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No pior momento de sua carreira, Guga encara problemas pessoais, vê os familiares distantes das quadras e sofre pressão para aumentar o estafe controlado pelo técnico
Na alegria & na TRISTEZA
DO ENVIADO A FLORIANÓPOLIS E
DO ENVIADO À COSTA DO SAUÍPE
Rafael, Alice, Dona Olga, Guilherme, Larri. Talvez não exista
no mundo do tênis família mais
conhecida que os Kuerten. Talvez
não exista um tenista tão dependente da família como Guga.
E agora, por diversos motivos,
Gustavo Kuerten enfrenta o pior
momento de sua carreira sem o
apoio costumeiro daqueles que
sempre marcaram presença.
Questionado recentemente sobre se problemas pessoais o atrapalhavam, uma das dezenas de hipóteses levantadas para explicar
sua pior temporada, Guga teve
voz para a avó, Olga. "Ela tem 81
anos. Quero fazer o possível para
que seja ainda mais feliz."
Dona Olga, que virou celebridade em Roland Garros, não o
acompanha mais. Alice, a mãe,
tem muitos afazeres em Florianópolis, onde cuida do Instituto Guga Kuerten e do irmão Guilherme,
excepcional. Rafael, o outro irmão, administrador de sua carreira, e a mulher, Letícia, desde o
nascimento dos gêmeos Leonardo e Gabriel, em junho do ano
passado, seguem menos o tenista.
E Larri Passos, o técnico que é
quase como um pai para Kuerten,
casaria ontem em São Paulo, para
onde deve se mudar, deixando em
suspenso o aspecto profissional
da relação mais que profissional
que alimenta com o tenista.
Se a involuntária desagregação
dos Kuerten não afeta a cabeça de
Guga -"Estou na fase de ver tudo o que aconteceu"-, é inegável
o reflexo em seu desempenho.
O tenista, que começou o ano
com o objetivo de retornar ao
grupo dos top ten após a cirurgia
no quadril em 2002, brilhou apenas com o título de Auckland e
em Indian Wells, quando chegou
à única decisão de Masters Series.
De resto, nem sequer uma semifinal no saibro e a pior temporada
da carreira na América do Norte.
Ele reconhece que o fracasso na
terra batida, palco de suas principais conquistas, o abalou. "Foi
uma situação diferente ficar fora
desses torneios antes das finais.
Foi um momento difícil."
Em Florianópolis, apesar da
tranquilidade que Guga demonstra em seu convívio pessoal, a
preocupação é nítida. Sem ter como apoiá-lo no circuito, parentes
e amigos defendem que Guga
monte uma estrutura maior, como a de outros tenistas de ponta.
Guga, porém, não aceita mexer
no time. "Vou ser mais feliz tendo
Larri ao meu lado e sendo o 15, 20
do mundo. Gosto do convívio
com ele. Nunca me adaptaria com
um cara que fala: "Treino às 12h".
Você vê o cara, acaba o treino e
depois nem fala mais com ele."
Mão-de-ferro
Centralizador, Larri é treinador,
preparador físico, fisioterapeuta,
nutricionista, massagista e psicólogo de Guga desde 1989. Não fala
com a Folha -assim como a família, por orientação da assessora
de imprensa Diana Gabanyi- e
diz a quem o questiona que a pergunta deve ser feita diretamente
ao tenista. Já avisou a Rafael que
dá conta do recado. E que continuará dando, já que é também
profissional de educação física e
especialista em neurolinguística.
Seria ridículo imaginar que a vida sentimental de Larri, 45, pudesse afetar a relação dos dois.
Ocorre que, para familiares de
Guga, uma explicação para a má
fase estaria na excessiva dependência em relação ao técnico, em
um período em que não estava
tão disponível -o namoro, com
uma repórter de TV, começou em
Acapulco, em fevereiro.
O problema se agravará agora.
Quando não estiver em torneios
no exterior, Larri se dividirá entre
São Paulo e Camboriú (SC), sede
de seu centro de treinamento.
Só que Guga queria treinar mais
em Florianópolis, na casa da mãe,
que foi reformada e ganhou mais
uma quadra. Também por causa
de Guilherme -"Dizem que é deficiente, mas o considero excepcional, nos uniu de uma maneira
única"-, que vive altos e baixos.
"Vamos ver como é que vai ser",
diz Perseu Lehmkulh, amigo desde 1984 e um dos principais assessores de Alice no instituto.
Primeiro técnico do tricampeão
de Roland Garros, Carlos Alves
lembra que até sua filha, Maria
Fernanda, iniciante na carreira,
conta com uma equipe com nutricionista e preparador físico.
"No circuito, o caso do Guga é
bem raro. O Pete Sampras tinha
um séquito com ele, mas parece
que o Larri prefere diferente...",
diz a melhor brasileira no ranking
feminino (203º). Alves constata
também falta de confiança. "Ele
jogava por instinto. Hoje pensa
muito, telegrafa a jogada."
Larri, na verdade, está longe de
ser o único problema de Guga.
Rafael e Letícia, que costumavam
acompanhá-lo nas viagens, agora
se dedicam mais aos filhos, que
nasceram prematuros e enfrentaram uma série de complicações.
Apesar dos palpites dos familiares, no entanto, o atleta já deixou
claro que só aceita alterar seu estafe com a total anuência de Larri.
Pelo menos por enquanto, o técnico se mantém irredutível. E a
opinião dele pesa em Guga. Até
agora quem discordou do técnico
perdeu a queda de braço.
Manager internacional do tenista, Jorge Salkeld foi o primeiro
que sugeriu a contratação de outros profissionais para a equipe,
como um preparador físico, um
fisioterapeuta e um nutricionista.
De tanto pedir mudanças, Salkeld foi colocado para escanteio.
Atualmente sua principal atribuição é burocrática: reservar hotéis,
marcar passagens e arrumar os
traslados nas viagens ao exterior.
Salkeld apoiou duas tentativas
de ampliar o estafe. Guga trabalhou com o médico Marcos Contreras e a fisioterapeuta Mariângela Lima, em Florianópolis. Em
março de 2001, passou a sentir dores no quadril, mas em janeiro de
2002 a contusão foi confirmada.
O tenista e o médico optaram
pela fisioterapia, com ênfase na
hidroterapia e no reforço muscular, supervisionada por Lima.
Como as dores persistiam, Guga
decidiu pela cirurgia no quadril
direito, realizada no fim de fevereiro do ano passado, pelo médico americano Thomas Byrd.
A partir daí, as relações com
Contreras e a fisioterapeuta azedaram. O médico evita falar. "É
uma questão ética, não me pergunte nada." Já Mariângela Lima
foi procurada pela reportagem,
mas não respondeu aos recados.
A cirurgia deixou consequências. Guga já disse que não consegue manter o alto nível em partidas longas, como a contra o canadense Daniel Nestor, em Calgary,
no último fim de semana. Em
quase quatro horas, pediu atendimento médico várias vezes, mas
acabou derrotado pelo 488º do
mundo -o algoz de pior ranking
desde o primeiro título em Paris.
Outra hipótese para a queda de
desempenho seria o excesso de
treino para um tenista de 27 anos,
quase um velho perto dos três primeiros do ranking (média de 22
anos). "Sinto vontade de treinar,
de jogar. Sou viciado em tênis."
Para Guga, porém, as pessoas
estão mais preocupadas com sua
situação do que ele próprio.
"Acostumaram a me ver como
número um. Se para mim é normal ser o 14 do mundo, para elas
não é. Querem encontrar soluções."
(JOÃO CARLOS ASSUMPÇÃO E FERNANDO ITOKAZU)
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