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São Paulo, domingo, 25 de maio de 2003

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Intervenção da Casa Civil barrou tentativa de colocar "atenuantes" na nova lei e surpreendeu Queiroz

Planalto implodiu acordo entre ministério e cartolas

KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
FÁBIO VICTOR
FERNANDO MELLO
DO PAINEL FC

O Palácio do Planalto abortou acordo do Ministério do Esporte com dirigentes de futebol para aliviar o teor de um dos artigos do Estatuto do Torcedor que atinge diretamente os cartolas.
Na primeira pressão que recebeu do establishment da bola, o ministro Agnelo Queiroz fraquejou e quase cedeu. O chefe da Casa Civil, José Dirceu, intercedeu, ordenando ao ministro que não recuasse. O argumento: o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se sentiria pessoalmente ofendido.
Em reunião na última quarta-feira, Queiroz, mesmo já advertido pelo Planalto de que nenhuma vírgula da lei deveria ser alterada, apresentou aos cartolas uma solução para o impasse: solicitar à Advocacia Geral da União um esclarecimento sobre o artigo 19 da lei -pelo qual as entidades e dirigentes que organizam competições são responsáveis por prejuízos causados ao torcedor "independentemente de culpa".
Para mostrar seu compromisso, o ministério redigiu uma nota técnica que aliviou os temores dos dirigentes e seria, conforme promessa feita por Queiroz durante o encontro, enviada à AGU.
A reação de Lula e Dirceu surpreendeu o ministro do Esporte. Foi também da Casa Civil a decisão final de pedir à AGU que ignorasse o argumento da cartolagem de que alguns pontos do estatuto não tinham validade jurídica.
E foi o próprio Dirceu quem quebrou os alicerces da aliança entre o presidente da CBF, Ricardo Teixeira, e os cartolas, que definira a paralisação. A Folha apurou que o ministro da Casa Civil fez chegar a Teixeira o seguinte recado: Lula não admitiria recuo.
Afinal, o Estatuto do Torcedor foi a primeira sanção de lei feita por Lula. Na cerimônia, o presidente disse que a lei deveria pegar. Ou seja, seria desmoralizante para o governo ver o Brasileiro interrompido por um motim contra uma lei sancionada há menos de uma semana pelo presidente.
Para tentar ficar bem com o governo, Teixeira rompeu o acordo tácito com os cartolas indo à TV e dizendo que nunca cogitara paralisar o futebol, assumindo uma posição apaziguadora. Na terça-feira, no entanto, no encontro na sede da CBF que selou o levante, Teixeira fora um dos avalistas.
Além de Queiroz, o deputado federal Gilmar Machado (PT-MG), presidente da subcomissão de Desporto da Câmara, também recebeu recado do Palácio do Planalto para ser intransigente. No auge da crise, Machado admitiu negociar com a cartolagem, o que desagradou a Lula e a Dirceu.
Para combater o lobby dos dirigentes, o lobby dos defensores do estatuto acionou parlamentares e membros do governo. A pressão começou horas depois do anúncio do motim, na terça-feira, e durou até quinta-feira, quando, finalmente, a rebelião morreu.
Os defensores da nova legislação alegaram que a ação dos cartolas mataria na prática uma lei de cunho moralizador e que, se houvesse recuo do governo, eles jamais se submeteriam a uma nova tentativa de mudar o futebol.
A reação do Corinthians também teve peso na decisão do Planalto de barrar a rebelião dos cartolas. O clube se posicionou contra a paralisação e, apesar de também reivindicar algumas mudanças no estatuto, decidiu não se bater contra ele -atitude, aliás, tomada por várias agremiações.
O Planalto considerou que o apoio ao Estatuto do Torcedor do time que tem a maior torcida de São Paulo, uma das maiores do país, era um sinal de que o que está previsto na lei é factível.


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