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ESGRIMA
Ícone chinês reaparece nos Jogos como canadense
Ouro em 1984, Luan Jujie, aos 50, decide competir por outro país
Atualmente técnica e 31 anos mais velha que 1ª rival, atleta conta ter retornado por esperar evento especial em sua nação de origem
FÁBIO SEIXAS
ENVIADO ESPECIAL A PEQUIM
Luan Jujie está rouca. De
tanto falar, de tanto dar entrevistas, de tanto responder às
mesmas perguntas. A mais batida dela, sobre o porquê de voltar agora à prática da esgrima.
"Deu vontade de tentar, de descobrir até onde consigo ir."
Na sala apinhada de jornalistas, a Folha pede a ela que
compare o antes e o depois.
"Lá atrás, em 1984, o esporte
na China não era forte assim.
Agora os atletas treinam muito
mais, participam de mais competições internacionais, há
muito mais dinheiro envolvido... Está dez vezes melhor."
Ela conhece os dois mundos.
Em Los Angeles, aos 26, integrou a delegação que marcou o
retorno da China aos Jogos
-entre 1956 e 1980, não disputaram. Ouro na esgrima, o primeiro de uma nação asiática,
tornou-se um ícone chinês.
Em Pequim, hoje, aos 50,
deixa o posto de técnica para se
vestir de atleta. No país que
ainda a exalta, mas que deixou.
A heroína agora leva na jaqueta
a bandeira do Canadá.
"Não me interessa que país
estou defendendo. Uma pessoa
será sempre aquela mesma
pessoa, um atleta será sempre
aquele mesmo atleta", afirma.
Uma opinião difícil de ser digerida pelos donos da festa. Na
volta dos Jogos de Los Angeles,
Jujie ganhou status de defensora da pátria, foi usada pela
propaganda do regime, virou
filme para os adultos e cartilha
para as crianças, tornou-se
membro da Assembléia e diretora da União de Mulheres de
sua Província. Ainda disputou
os Jogos de 88. Duas vezes foi
"Esportista do Ano na China".
Mas trocou tudo isso por Edmonton. Alegando, apenas, ter
se "apaixonado" pelo lugar.
Lá, deixou as competições
para criar os três filhos, começou a dar aulas e fez saltar o número de alunos da academia local, de 40 para 400. Em 1994,
naturalizou-se canadense.
Em 2000, deixou a "aposentadoria" pela primeira vez, para
defender o novo país em
Sydney. Não passou das preliminares e prometeu nunca
mais voltar. Mas, no ano seguinte, a escolha de Pequim como sede de 2008 a provocou.
"Pensei que poderia ser minha última oportunidade. Eu
sabia que a China se esforçaria
para fazer uma Olimpíada
grandiosa e que seria muito especial para mim", explicou.
A fagulha ficou guardada por
sete anos até que, no ano passado, decidiu tentar a vaga. Conseguiu. E está de volta à China.
"Tudo mudou muito. Fui para minha cidade, em Nanjing, e
não consegui achar a casa em
que nasci", contou, revelando
que trouxe os três filhos -de
10, 14 e 17 anos- para vê-la.
Puderam ver sua fama no
país e ficaram impressionados.
Hoje apenas a 44ª do ranking e
31 anos mais velha que a primeira rival, brinca com a idade.
Jujie deixa a sala como entrou, sorriso escancarado. Não
sofre mais pressão para fazer
história. Ela já fez, e faz tempo.
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