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FUTEBOL
O futuro já começou
FÁTIMA BERNARDES
ESPECIAL PARA A FOLHA
Quinta-feira, 27 de junho.
O Brasil já tinha passado
pela Turquia, na semifinal. Um a
zero, gol de Ronaldo. Estávamos
na final e, pela primeira vez, íamos enfrentar a Alemanha numa
Copa. No Prince Hotel, em Yokohama, onde a seleção estava concentrada, o técnico Luiz Felipe
dava o que ele chamou de última
entrevista coletiva. O salão, lotado... gente sentada até no chão.
O número de jornalistas estrangeiros era tão grande quanto o de
brasileiros. E começou o tiroteio:
"Como vai jogar o Brasil?", "Qual
a maior arma do rival?", "O que
fazer nos últimos momentos antes da grande final?", "Como você
conseguiu que o Rivaldo até se sacrificasse em benefício do time?".
Todas as respostas eram muito
calculadas. Ao longo da Copa, Felipão foi aprendendo a dizer exatamente o que gostaria de ver publicado ou veiculado. Foi aprimorando sua relação com a imprensa. Mas uma pergunta -feita pelo repórter Tino Marcos- deixou
o técnico com os olhos brilhando.
E ali, talvez sem medir bem o que
estava falando, ele confessou um
desejo. A pergunta era se ele gostaria de voltar a uma Copa como
técnico. Scolari disse que nem ele
poderia imaginar que fosse gostar
tanto de disputar um Mundial e
que aceitaria até um convite para
dirigir a seleção de um outro país.
Só para repetir a experiência.
Ora, se estar de novo num Mundial é um sonho, uma meta, por
que tanta dúvida na hora de decidir se fica no comando da nossa
seleção? Há quem diga que o motivo é dinheiro. Felipão rebate.
Diz que assumiu a seleção mesmo
para ganhar menos do recebia no
Cruzeiro. No fundo, Scolari sabe
que não é fácil atravessar os quatro anos entre dois Mundiais no
comando de uma equipe. Principalmente no Brasil, onde até derrota em amistoso pode derrubar
um treinador.
O retrospecto -para usar um
termo caro ao esporte- não é
mesmo favorável. Se levarmos em
conta a história, só após a conquista do nosso primeiro título,
vamos ver que o técnico campeão
de 58, Vicente Feola, foi substituído por Aimoré Moreira na conquista do bi em 62... que saiu para
a volta de Feola em 66... que deu
lugar a João Saldanha nas eliminatórias para a Copa-70... mas
quem dirigiu o Brasil no México
foi Mario Jorge Lobo Zagallo. Aí,
sim, apoiado pela conquista inédita do tri, ele conseguiu chegar
ao Mundial-74. Mas não resistiu
depois das derrotas para a Holanda e a Polônia, que nos deixaram,
naquela Copa, em quarto lugar.
Em 1982, Telê Santana não ganhou a Copa, mas encantou o
mundo. Mesmo assim deixou a
seleção. Foi substituído por três
técnicos até voltar, a pedido da
torcida, para as eliminatórias e a
Copa-86. O título escapou de novo. E lá se foi Telê para a entrada
de Carlos Alberto Silva, que
-sem fôlego para superar maus
momentos- viu Sebastião Lazaroni comandar, na Itália, o fracasso de 90. Melhor esquecer.
E a entressafra fez novas vítimas. O ex-craque Paulo Roberto
Falcão assumiu, mas foram Carlos Alberto Parreira e o coordenador técnico Zagallo que conquistaram o tetra, nos EUA. Parreira
disse adeus depois do título. E
olha o Zagallo aí de novo. Amparado pela força do título, sobreviveu por mais quatro anos como
técnico, até ser vice na França.
A chegada de Wanderley Luxemburgo foi festejada, mas a
lua-de-mel terminou com o vexame na Olimpíada de Sidney. Veio
então Emerson Leão, até chegar
Felipão como o salvador da pátria. E aí você lembra bem: classificação sofrida para a Copa da
Coréia e do Japão. Na última partida, em Fortaleza, contra a Venezuela. E depois um Mundial
sem derrotas, um penta invicto.
O título dá a Scolari fôlego para
continuar. Scolari quer voltar a
disputar uma Copa. Só falta Scolari decidir que papel vai escolher
para a sua história na seleção. Seria o papel desempenhado por
Parreira, que conquistou o título,
entrou para a história como vitorioso e foi embora? O de Zagallo,
o único que conseguiu atravessar
a entressafra e disputar dois
Mundiais seguidos -sonho confesso de Felipão? Ou o papel de
Telê, que deixou o cargo após
mostrar ao mundo o futebol-arte,
para voltar depois nos braços do
povo? Voltar para tentar o ouro
inédito nos Jogos de Atenas ou
quem sabe o hexa na Alemanha.
Quando este texto foi escrito, eu
ainda não sabia o resultado da
reunião de Scolari com o presidente da CBF, Ricardo Teixeira.
Mas a essa altura você já sabe. E o
futuro do técnico do penta e da
nossa seleção já começou.
Fátima Bernardes, 39, é editora e apresentadora do "Jornal Nacional" da TV
Globo. Cobriu as Copas de 1994 e 2002 e
as Olimpíadas de Barcelona e Atlanta.
Tostão, em férias, volta a escrever neste
espaço em 4 de setembro.
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