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Grupos de discussão formados por telespectadores influenciam tramas
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CLÁUDIA CROITOR
FREE-LANCE PARA A FOLHA, DO RIO
Sair de casa e avisar para o marido: "Querido, vou mexer na novela das oito, não demoro". O que
parece o sonho de toda viciada em
novelas não é tão irreal assim. Os
telespectadores -alguns poucos,
escolhidos a dedo- têm bastante
influência nas tramas da Globo, e
não só pelos números do Ibope.
A cada novela que põe no ar, a
emissora promove grupos de discussão nos quais são avaliados o
que agrada ou não na trama. As
conversas -mantidas em sigilo
pela Globo- são responsáveis
por desde pequenos ajustes até
guinadas radicais nas novelas.
"Para mim, esses grupos são
fundamentais, uso o que é dito lá
em todas as minhas novelas", diz
Ricardo Linhares, autor de "Agora É que São Elas". O que foi dito
na pesquisa sobre a novela das
seis, por exemplo, o fez acelerar o
romance entre Juca Tigre (Miguel
Falabella) e Antonia (Vera Fischer). "Na conversa, deu para ver
que as mulheres estavam sentindo falta de romance na trama."
Para discutir as novelas, geralmente são chamadas cerca de dez
mulheres, com idades entre 25 e
45 anos, das classes B e C. Elas só
ficam sabendo do que se trata
quando começa a conversa.
A pesquisa costuma ser feita entre o 18º e o 30º capítulo de cada
novela. Se a história não anda
bem no Ibope, uma nova rodada
de pesquisas pode ser feita. O autor pode ou não acatar as sugestões. "Em última instância, quem
manda é o criador", diz a Central
Globo de Comunicação.
De fato, há certos autores que
preferem passar longe desses grupos. É o caso de Manoel Carlos, o
autor de "Mulheres Apaixonadas". Ele diz que "jamais" mudou
nenhuma história baseado nas
pesquisas. "Nunca participei dessas reuniões, nunca li os relatórios
nem dou valor a esses encontros."
Mesmo assim, há alguns meses
a Globo promoveu uma discussão
sobre "Mulheres", e o foco principal foi o casal teen de lésbicas vivido por Aline Moraes e Paula Picarelli. A rejeição manifestada nesse
tipo de pesquisa já fez com que,
em 98, em "Torre de Babel", as
homossexuais interpretadas por
Christiane Torloni e Silvia Pfeiffer
fossem eliminadas da trama.
O autor da novela das oito, no
entanto, afirma que não se interessou pelo resultado da discussão sobre "Mulheres", que mostrou, por exemplo, uma rejeição
ao quase casal formado por Helena Ranaldi, a professora Raquel, e
seu aluno Fred (Pedro Furtado)
-segundo as participantes, Fred
não seria homem para ela.
"Vale Tudo"
As pesquisas são feitas inclusive
no exterior. Quando lançou nos
EUA a versão hispânica de "Vale
Tudo", em 2002, um grupo com
moradores latinos de Los Angeles
foi formado para discutir a trama.
Segundo Yves Dumont, responsável pela adaptação da história
de Gilberto Braga, a pesquisa
mostrou que eram muito chocantes as maldades que Maria de Fátima (vivida por Glória Pires na
versão brasileira) fazia com sua
mãe, Raquel (aqui, Regina Duarte). "Não mudamos a personagem, mas amenizamos um pouco
as suas maldades", disse Dumont.
Autora de "O Clone", Glória Perez também usa o que é dito nos
grupos. "Tenho uma pessoa que
faz pesquisa em filas de banco, no
ônibus etc. Quando as pessoas sabem que podem influenciar, elas
se comportam de forma menos
espontânea."
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