São Paulo, domingo, 03 de setembro de 2006

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Mônica Bergamo

bergamo@folhasp.com.br

Bienal paralela

Começou o corre-corre para a temporada de artes plásticas de SP: a um mês da Bienal, galerias preparam surpresas para mostras simultâneas

Ana Ottoni/Folha Imagem

Divulgação
A CAMINHO As galeristas Alessandra D'Aloia e Márcia Fortes, da Fortes Vilaça (acima), que levarão à Paralela obras como "Jovem Costurando" (2006), de Vik Muniz, que fotografou um desenho feito com pigmentos em pó

Uma piscina branca de quase 30 metros quadrados em madeira recoberta de vinil está na lista de compras da galeria Nara Roesler para a temporada de arte em SP, entre outubro e novembro. "Contratamos três pessoas para estudar o projeto. Tem que ser tudo como o Oiticica descreveu", diz Nara. Ela se refere à instalação "Cosmococa CC4 Nocagions", criada em 1973 por Hélio Oiticica (1937-1980), que inclui uma piscina onde são projetadas imagens feitas com carreiras de cocaína. Isso mesmo: cocaína.

 

"Mas, olha, nós não precisamos comprar a cocaína, não! O Oiticica deixou as imagens feitas com as carreiras da droga já prontas em slides, só para montar", explica Marli Matsumoto, que dirige a exposição.
 

A mostra de Oiticica é um dos muitos eventos que as galerias de SP preparam para abrir no dia 4 de outubro, o mesmo em que a 27ª Bienal de SP será inaugurada. Além de exposições de cada uma das galerias, haverá a Paralela, em que 13 delas expõem as obras mais preciosas dos artistas que representam no prédio da Prodam, no parque Ibirapuera, bem ao lado da Bienal.
 

"Temos que aproveitar o momento: colecionador estrangeiro só baixa aqui na época da Bienal, porque o Brasil é longe", conta a galerista Luisa Strina. "Teremos de telas a instalações imensas, performances, fotos e esculturas", diz a curadora da Paralela, Daniela Bousso.
 

No menu do evento, 150 artistas brasileiros -contra 22 na Bienal. A maior parte das obras estará à venda. Entre os destaques, Cildo Meireles, Tunga e Vik Muniz.
 

Só a agência norte-americana Art Quest, especializada em turismo de arte, trará 200 turistas -colecionadores, membros de conselhos de museus e curadores- para a temporada paulistana. O roteiro começa pelo Rio e inclui passeio de barco com caipirinha e uma roda de samba contratada para animar os gringos. Depois, SP, onde, espera-se, os turistas abrirão o bolso.
 

A instalação "Os Anjos", de Tunga, foi vendida por cerca de U$ 50 mil na Paralela de 2004. André Millan, da galeria Millan Antonio, não confirma o valor. "Esqueci!", diz. Preço, como se sabe, não é o assunto preferido do circuito das artes plásticas. "Ah, não bota o preço aí, não!", pede a galerista Nara Roesler, que levará à Paralela uma escultura de Tomie Ohtake -que tem obras avaliadas em até US$ 150 mil.
 

A galeria de Nara fica no Jardim Europa, ao lado de uma concessionária de carros importados. "Lembro de uma época em que ninguém entrava aqui e eu via todo mundo entrando na loja de carros. Eu ficava na porta, chamando o público para entrar. Descobri que as pessoas não sabem se portar numa galeria. Não sabem que podem só olhar, sem comprar." Luisa Strina também acredita que as galerias ainda sofrem por causa da imagem de que são glamourosas, só para endinheirados. "Quer ver como não tem glamour?", diz. E grita: "Graçaaa! Ô Graça! Traz champanhe aqui para a moça!" A assistente ri. "Viu? Aqui tem água, café e olhe lá! Até porque perua não consome arte. Perua compra roupa."
 

O circuito está agitado. Há um mês, Strina correu para selecionar uma obra de Cildo Meireles para a Paralela. Escolheu, enfim, "Bombanel", uma obra feita com ouro branco, lente e pólvora. "Se ficar no sol, explode", diz a galerista.
 

A Casa Triângulo, além de levar obras à Paralela, vai montar um palco para performances e shows. A galeria Vermelho prepara duas mostras para o período da Bienal. "Depois da primeira Paralela, a Vermelho fez 49 feiras fora do país. Entende?", diz Eliana Finkelstein, que comprou a casa vizinha para ampliar a galeria. "Nossos artistas são muito jovens. Os vernissages aqui são baladas com DJs e mais de 400 pessoas."
 

A Paralela de 2004 levou a Vermelho para fora do país. Mas e as vendas? "Ah, quanto a isso eu não tive tanta sorte, não, menina. Cheguei a vender duas fotografias do [artista] Rafael Iassef para o Edemar [Cid Ferreira]. Cada uma por R$ 4 mil. Estava feliz da vida, mas adivinha? O Banco Santos quebrou e ele não comprou coisa nenhuma", lembra Eliana, rindo.
 

Márcia Fortes, da galeria Fortes Vilaça, é a idealizadora da Paralela. Ela diz que, na primeira edição da mostra, em 2002, apenas quatro galerias participavam. Em 2004, nove aderiram. "O Itaú adiantava o orçamento e nós pagávamos em obras." Neste ano, a mostra terá 16 mil metros quadrados. "Vou poder montar as instalações com respiro, sem que pareça uma Disneylândia", diz a curadora Daniela.
 

Ela escolheu de sete a 15 artistas de cada galeria para incluir no evento. Regra para a seleção: todos brasileiros, vivos e não-participantes da Bienal. "Deixo livre para que eles façam o que quiserem", diz. O "fazer" custa de R$ 80 mil a R$ 100 mil para cada galeria, que banca as obras dos artistas. O aluguel do espaço no Ibirapuera será pago à prefeitura em obras de arte avaliadas em até R$ 15 mil.


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