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CRÍTICA
Roteiro engenhoso não livra filme das regras da indústria do cinema
INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA
Na Coréia ou no Japão, no
Brasil ou na Alemanha, nos
EUA ou em Hong Kong, só a violência nos une. O idioma partilhado por Quentin Tarantino, Take-shi Kitano e John Woo é este, e o
fato de ter dominado o cinema
coincide, estranhamente, com a
repressão do erotismo.
Temos então uma nova ordem
do pudor, em que o corpo desaparece como lugar de prazer e se impõe como lugar de mutilação.
Muito disso aparece sob a forma
de uma brincadeira (não há como
ver "Kill Bill" senão como uma
saudável brincadeira), que é possivelmente a maneira encontrada
pelos diretores para sobreviver no
mundo-cão cinematográfico.
Assim, este "Old Boy", de Park
Chan-wook, chega ao cartaz muito provavelmente por aceitar certas regras da indústria do que por
outra coisa, inclusive a exuberante imaginação do roteiro. Por
"imaginação exuberante" compreenda-se o conjunto de procedimentos que levam o espectador
e os críticos a verem novidade na
recombinação de mais ou menos
os mesmos elementos de sempre.
Aqui, um homem é seqüestrado
e mantido prisioneiro durante 15
anos, sem que conheçamos os
motivos de tal evento. Um dia é libertado e leva duas obsessões do
cativeiro... a primeira é vingar-se,
claro, a segunda é descobrir de
quem deve vingar-se.
Bem, tudo gira em torno disso:
vingança, pois o anônimo que
prendeu nosso herói o fez por vingança, mas não a tem por terminada, ainda. O duelo prosseguirá,
configurando um jogo tipo gato e
rato, de que nenhum corpo em
cena parece apto a sair ileso até
que descubramos quem se vinga
de quem e por quê.
É verdade que até descobrirmos
o antagonista do herói o filme estará quase acabado, o que deixa a
estranha impressão de que o verdadeiro inimigo seria Deus, isto é,
um ser onipresente e onisciente,
habitando um lugar acima de nós,
controlando as situações, quaisquer que sejam, por pessoas interpostas e promovendo uma sangueira e uma violência com poucos precedentes, de que eu me
lembre, no cinema mundial.
Tudo isso não significa que o
coreano Park Chan-wook não tenha condições de fazer outros filmes, menos em consonância com
aquilo que dele exige "o sistema"
mundial de distribuição e (em
boa parte) de premiação de filmes
em festivais. Não lhe falta vigor
para configurar uma obra. Falta,
talvez, esse tanto de espírito de
oposição tão freqüente nos grandes artistas.
Old Boy
Direção: Park Chan-wook
Produção: Coréia do Sul, 2003
Com: Min-sik Choi, Ji-tae Yu, Hye-jeong
Kang
Quando: a partir de hoje no Espaço
Unibanco, no Frei Caneca Unibanco
Arteplex e no Lumière
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