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Mangue beat completa dez anos, data que (quase) passou despercebida; bandas comemoram consolidação da cena recifense
Sem choro nem vela
FÁBIO VICTOR
DA REPORTAGEM LOCAL
Silêncio estranho, esse. Sem festa nem barulho, o mangue beat,
mais importante movimento de
renovação da música brasileira
recente, completou dez anos.
O aniversário na verdade são
três, e um deles ainda está por vir.
O primeiro marco da cena pop,
apontado por seus criadores, foi o
manifesto "Caranguejos com Cérebro", escrito por Fred 04 em
1992. No ano seguinte houve a
primeira excursão ao Sudeste de
Chico Science & Nação Zumbi e
Mundo Livre S/A, as bandas que
institucionalizaram o agito. Foi
também em 1993 a primeira edição do Abril Pro Rock, que se tornaria o maior celeiro de bandas
independentes do país.
O cartucho que resta é a celebração de "Da Lama ao Caos"
(CSNZ) e "Samba Esquema Noise" (Mundo Livre), cujo lançamento faz uma década em 2004.
A múltipla efeméride só não
passará em branco por causa do
livro "Sob o Calçamento Está o
Mangue", organizado pelo jornalista Renato L., o "ministro da informação" da cena recifense, e pela produtora Alê Oliveira.
O volume, a ser lançado no ano
que vem, por editora ainda indefinida, reunirá artigos do antropólogo Hermano Vianna, do etnomusicólogo americano John
Murphy, de Zeroquatro e Renato
L. e do jornalista Xico Sá, crítico
da Folha, entre outros.
Fotos e imagens inéditas da inquieta década ilustrarão o livro.
"Eu mesmo fiquei receoso em
entrar no projeto, porque lembrar
essas datas pode sugerir que a cena acabou, e ela está vivíssima.
Mas resolvemos fazer, para estimular a reflexão", afirma Renato
L. O livro foi concebido para sair
neste ano, junto com shows e debates, pacote batizado de "A Maré
Encheu" e destrinchado no site
www.manguebit.org.br. Mas,
por falta de dinheiro, foi adiado.
Se não houve vela nem bolo,
não houve tampouco choro pela
quietude dos dez anos -muito
pelo contrário. As bandas comemoram a consolidação da cena
mangue, mesmo com a morte de
Chico Science, em 1997.
"É o paradoxo de uma utopia alcançada", diz Zeroquatro, que cita o surgimento de um novo pólo
de produção musical no Recife,
onde foi gravada a maioria dos últimos discos do mangue.
Não significa, porém, que as
bandas ganharam dinheiro. Ninguém na Nação Zumbi ou no
Mundo Livre, as mais bem-sucedidas da cena, tem casa própria.
"O que ganho é para pagar contas
e comprar discos. Mas comemoramos por poder continuar fazendo música mesmo estando fora
da máquina", afirma Jorge du Peixe, da Nação. "Não me preocupo
com isso. Deito a cabeça no travesseiro e consigo dormir legal",
emenda o guitarrista Lúcio Maia.
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