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NO GRAMADO
Marcadores, não batam nele!
NILTON SANTOS
ESPECIAL PARA A FOLHA
Quem me disse isso foi o Zizinho, e nunca mais esqueci:
há pontas que só servem para não
deixar a bola escapar pela lateral.
Você tenta meter a bola, mas eles
não saem daquela faixa do campo, ficam ali, grudados na linha.
Hoje há muito jogador assim. É
uma pena, principalmente em um
país como o Brasil, que teve tantos
camisas 7 espetaculares. Foram
muitos. O Joel, do Flamengo, o Julinho, que deve ter até estátua na
Itália depois de tudo o que fez na
Fiorentina, o Sabará, do Vasco, o
Cláudio, do Corinthians... E o
Garrincha, claro.
Hoje não assisto mais futebol.
Muita gente acha que é esnobação
minha, mas não é. O futebol de
hoje me irrita. Qualquer jogador
mais habilidoso que aparece vira
logo alvo de pancadas.
Por isso, ainda não vi o Robinho, mas todos me dizem que é
um grande driblador, um garoto
atrevido. Isso é ótimo, mas ele
precisa se cuidar. Se posso dar um
conselho para ele, é esse: continue
driblando, mas se prepare para
apanhar. Insista nos dribles porque essa é a sua característica.
Mas fique sempre atento.
Faço também um apelo para os
marcadores. Não batam nele. Não
batam em nenhum jogador habilidoso. Tentem vencê-lo com técnica, com inteligência. O reconhecimento dos torcedores será muito maior, com certeza.
Não dá para falar de camisa 7
sem lembrar do Garrincha. Fui o
jogador que mais conviveu com
ele. Vi o Garrincha chegando e
saindo do Botafogo. Viramos
grandes amigos e compadres.
Contam até uma lenda, de que
no primeiro treino dele em General Severiano ele me driblou, meteu a bola no meio das minhas
pernas. Isso nunca aconteceu,
mas eu deixo contarem essa história. Ele era meu amigo!
De vez em quando, em treino,
tínhamos que nos enfrentar. E eu
me orgulho muito do que aconteceu em 58, na Copa da Suécia.
Ele era reserva do Joel, estava irritado, louco para entrar no time,
e eu tinha que marcá-lo nos coletivos. Eu não podia dar pontapé
porque ele era meu amigo, mas
não podia aliviar, senão corria o
risco de perder a posição.
Um dia, vieram me dizer que o
Garrincha ia entrar no lugar do
Joel. Eu pedi para dar a notícia.
Entrei no quarto dele, e ele estava
ouvindo rádio. Eu disse: "Se prepara porque você vai jogar". Ele:
"Não vou jogar nada. Se eu soubesse que ia ser assim, preferia ter
ficado nas minhas peladas em Pau
Grande". "Você vai jogar, sim.
Capricha", eu falei. Aí, ele só disse
uma coisa: "Pode deixar". Daí pra
frente, todo mundo sabe.
Nilton Santos, 78, "a Enciclopédia do Futebol", foi lateral do Botafogo entre 1948
e 1964 e bicampeão mundial com a seleção brasileira em 1958 e 1962
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