|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Marcas rivalizam com distintivos nas camisetas e acabam dando primazia a multinacionais no lugar das antigas empresas locais
20 anos de patrocício
RODRIGO BERTOLOTTO
DA REPORTAGEM LOCAL
A primeira publicidade em um
grande clube no Brasil foi política,
ou melhor, cívica. O escrito ""Dia
15 Vote" nos ombros corintianos
convocava para as primeiras eleições diretas e pluripartidárias ainda no regime militar (1964-1985).
Era início de novembro daquele
1982, e, em poucos dias, as empresas fariam sua estréia nos uniformes de futebol. Dez anos depois,
em 1992, aconteceu outro marco:
a entrada da Parmalat no Palmeiras, impondo uma co-gestão de
craques e milhões de dólares.
Essa administração tirou o time
do jejum de 17 anos e, de quebra,
concedeu 11 troféus -saudosos
para o atual Palmeiras.
Hoje em dia, porém, as firmas
voltaram a ser o que eram no início: apenas patrocinadores. Só
que agora com uma maior presença de capital estrangeiro.
Os quatro grandes do Estado,
por exemplo, pela primeira vez
são todos bancados por dinheiro
internacional: o São Paulo, pelos
coreanos da LG; o Corinthians,
pelos americanos da Pepsi; enquanto o Santos e o Palmeiras, pelos italianos da Cirio e da Pirelli.
Foi-se o tempo em que tinham
na camisa, respectivamente, produtos nativos, como Seguro Educação, duchas Corona, Afonso
Veículos e Brandiesel.
Mas também é passado uma
época como 1993, quando a Parmalat injetou US$ 10 milhões no
Palmeiras, ou 1999, quando o
HMTF gastou US$ 25 milhões em
contratações corintianas.
""Exagerou-se muito a importância do patrocinador. Na verdade, ele é só um componente, um
detalhe na estrutura dos clubes,
que, bem administrados, podem
prescindir dele", afirma o publicitário Washington Olivetto, que
foi o responsável por um dos primeiros anúncios no futebol.
Em dezembro de 1982, o Corinthians decidia o Campeonato
Paulista com o São Paulo, Olivetto
era o vice-presidente na ""Democracia Corintiana" e conseguiu
convencer a Bombril, cujos donos
eram são-paulinos, a ornamentar
o uniforme alvinegro.
Já o São Paulo apareceu em
campo com a inscrição Cofap, outra empresa para a qual o publicitário fazia as campanhas.
Ambas as marcas se localizavam só nas costas da camisa. Era
uma entrada tímida no futebol,
mas que, depois, tomaria conta da
porção frontal do uniforme.
Naquele momento, havia receio
dos dois lados. Os clubes não queriam ""macular seu manto", enquanto as empresas temiam que
os torcedores dos outros times
evitassem seus produtos (o único
registro aconteceu em 1995, quando panificadores seguidores da
Lusa propuseram um boicote à
Parmalat pelo palmeirense Tonhão ter pisado na camisa rival).
No início dos anos 80, os executivos preferiam investir no emergente vôlei, sem paixão clubística
e com visibilidade para os logos
da Supergasbrás ou da Pirelli.
O futebol, contudo, buscava novas receitas, fora a renda dos ingressos, das TVs, da venda de
atletas e da loteria esportiva. O
medo inicial passou, e veio uma
enxurrada de anunciantes.
No Paulista-84, por exemplo, o
São Paulo envergou inscrições como Perdigão e Ovomaltine. Já o
Palmeiras usou no mesmo torneio anúncios do Pão de Açúcar
Veículos e Marte Rolamento.
Mas a agremiação do Parque
Antarctica faria pior: em 1986 divulgava uma loja da galeria Pagé,
conhecido entreposto de contrabando no centro de São Paulo.
""Os clubes não entendiam que
deviam escolher, e não serem escolhidos", analisa Olivetto.
As primeiras publicidades eram
recortes de algodão costurados
sobre as camisetas, e eram comum soltarem durante os jogos.
Um exemplo disso foi o Corinthians de 1984, com um pano
branco que mostrava o desenho
de ducha elétrica. O remendo não
resistia aos puxões e irremediavelmente terminava pendurado.
O Corinthians, porém, começaria no ano seguinte uma parceria
com a Kalunga, atacadista de papelaria de propriedade de Damião Garcia, frequentador das
instalações do Parque São Jorge.
Kalunga ficou no espaço nobre
durante dez anos (1985-1995),
dando exposição nacional para
uma firma local. Ela resistiu até na
temporada de 1987, quando a Coca-Cola acertou com todos os clubes, menos com Corinthians e o
Flamengo -cujo acordo com a
Petrobras é o mais duradouro do
país, cumprindo já 18 anos.
""A Kalunga era um patrocinador-torcedor. Seu Damião ia no
ônibus com os atletas. Tinha paixão. Não entrou no clube para lucrar como os posteriores", afirma
a ex-dirigente Marlene Mateus.
A comparação dela é com o fundo norte-americano HMTF, que
se associou ao time em 1999 -seu
homem-forte, o texano Thomas
Hicks, nunca havia entrado em
um estádio de futebol.
Antes, em 1997, o clube já havia
feito uma parceria com o banco
Excel, que gastou US$ 17 milhões
em passe de atletas. Tanto Excel
quanto HMTF tiveram representantes embutidos na hierarquia
corintiana. O primeiro colocou lá
Mário Sérgio, e o segundo trouxe
do vôlei José Roberto Guimarães.
O parâmetro era o Palmeiras,
que mantinha parceria com a
multinacional italiana Parmalat.
A empresa alimentícia, que era
personificada pelo ex-treinador
de vôlei José Carlos Brunoro, ganhou nos seus oito anos do clube
boa parcela do mercado brasileiro
de leite, derivados e afins.
Por seu lado, o São Paulo sempre resistiu a esse tipo de parceria,
mas teve de enfrentar percalços,
como a falência de dois de seus
patrocinadores: o da IBF Formulários em 1993 e o da escola de informática Datacontrol em 1997.
As camisas sem publicidade,
ainda bastante presentes em meados dos anos 80, voltaram com
força no início do ano passado.
Santos, Palmeiras, Lusa, Botafogo-RJ e Vasco ficaram com as camisas ""limpas" devido ao fim de
seus contratos de patrocínio.
Alguns culparam a situação
econômica, outros responsabilizaram as CPIs que investigavam
dirigentes. O Vasco é o caso extremo: está desde dezembro de 2000
sem patrocinador. Só abriu exceção para estampar grátis a logomarca do canal ""SBT", uma vingança de seu presidente, Eurico
Miranda, contra a TV Globo.
Texto Anterior: Futebol - Tostão: Código do torcedor de pijama Próximo Texto: Panorâmica - Futebol: Uefa cria fundo para combater racismo Índice
|