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SAMBA
Dudu Nobre volta no tempo para
construir maturidade
LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO
Nas fotos de seu quinto CD, Dudu Nobre aparece na Pedra do Sal,
no morro da Conceição, nas proximidades da praça Mauá. São lugares da pré-história do samba,
pois nessa região do centro do Rio
desembarcavam os negros arrancados da África; mais tarde, os
pretos forros vindos da Bahia; e,
no início do século 20, concentravam-se os estivadores, de onde
saíram muitos dos primeiros
sambistas.
Na escolha do cenário parece
haver uma tomada de posição:
Dudu não quer mais ser apenas o
garoto esperto que faz músicas
engraçadinhas, repletas de gírias,
com o objetivo de atrair uma garotada nova para o samba.
Aos 30 anos, pai de dois filhos,
dá um passo atrás no tempo para
embasar seu olhar sobre o presente e fazer um futuro mais consistente do que aquele que seus discos anteriores insinuavam.
Em "Festa em Meu Coração",
lançado agora, ele grava três clássicos. Em um deles, "Gosto que
me Enrosco" (Sinhô), a taxa de
surpresa é baixa, já que seu padrinho Zeca Pagodinho gravou "Jura" há pouco, e porque "Posso Até
me Apaixonar", sucesso de Zeca
composto por Dudu, começa exatamente com o verso "Gosto que
me enrosco".
Já "Yaô" (Pixinguinha/Gastão
Vianna) é um dos melhores momentos do CD, com o cantor plenamente à vontade no clima de
terreiro que remete aos encontros
que as tias baianas promoviam
em suas casas, na Cidade Nova.
Em "Pintura sem Arte", talvez o
mais bonito de todos os maravilhosos sambas de Candeia, Dudu
ainda se ressente de alguma imaturidade (vocal e de vida), mas
deixa claro que sabe qual é o melhor caminho das pedras.
Nos outros CDs, o cantor gravou um Silas de Oliveira aqui, um
Guará acolá, mas a prioridade era
mostrar sua própria verve de
compositor e sua maneira bem-humorada de cantar. Agora, mais
sério sem perder a leveza, ele abre
as portas de sua discografia para
os mestres da velha guarda, que
sempre fizeram sua cabeça.
Mesmo que com novas levadas
e temáticas, algumas tradições estão firmemente presentes no disco. O samba de roda, por exemplo, está logo na abertura: três
boas parcerias de Dudu com o especialista baiano Roque Ferreira.
O partido-alto, arte da improvisação que o cantor domina bem,
aparece já na segunda faixa
("Vem pra Cá pra Sambar", de
Dudu, Fred Camacho e André
Rocha) e volta muito bem em
"Pega Geral", em que a letra de
Nei Lopes contempla o estilo jovial do parceiro: "Pretinha, morena e loura fatal/ O moleque pega
geral/ Atriz, socialite, et cetera e
tal/ O moleque pega geral".
Esse lado "moleque Dudu"
também está em "Faz o Pagode
Explodir", "Namora Normalmente" e "Pra Parar de Uma Vez
É Difícil", faixas que contam com
a assinatura de Luizinho SP, parceiro freqüente do cantor.
Mas, indicando uma mudança
de rumo, há até romantismo desbragado no repertório: a bonita
"Pra Amenizar Teu Coração",
parceria com Sombrinha.
Dudu não deixa de incluir uma
criação de Arlindo Cruz ("Gasta
Aqui! Gasta Lá!"), um de seus
grandes mestres, e reverenciar no
encerramento ("Pega Eu") um
ídolo que já não está mais aqui:
Bezerra da Silva.
"Festa em Meu Coração" flerta
com o que já aconteceu no samba
para sinalizar que muita coisa nova ainda poderá acontecer.
Festa em Meu Coração
Artista: Dudu Nobre
Gravadora: Sony BMG
Quanto: R$ 30, em média
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