|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
FUTEBOL
O teatro dos treinadores
TOSTÃO
COLUNISTA DA FOLHA
E nquanto na Europa os treinadores ficam sentados ou
em pé, ao lado do banco de reservas, discretos, às vezes dão instruções e voltam, como manda a regra, a maioria dos técnicos brasileiros segue junto ao gramado,
gritando com atletas, reclamando
do árbitro e auxiliares e tendo um
comportamento teatral.
Alguns gritam os 90 minutos
perto dos microfones (a solução é
desligar o som da TV) e chegam
até a jogar a bola no adversário,
como fez Antônio Lopes no jogo
Vasco x Fluminense. Felizmente
diminuíram bastante as brigas e
agressões físicas e morais dos técnicos aos árbitros e auxiliares.
Parte da torcida, a mais agressiva, não aceita treinadores que ficam calados, observando com
atenção o jogo. Parreira foi exceção no Corinthians. Os torcedores
acham que técnico tem de gritar,
gesticular, para motivar o time.
No São Paulo, a falta de vibração
era a principal reclamação contra
Oswaldo de Oliveira. Bobagem!
Técnico que não pára de gritar
não vê os detalhes da partida.
Muitos treinadores, para exteriorizar as emoções, os desejos
exibicionistas reprimidos e para
atender aos torcedores, adotam
um comportamento agressivo e
teatral. Um jogo de futebol é um
teatro, mas os artistas estão no
gramado, não do lado de fora.
O ambiente agressivo fora dos
estádios, nas arquibancadas e
perto gramado, é transmitido aos
atletas. Por esse e outros motivos
há muitas violência e um absurdo
número de faltas, 50 a 60 por jogo,
a maior média do mundo. As frequentes expulsões e suspensões
prejudicam bastante os times.
Os jogadores não entendem os
gritos e gestos dos treinadores.
Não são apenas os comentaristas
que falam isso. Mário Sérgio, ex-jogador e técnico do São Caetano,
disse a mesma coisa à Soninha,
no programa "Bate Bola" da
ESPN Brasil. Instruções dos técnicos são muito importantes nos
momentos em que o jogo pára.
A importância do treinador é
muito maior nos treinos. As suas
condutas na partida são mal avaliadas. Substituições erradas são
elogiadas se o time vencer e vice-versa. Há dezenas de fatores envolvidos na história de um jogo.
Só no intervalo e com a ajuda
do auxiliar que fica lá em cima,
de onde se vê melhor, o técnico
poderá influenciar no placar.
Mas não acredito que os técnicos
mudem suas condutas por causa
de opiniões diferentes dos auxiliares. Os treinadores são autoconfiantes. Auxiliares não gostam
também de discordar do chefe.
Além disso, profissionais de todas as áreas, incluindo médicos
(por experiência e observação) e
técnicos, mesmo os mais estudiosos e competentes, não agem com
base só em conhecimentos teóricos, científicos e em boas observações. Seguem com frequência suas
intuições e emoções. Isso pode ser
bom ou ruim. Daí, a moda de se
falar em inteligência emocional.
No jogo, técnicos como o Felipão têm condutas inexplicáveis e
surpreendentes -que costumam
dar certo. Scolari é muito mais intuitivo e emocional do que racional. Parreira, ao contrário, é muito mais científico e lógico. Tudo é
planejado. Os estilos são opostos,
complementares e eficientes.
Apesar das deficiências e comportamentos não desejáveis, os
técnicos brasileiros são mais criativos e melhores do que os europeus. Mais do que isso, o Brasil,
país de Terceiro Mundo, tem estrutura profissional de apoio aos
jogadores, com médicos, fisioterapeutas, preparadores físicos e outros, mais desenvolvida e/ou mais
valorizada do que a da Europa.
Comentaristas de futebol, me
incluindo, não assistem aos treinos, com exceção de épocas especiais, como numa Copa. Se já é difícil ver tantos jogos, do Brasil e
do exterior, imagine os treinos.
Por isso, alguns dos nossos elogios e críticas aos treinadores são
incorretos, injustos ou supervalorizados. Não sabemos nos detalhes intenções, planos e o que foi
feito durante os treinos. Confiamos nos nossos conhecimentos
teóricos, nas deduções, observações e nas matérias dos repórteres. Os treinadores também não
informam. Adoram mistérios.
Os técnicos deveriam responder
as críticas e as perguntas dos repórteres com bons argumentos,
explicações técnicas, informações.
Não com mau humor, respostas
evasivas e olhares de prepotência.
Têm a obrigação de explicar e informar ao público. Isso melhoraria também a qualidade das críticas e análises dos comentaristas.
Técnicos, torcedores, dirigentes,
atletas e imprensa precisam evoluir para que o futebol se torne
mais prazeroso, organizado,
bem-humorado e menos violento.
E-mail
tostao.folha@uol.com.br
Texto Anterior: Vôlei: Dirigentes argentinos aceitam renunciar Próximo Texto: Futebol: Indústria do alô investe milhões na bola Índice
|