essa licitação que o sr. diz
que é feita vale até quando?
Nuzman - Acho que até o fim do
ano.
Folha - Então vai fazer uma nova?
Nuzman - E sempre fez. Isso me
lembra muito a história que tem o
seguinte: eu não me importo em
ser investigado, eu já fui investigado, isso aí só se eu fosse ingênuo.
É a mesma coisa para agências
que trabalham para governos,
que trabalham para publicidade.
Eu começo com agência de publicidade. Se eu ficar mais de um
ano, vão dizer: não faz licitação?
Não é por aí, está entendendo?
Folha - O que estou colocando para o sr. é uma questão que o TCU colocou, por exemplo.
Nuzman - Nós estamos com contas aprovadas. Prestação de contas no ministério de anos anteriores, não é do atual ministério, tem
contas, processos, que ainda não
foram feitas.
A única coisa que eu estou mostrando é isso: passagens tá aqui,
gastou 29,9 [%]. Nem um terço do
dinheiro. Onde é que tem excesso? O que se ouve mais do atleta?
"Eu preciso viajar para competir,
eu preciso viajar para competir".
Então tem uma equação aí que
não está batendo. Se não gasta dinheiro em passagem, e o atleta
precisa viajar para competir, eu
gostaria de conhecer que fórmula
é essa que a gente resolvesse.
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