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Vizinha gosta do cantor, mas nunca o viu
Artista só sai de casa à noite em táxis que o buscam na garagem, é adepto dos serviços em domicílio e recebe poucas correspondências
Hoje e amanhã, João
Gilberto deixa a reclusão e
se apresenta no Auditório
Ibirapuera em shows com
ingressos esgotados
CAIO JOBIM
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DO RIO
É como se o artista tivesse se
tornado a própria obra. João
Gilberto leva uma vida minimalista e discreta tal qual seu
canto. Como a batida do seu
violão, conduz a rotina em ritmo próprio, alheio ao movimento e ao barulho que vêm de
fora de seu apartamento no Leblon, zona sul do Rio.
Hoje e amanhã, João deixa a
reclusão e se apresenta no Auditório Ibirapuera, em São Paulo, para aqueles que tiveram
sorte e conseguiram comprar
os 1.012 ingressos que se esgotaram em pouco mais de uma
hora no último dia 5. Serão suas
primeiras apresentações no
Brasil em cinco anos.
Pessoas que trabalham nos
estabelecimentos comerciais
próximos ao prédio onde o músico mora se referem a João
Gilberto como "homem-morcego", devido ao seu hábito de
sair somente depois que escurece. Sempre de táxi, que entra
na garagem tanto para buscá-lo
quanto para deixá-lo.
Como o elevador que conduz
à garagem é o de serviço, João
nunca é visto circulando na
área social. O edifício tem 15
andares e quatro apartamentos
por andar, divididos em duas
alas. Somente a vizinha de porta tem algum tipo de relação
com o cantor, de acordo com
um dos porteiros. A maioria
dos condôminos sabe que João
Gilberto mora ali, mas nunca o
viu. Uma moradora de 35 anos,
que se mudou para o prédio há
quatro, ficou surpresa ao ser informada pela reportagem de
que era vizinha de João Gilberto. "Eu gosto dele, mas nem sabia que morava aqui."
Pela manhã, o apartamento
permanece no mais absoluto
silêncio. É quando ele costuma
dormir. De madrugada é que se
pode ouvir João Gilberto tocar
o seu violão, revelaram aqueles
que já tiveram o raro privilégio.
João se mudou para o prédio
"há sete ou oito anos", segundo
porteiros, em busca de privacidade (antes morou num apart-hotel no Leblon). Passa longos
períodos fora, outros igualmente longos sem sair e não
costuma receber visitas -de
vez em quando, a filha Bebel e
um homem que faz compras
para ele. Caetano Veloso já foi
visto aguardando na portaria.
Porteiros garantiram que ele
passa a maior parte do tempo
sozinho e calaram ao ser perguntados sobre Cláudia Faissol, 36, sua atual empresária,
com quem o músico tem uma
filha de quatro anos. Um deles
diz ter alguns discos de João
Gilberto e se refere ao artista
como se fosse um amigo. Eles
costumam se comunicar pelo
interfone. Travam conversas
rápidas, de um a dois minutos,
sobre assuntos triviais.
Gorjetas gordas
João oferece gratificações
polpudas aos funcionários do
prédio na época das festas de
fim de ano. O mesmo diz um
entregador de um restaurante
na quadra em que o cantor mora. Ele foi recebido pelo próprio
João em duas oportunidades.
Adepto dos serviços de entrega em domicílio, o músico aciona restaurantes como o Antiquarius, o Degrau e o Pizza Al
Taglio, todos no Leblon.
João não assina nenhum jornal ou revista e não recebe muita correspondência. "Só as contas a pagar e extratos bancários", diz um dos porteiros. De
vez em quando, por telefone,
encomenda revistas na banca
Encontro dos Amigos, que fica
na esquina de sua rua.
João já disse só usar dois tipos de roupa: pijama em casa,
terno e gravata na rua. Mas já
foi visto por uma vendedora
-em um raro relato de alguém
que o viu a pé- trajado à la Inspetor Closeau, com capa de
chuva (sem estar chovendo),
gola levantada e chapéu.
"Às vezes, por causa de um
atraso num show, ou uma reclamação por causa do som, vocês da imprensa distorcem a
imagem dele. Mas ele é só uma
pessoa normal que, apesar de
ser quem é, quer levar sua vida
de maneira reservada", diz o
porteiro com quem conversa.
Quando se trata de João Gilberto, porém, as versões são
dissonantes. Um segurança que
trabalha cuidando das lojas
perto do prédio do cantor afirma que "tudo que envolve ele é
meio estranho". Assim como,
há 50 anos, muitos estranharam a música do cantor de voz
contida e violão sincopado que
firmou as bases da bossa nova.
JOÃO GILBERTO
Quando: hoje e amanhã, às 21h
Onde: Auditório Ibirapuera (av. Pedro Álvares Cabral, s/nº, portão 3
do pq. Ibirapuera, tel. 0/xx/11/3629-1000)
Quanto: R$ 30 a R$ 360 (ingressos esgotados)
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