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SÉRIE
Produção da Cultura adapta textos de escritores brasileiros em monólogos com atores como Marília Pêra e Beth Goulart
"Contos" injeta literatura na televisão
BRUNO YUTAKA SAITO
DA REDAÇÃO
O cenário é opressor. Sob o fundo negro, envolta por projeções
de vídeos, Adriana (Maria Luisa
Mendonça) vocifera contra a mãe
(também interpretada pela atriz),
presa a uma cadeira de rodas. Valores familiares são desafiados,
rancores, expostos.
Em cena, ela se contorce e esbugalha os olhos. O contorcionismo
não é num palco de teatro, o que
causa um estranhamento ainda
maior. Transformado em um
monólogo, "A Medalha", de Lygia
Fagundes Telles, desafia os limites
impostos pela televisão, na série
"Contos da Meia-Noite", projeto
da TV Cultura em parceria com a
Imprensa Oficial do Estado de SP.
Dirigida pelo videoartista Eder
Santos, a série, que estréia amanhã, trará cem contos de alguns
dos maiores autores brasileiros,
de Machado de Assis a Clarice
Lispector, interpretados na forma
de monólogos por atores como
Marília Pêra, Beth Goulart, Antonio Abujamra, Giulia Gam e Matheus Nachtergaele.
Mudança de ritmo
"Contos" causa estranhamento
em um primeiro momento, para
quem está acostumado aos padrões de rapidez videoclípica que
ditam o ritmo da TV. Com episódios de dez minutos de duração, a
série requer do telespectador
atenção ao texto e às nuances corporais dos atores. Trata-se da conhecida performance teatral aplicada ao vídeo. "A série tem coisas
pesadas, e esse é o desafio. Queria
levar poesia à TV", diz Santos.
Em "Uma Vela para Dario", de
Dalton Trevisan, por exemplo, o
ator e diretor Antonio Abujamra
injeta ainda mais tensão ao texto
do escritor curitibano. Sob sua fala, é contada a história de Dario,
sujeito que passa mal e morre na
rua, sob os olhares nada solidários dos transeuntes.
Sob Abujamra, que fica entre
três telas, são projetadas imagens
de pessoas em trânsito, captadas
pela equipe de Santos. "As vantagens da TV é que podemos experimentar um outro tipo de visão.
Há a textura do tecido sobre as telas, o foco, a luz, as sombras etc."
Santos acredita que a linguagem
densa desses primeiros episódios
-já foram gravados 70- não vai
afugentar o público. "Os telespectadores vêem de tudo na TV, há
espaço para todos", diz.
"Temos uma cultura contaminada pela linguagem rápida da
TV. Quando alguém fala de um
filme no cinema, por exemplo, as
pessoas elogiam os efeitos especiais, a velocidade, e não a história
em si. Falta poesia e ritmo."
Ele conta que "Contos" é gravado em duas etapas. Na primeira,
os atores usam o teleprompter
(monitor de vídeo com os textos),
e lêem os contos na íntegra. "Na
segunda, os atores soltam suas
loucuras. O Abujamra, como tem
experiência de diretor, já edita na
hora seus textos, além de ter aquela aura maldita. Maria Luisa deu
"olé" na gente, com sua loucura na
interpretação."
A identificação com a atriz rendeu uma parceria. O diretor conta
que fará junto com Mendonça o
curta-metragem "Delicadeza do
Amor", sobre "a visão do amor na
voz de uma mulher". Já Beth Goulart, que faz "Duelo de Farrapos",
de Simões Lopes Neto, propôs a
Santos levar o projeto ao teatro.
CONTOS DA MEIA-NOITE. Quando: de
seg. a sex., à 0h, na TV Cultura. Nesta
semana serão exibidos "Um Apólogo",
de Machado de Assis, com Marília Pêra
(amanhã); "ZAP", de Moacyr Scliar, com
Antonio Abujamra (ter.); "De Cima para
Baixo", de Artur Azevedo, com Matheus
Nachtergaele (qua.); "A Medalha", de
Lygia Fagundes Telles, com Maria Luisa
Mendonça (qui.); e "Duelo de Farrapos",
de Simões Lopes Neto, com Beth Goulart.
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