|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Wolfe vê moralidade "em desintegração"
DA SUCURSAL DO RIO
Na palestra de abertura da Bienal, o escritor norte-americano
Tom Wolfe afirmou que a moralidade do passado está em "desintegração absoluta", sendo substituída por um padrão moral "baseado na conduta sexual".
Wolfe diz ter chegado a essa
conclusão após conversar com
dezenas de jovens para escrever
seu livro recém-lançado, "Eu Sou
Charlotte Simmons" (Rocco), um
retrato do cotidiano de uma universidade americana criado a partir de uma longa pesquisa.
Usando o beisebol como metáfora, ele disse que, no passado, a
primeira base era a apresentação,
o conhecimento social; a segunda,
o beijo; a terceira, o sexo oral; e a
última, a relação sexual.
Na visão do escritor, hoje em dia
houve uma mudança nas bases. A
primeira delas passou a ser a última, já que as pessoas vão se conhecer depois do sexo. "Não sei
qual vai ser o efeito a longo prazo
disso, mas temos que pensar".
Wolfe citou ainda a socialite Paris Hilton como um exemplo dos
novos tempos. "Nenhum escritor
seria capaz de criar uma história
na qual uma socialite faz um filme
pornô para a internet e vira uma
celebridade depois dele", disse.
O escritor buscou no passado a
inspiração para prever a literatura
do futuro. Para Wolfe, o francês
Émile Zola deveria ser a referência
dos escritores de hoje, na busca de
um "neonaturalismo".
"Eu gostaria de fazer uma exortação a todos os escritores, incluindo os poetas: saiam em massa para falar com as pessoas; façam um trabalho de campo e
aprendam por conta própria as
coisas que estarão nos jornais do
dia seguinte", afirmou, referindo-se à famosa frase de seu compatriota Philip Roth, que disse viver
em uma época em que os escritores não conseguem imaginar o
que lerão nos jornais de amanhã.
Respondendo a uma pergunta
da platéia, Wolfe demonstrou
pouco apreço pelos livros que
contam histórias fantásticas. "Há
romancistas que se dão bem escrevendo grandes fantasias, como
a autora de "Harry Potter" [J. K.
Rowling] e Stephen King, mas
não me parece que seja disso que
a literatura precisa hoje", disse.
Ele ainda se referiu a "Terras do
Sem Fim", de Jorge Amado, como
um romance que tinha essa preocupação com o presente, algo que
diz estar em falta na literatura
contemporânea. "Muitos romancistas desistiram de estar a par do
próprio tempo", afirmou.
Uma outra história brasileira foi
lembrada algumas vezes por Wolfe. Ele assistiu ao documentário
"Ônibus 174", de José Padilha, e o
considerou uma exceção no panorama atual do jornalismo. O
caso do homem que seqüestrou
um ônibus no Rio e acabou morto
pela polícia também foi descrito
por Wolfe como um retrato da sociedade da espetacularização.
"Um jovem invisível, não reconhecido pela sociedade, acha que,
se fizer algo horroroso, a mídia estará do seu lado, mesmo que por
pouco tempo", analisou.
(LFV)
Texto Anterior: 12a. Bienal do livro do Rio: Bienal começa com crítica a Lula por "ataque à língua" Próximo Texto: Música: Sem visto, Seu Jorge é barrado em Londres Índice
|