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TELEVISÃO
Sucesso de séries como "Queer Eye for the Straight Guy" e "Queer as Folk" esbarra em cenário conservador
Canais e anunciantes rejeitam rótulo "gay"
BRUNO YUTAKA SAITO
DA REDAÇÃO
THIAGO STIVALETTI
FREE-LANCE PARA A FOLHA
Se os números se confirmarem,
a portinha do armário terá, para
muitos, seus dias de catraca em final de campeonato. A 8ª edição da
Parada do Orgulho GLBT (gays,
lésbicas, bissexuais e transgêneros), hoje em São Paulo, espera receber 1,5 milhão de pessoas. Número que não faz as emissoras de
TV e anunciantes de peso saírem
do armário quando o assunto é
assumir esse público.
Canais como Sony, HBO e Multishow, que exibem as séries
"Queer as Folk", "Queer Eye for
the Straight Guy" e "Loud &
Queer", rejeitam o rótulo "série
para gays" e a importância estratégica desse público.
Em "Queer Eye", um dos líderes
na audiência da TV por assinatura no domingo à noite, cinco gays
especializados em itens como culinária e moda remodelam um
hetero para que ele conquiste
uma mulher. "O programa funciona porque os cinco gays não
seguem aquela máxima comum
entre eles de que todo homem é
um gay em potencial. Eles respeitam a heterossexualidade do convidado e passam a mensagem de
que ambos podem conviver sem
problema", diz Carolina Vianna,
gerente de marketing do Sony.
Em abril, "Queer Eye" foi a terceira maior audiência do Sony entre os telespectadores na faixa dos
18 aos 49 anos. Nos EUA, exibido
pelo canal pago Bravo, atraiu 2,8
milhões de espectadores na estréia, em julho do ano passado, a
segunda maior audiência da história do canal. Como a maior parte dos programadores, Carolina
diz que o Sony não incluiu "Queer
Eye" na grade por causa da temática -e que a série faz muito sucesso entre os heteros, especialmente os pais de família.
Há telespectadores -heteros-
que concordam. ""Queer Eye"
agrada homens e mulheres, gays
ou "straights". Vejo pelo meu marido, que detesta "Queer as Folk"
porque acha muito restrita e explícita, mas adora "Queer Eye"
porque não é dirigido exatamente
para um público", diz a jornalista
Patricia Belotti, 24.
Os anunciantes também não estão atrás dos homossexuais -são
grandes empresas que anunciam
nos canais, programas e horários
mais diversos, como Volkswagen,
Motorola e Nestlé. "As empresas
voltadas especificamente para o
público gay em geral são pequenas e não têm verba pra anunciar
na TV", diz Vianna.
O Multishow estreou na sexta a
alemã "Loud & Queer". O humor
fica próximo a "Will & Grace", e a
estrutura narrativa segue a das séries americanas. Wilson Cunha,
diretor do canal, também rejeita o
rótulo de série para gays. "Queremos atrair todo mundo com os
nossos programas. E como o humor gay é bastante sarcástico,
uma série dessas se torna um
componente diferente na programação."
Na TV aberta, nenhum programa aposta abertamente no público GLS -mas alguns elementos
do universo gay começam a ser
usados. Na sitcom "Sexo Frágil",
os protagonistas são todos masculinos e se travestem de mulher
para falar sobre o comportamento dos homens. "O programa é
uma observação bem-humorada
sobre o mundo atual. O fato de os
atores fazerem as mulheres os torna mais frágeis. Mas não tentamos agradar nenhum nicho específico de público", diz João Falcão,
diretor e roteirista do programa.
Mercado carente
Fãs dessas séries entrevistados
pela Folha são unânimes em dizer
que o cenário ainda engatinha.
"Esses programas tentam suprir
uma carência do público, porém
o mercado brasileiro ainda está
fechado para as séries gay", diz o
estudante Ivan José Junior, 19.
"O que me atrai em séries como
"Queer as Folk" e "A Sete Palmos" é
a temática. Já que é tão difícil um
gay conseguir "se ver" na televisão
brasileira, assisto a essas séries para ver personagens mais ou menos iguais a mim na tela", afirma
o professor Leandro Colling, 32.
Já "Queer as Folk", em sua quinta temporada, mostra a rotina de
um grupo de amigos gays em
Pittsburgh, e é a campeã no quesito identificação com os gays.
"Como não existe esse tipo de
série por aqui, tenho que ver as
americanas. As coisas melhoraram muito de uns anos para cá.
Afinal, em séries e filmes, cada vez
mais vemos os gays aparecendo.
Mas sua vida ainda é muito "glamourizada': lindos, brancos, com
uma autoconfiança incrível. Nós
sabemos que a realidade é um
pouco diferente", diz o securitário
Saint-Clair Stockler, 31.
Para muitos, "Queer as Folk"
serviu como uma iniciação. "Eu
não sabia que era gay antes de assistir a "QAF'", diz José Junior, 19.
"A série mostra o lado bom e o
ruim dos gays, e dá uma base para
quem está se descobrindo."
"Reneguei minha opção sexual
por muito tempo. Nas séries, nós
nos espelhamos nas personagens
que passam por isso e tentamos
fazer uso disso", diz Paulo Júnior,
23, auxiliar administrativo.
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