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FUTEBOL
Ordem e desordem
TOSTÃO
COLUNISTA DA FOLHA
O futebol, muito mais do
que os outros esportes, é contraditório e imprevisível. Há dezenas de fatores desconhecidos e
misteriosos envolvidos no resultado de uma partida. As previsões
dos comentaristas são tão precisas quanto às dos economistas sobre a queda dos juros, dos analistas sobre o término da guerra e
dos videntes.
Os fatores mais decisivos do resultado de um jogo são a qualidade individual dos jogadores e a
inspiração e a transpiração desses
atletas no instante da partida.
Existem "craques" que só brilham uma vez por mês. Outros fatores são o imponderável, os mistérios, a força do conjunto, a preparação física e psicológica, a estratégia de jogo (tipo e qualidade
de marcação, postura defensiva
ou ofensiva adequada para o momento). As condutas do treinador
antes ou durante a partida, o esquema tático e outros.
O desenho tático e a estratégia
são menos importantes, mas posso enxergá-los e analisá-los. Por
isso falo tanto deles. O mesmo
acontece com as características e
as qualidades técnicas dos atletas.
Não posso analisar nem prever
que a bola vai desviar no morrinho e enganar o goleiro, que o árbitro e os auxiliares vão cometer
graves erros, que o jogador está
triste, com dor-de-cotovelo porque brigou com a amada e dezenas de outros fatores imprevisíveis que podem decidir a partida.
Há muitos conceitos discutíveis
e temporários. No Corinthians,
Parreira corrigiu os principais defeitos de Vampeta, que eram o de
conduzir demais a bola e tentar
passes longos impossíveis. Ele perdia a bola e facilitava o contra-ataque. Esses defeitos foram substituídos por outro, o de tocar muito a bola para o lado, que teve de
ser corrigido por Geninho. O terceiro gol contra o São Paulo saiu
de um passe longo de Vampeta.
Eu e outros comentaristas criticamos o Léo Lima, do Vasco, por
enfeitar demais e tentar o mais
difícil, o que não sabe. Contra o
Fluminense, o atleta deu um passe magistral de letra que resultou
em gol. Se ele unir a habilidade
com a eficiência, se tornará um
grande jogador. Em certos momentos, é imperceptível o limite
entre o craque e o malabarista.
Maradona ultrapassou tal limite.
Era supercraque e malabarista.
A seleção brasileira em 70 treinou bastante a defesa e a marcação no meio-campo. Essas eram
características do Botafogo, dirigido também por Zagallo. Mas o
time brasileiro ficou na história
como exemplo de futebol ofensivo
e ousado, que somente se preocupava em atacar e fazer gols.
Há um conceito antigo no futebol de que o jogo se ganha no
meio-campo. Para isso, o time
precisa ter muitos jogadores nesse
setor e valorizar a posse de bola. A
seleção pentacampeã contrariou
tudo isso. Havia poucos atletas no
meio, e o time trocava poucos
passes nesse setor. Roberto Carlos
e Cafu atuaram somente pelas laterais, e os três "erres", na frente.
Anos atrás, Parreira e Zagallo
disseram que no futuro o esquema tático mais comum seria o 4-6-0. A idéia era atraente, a de que
os atacantes teriam de recuar,
marcar e, depois, avançar, como
no basquete. Se essa previsão tivesse sido confirmada, hoje não
teríamos atacantes fenomenais,
especialistas, como Ronaldo.
Há dezenas de exemplos conflitantes. Se a verdade tem no mínimo duas faces, no futebol, as "verdades" são incontáveis. O futebol
está mais próximo do mistério e
da emoção do que da racionalidade. Técnicos e comentaristas
tentam pôr ordem na desordem.
Por causa dessa incerteza, o futebol é apaixonante e sedutor.
Pontos corridos
Começou o primeiro Campeonato Brasileiro por pontos corridos, turno e returno. No final, o time que somar mais pontos é o
campeão. Simples e justo.
Para funcionar bem, o torneio
deveria também ser menos longo,
com, no máximo, 20 clubes. Cairiam quatro e subiriam quatro da
Série B. Os oito primeiros colocados teriam direito de atuar na Libertadores e na Copa Sul-Americana. Assim, quando estivesse
próximo do final, quase todos os
times estariam lutando pelo título
ou pelos oito primeiros lugares ou
para não serem rebaixados.
Temo que todos os graves e crônicos problemas do futebol brasileiro, como a falta de seriedade e
transparência, a violência, as péssimas condições dos estádios e o
desrespeito aos torcedores sejam
debitados ao novo regulamento.
O futebol só vai melhorar se esses
e outros problemas forem resolvidos. A fórmula de disputa é o menos importante.
E-mail
tostao.folha@uol.com.br
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