São Paulo, domingo, 12 de janeiro de 2003

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FUTEBOL

Demonstrar retorno social dos projetos será outro desafio do ministério

Empréstimo exige perdão a dívida de clubes com União

DO PAINEL FC

A missão mais espinhosa do novo ministro do Esporte, Agnelo Queiroz, para concretizar seu plano de que o BNDES financie reformas ou construções de estádios de futebol será convencer o banco a abrir créditos a associações tão endividadas -em muitos casos, os clubes estão em débito com a própria União.
Em 1997, o BNDES realizou estudos que levaram à decisão de apoiar projetos na área esportiva. Mas a linha de crédito acabou não sendo aberta a times de futebol, pois o banco avaliou que se tratava de parceiros de alto risco.
Só de INSS e FGTS, os clubes brasileiros devem aproximadamente R$ 350 milhões.
Um dos postulantes ao financiamento do banco na época, o Vasco acabou sem o dinheiro que pleiteava para uma grande reforma em São Januário. Numa trágica ironia, o estádio foi palco de um dos maiores desastres do futebol nacional, quando, na final da Copa João Havelange, em 2000, 210 pessoas ficaram feridas após a queda de um alambrado.
Normalmente, a abertura de linhas de crédito do BNDES está condicionada a um "nada consta" em relação às obrigações fiscais e trabalhistas das empresas ou associações. Há, entretanto, a possibilidade de ser negociada uma solução política para casos assim.
Seis anos depois de ver frustrada a tentativa do BNDES, o Ministério do Esporte retoma a questão com um desafio adicional: convencer o banco (e o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva) da utilidade social da proposta.
Em menos de duas semanas de gestão, o novo governo demonstrou que, num ano de aperto orçamentário, não está disposto a investir em projetos que não apresentem retorno social.
Uma das primeiras medidas tomadas por Lula foi a suspensão da licitação para compras de jatos supersônicos para a FAB, sob a justificativa de que o dinheiro (a compra poderia atingir a soma de US$ 1 bilhão) poderia ser revertido para projetos sociais.

Pilar da auto-estima
Segundo a Folha apurou, o futuro presidente do BNDES, Carlos Lessa, que toma posse depois de amanhã, está disposto a conversar com Queiroz e não descarta financiar os clubes.
Embora não seja um apaixonado por futebol, Lessa considera esse esporte "um dos pilares da auto-estima brasileira".
Foi essa a posição que demonstrou no seminário "Esporte & Cidadania", realizado em setembro, no Rio -ele participou da mesa de abertura do evento.
O futuro presidente do BNDES ressaltou ainda o papel educativo e democrático do esporte.
Ao saber da idéia do comunista Queiroz, o nacionalista Lessa disse que iria estudar a proposta com atenção e se declarou interessado no conforto dos torcedores.
Fez, todavia, a ressalva de que, caso o financiamento para os estádios saia, precisará de critérios, que pretende definir com o Ministério do Esporte.
O número de torcedores dos potenciais tomadores de empréstimos, bem como a localização e o estado dos seus estádios e a saúde financeira dos clubes podem ser referenciais levados em conta.
O ministro do Esporte argumenta que a reforma e a construção de estádios estão em consonância com a prioridade do novo governo para o setor -encarar a prática de atividades esportivas como fator de inclusão social.
Segundo Queiroz, ganhariam os milhões de torcedores que frequentam estádios, ao terem mais conforto e segurança, e os clubes, que passariam a ter condições de se tornarem rentáveis.
Se por um lado o financiamento pode significar um prêmio à má gestão (como disse o próprio Lula durante a campanha, ao criticar financiamentos de dívidas de clubes, posição modificada depois de sua eleição), por outro pode criar condições para que as agremiações saiam do buraco.
Especialistas em marketing esportivo costumam dizer que um estádio próprio pode ser uma das maiores fontes de receitas para os clubes, que gastam fortunas com aluguel e taxas quando atuam em campos alheios e deixam de ganhar -pois não podem comercializar seus produtos.

Indução
É provável, ainda, que Queiroz use o atrativo do financiamento como uma forma de induzir os clubes a se transformarem em empresas. O Estatuto do Desporto, projeto de lei que deverá nortear a política esportiva do novo governo, já prevê benefícios para os clubes que se adequarem a um modelo de gestão empresarial.
(FÁBIO VICTOR)

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