|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
CDS
FOLK
Compositor irlandês é revelação da trilha do filme "Closer", de Mike Nichols
Damien Rice modula a voz e o coração em seu álbum "O"
DIEGO ASSIS
DA REPORTAGEM LOCAL
Levou mais de três anos, mas
finalmente chegou. "O", disco de estréia do cantor e compositor irlandês Damien Rice, acaba
de ser lançado no Brasil pela Warner, e, ainda que tardio, corre o
risco de ser "o" disco de 2005.
Puxado pela música-tema de
"Closer - Perto Demais", filme de
Mike Nichols, "O" foi lançado em
fevereiro de 2002 no mercado britânico e em janeiro deste ano continuava na oitava posição entre os
mais vendidos do reino.
"The Blower's Daughter", que é
tocada integralmente na abertura
e no final da produção mais recente do diretor, provocou nele
uma reação parecida à de quando,
em 1967, "descobriu" uma certa
dupla Simon & Garfunkel e resolveu incluí-la em "A Primeira Noite de um Homem".
Dos versos inesquecíveis para
quem viu o filme ou ouviu a música -"Eu não consigo tirar meus
olhos de você"- nasceu também
o slogan de "Closer": "Se você
acredita em amor à primeira vista, nunca vai parar de procurar".
Em entrevista a um jornal americano, Jude Law, um dos atores
do filme, revelou que a música de
Rice foi "contratada" por Nichols
antes das estrelas do elenco.
E não é para menos. Com a voz e
o violão de um Nick Drake ou
Leonard Cohen contemporâneo,
"The Blower's Daughter" é só a
ponta do iceberg de um dos mais
sinceros e doídos discos de estréia
de que se tem notícia -feito que
o geninho Beck levou oito anos e
sete álbuns para atingir com o subestimado "Sea Change" (2002).
Gravado praticamente todo em
um porta-estúdio caseiro, "O"
junta os dedilhados intimistas do
cantor com arranjos de violoncelo e violino e, como cereja do bolo,
a voz adocicada de Lisa Hannigan. E tome sofrimento:
"Um brinde a você e ao seu
amorzinho / Eu tenho anos para
esperar por você / E os sinos do
seu casamento em meus ouvidos /
Você me deu três cigarros para fumar as minhas lágrimas", canta,
com a voz embriagada, piano ao
fundo, em "Cheers Darlin'".
"Cold Water", talvez a mais triste de todo o disco -o que não é
pouco-, começa com os lamentos de Rice agonizando à beira da
morte ("Tudo o que tenho é a sua
mão / Senhor, você pode me ouvir
agora?"). A agonia é logo interrompida quando a voz angelical
de Lisa assume o dueto e, mais
tarde, quando a canção é tomada
por um coral de canto gregoriano.
Soturno, não caricato.
Ao longo das dez faixas de "O",
a poesia do bardo irlandês, que,
como seu conterrâneo Bono, não
dispensa uma luta pelos direitos
humanos em Mianmar, Irã e onde for necessário, visita o drama
de casais de jovens namorados às
voltas com um amor impossível
("Delicate"), as circunstâncias de
uma separação ("Volcano") e o
medo da perda ("Cannonball").
Mas, ao mesmo tempo em que
abrem as portas para o desespero,
as composições de Rice trazem
embutidas a possibilidade de redenção catártica pelas cordas
-de orquestra, em "Amie" e "Eskimo", ou vocais mesmo, como
na esgoelada "I Remember", que
faz os pêlos do braço levantarem
com o volume da música. Pense
no radiohead Thom Yorke, em
sua melhor forma, cantando o hino indie "Creep"...
Rice tem esse mesmo poder: o
de, com as modulações de voz, jogar a instrumentação para cima,
para baixo, para todos os lados. E,
quando o faz, bem mais que a intensidade física de suas canções, é
o coração de quem ouve que é jogado para cima, para baixo, para
todos os lados.
O
Artista: Damien Rice
Lançamento: Warner
Quanto: R$ 30, em média
Texto Anterior: Nas lojas Próximo Texto: Samba: Dudu Nobre volta no tempo para construir maturidade Índice
|