|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Diretor estréia em longas com façanha técnica
Com R$ 1 milhão, o gaúcho Gustavo Spolidoro filmou os 81
minutos de "Ainda Orangotangos" em seqüência ininterrupta
Cineasta, que abandonou
carreira na publicidade,
prepara agora dois filmes
nos quais executará sozinho
todas as funções técnicas
SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL
No verso de sua mão esquerda, o diretor gaúcho Gustavo
Spolidoro anotou um lembrete
para si mesmo, ao desembarcar
em São Paulo, na última terça-feira: "Comprar um terno".
Aos 36 anos, ele decidiu incluir o traje no guarda-roupas,
já que tem "muitas formaturas"
para ir, agora que é professor de
cinema na PUC-RS.
"E também porque eu me
senti mal no Festival de Roterdã [em janeiro passado], onde
todo mundo estava de terno e
eu, com minhas roupas coloridas e tênis rasgados", conta.
O ar jovial de Spolidoro é característica também de seu primeiro longa, "Ainda Orangotangos", cuja estréia internacional ocorreu no festival holandês e que está em cartaz em
São Paulo desde a última sexta.
Pequena façanha técnica,
"Ainda Orangotangos" é um
plano-seqüência de 81 minutos.
Isso quer dizer que a história
foi filmada de um golpe só, sem
interrupção da ação dos atores
e do funcionamento da câmera.
São, na verdade, várias histórias que se interpenetram em
Porto Alegre, adaptadas do livro homônimo de Paulo Scott.
A produção custou R$ 1 milhão,
obtidos em prêmio do MinC.
Spolidoro estreou em 1999,
com o curta "Velinhas", exibido
no Festival de Berlim, que fez
dele uma promessa na direção.
O diretor, no entanto, começava a carreira incerto de seu lugar no cinema.
De início, a atividade de crítico era a que mais o atraía. Cinéfilo praticante, foi estudar publicidade porque não havia cursos de cinema em Porto Alegre,
no início dos anos 90.
A experiência como publicitário, no entanto, foi "traumática" e durou apenas um ano, no
qual ele desobedeceu diversas
vezes o conselho de "não arrumar briga com os clientes". Em
geral, os atritos surgiam porque
o diretor se recusava a acatar
decisões das quais discordava.
"Classe média-média"
"Venho da classe média-média. Nunca tive regalias, mas
aprendi a lutar pelo que quero",
afirma. Hoje, vivendo dos filmes que faz e das aulas na PUC,
há três coisas que Spolidoro
não admite fazer: publicidade;
campanha política para um
partido de centro-direita (já
trabalhou para o PT); ou um filme para o Grêmio.
Com o também torcedor colorado Giba Assis Brasil, ele rodou o documentário "Gigante
-°Como o Inter Conquistou o
Mundo" (2007), sem pretensões de marcar um tento em
linguagem cinematográfica.
"Fiz o filme que eu, como colorado, gostaria de ver e chorar."
Em "Ainda Orangotangos",
ele também tempera seu gosto
por "experimentações, porque
se for fácil não tem graça" com
a atenção ao repertório do público comum de cinema. Acha
que essa é uma forma de respeitar sua origem familiar, de traço "popular, não-intelectual".
Repressão sexual
Em Cotiporã (4.000 habitantes), cidade do interior gaúcho
onde vive sua avó e que um dia
se chamou Monte Vêneto, ele
pretende fazer neste ano dois
filmes, um ficcional ("Monte
Vêneto - A História Real") e outro documental ("Monte Vêneto - A História Inventada").
Com eles, quer investigar como
"adolescentes do interior, que
vivem sob repressão religiosa e
sexual", enfrentam a passagem
para a vida adulta. O que pretende encontrar é "a liberdade
dos jovens, não a doença".
Na forma cinematográfica, a
experimentação que planeja
desta vez é a de executar sozinho todas as funções técnicas
do filme. Mas não quer, com isso, abandonar o método de fazer cinema em equipe. "Nunca
acreditei em carreira solo."
Texto Anterior: Foco: Na prática, Sidão aprendeu como encarar emergências Próximo Texto: Crítica: Plano único faz inventário da estupidez Índice
|