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CRÍTICA
Sábado à tarde, terra de ninguém na TV
BIA ABRAMO
COLUNISTA DA FOLHA
É sábado à tarde e a TV está
lá, desligada. E melhor seria
se assim permanecesse, porque a
programação da TV nesse horário é uma verdadeira terra de
ninguém. O tempo não vale nada, os programas não apenas são
excessivamente longos como esticam suas "atrações" ao máximo, até uma espécie de paroxismo da enrolação.
Um quadro qualquer de um
programa qualquer de qualquer
uma das emissoras da TV aberta
dura, pelo menos, mais 50% do
que seria o necessário; segundos
que se tornam minutos são gastos em falação sobre tudo e sobre
nada; entrevistas extensas com
quem absolutamente não tem o
que dizer; repetição de cenas em
tudo semelhantes com ligeiras,
imperceptíveis e nada significativas variações etc. Famosos de
terceira e quarta linha, corpos
mais ou menos despidos e músicas que você já se cansou de ouvir
completam as alternativas possíveis para encher o tempo.
É um tempo barato, baratíssimo, o da TV aos sábados à tarde
-e, por conta disso, as emissoras barateiam o tempo do espectador de maneira quase (quase?)
desrespeitosa. Os apresentadores, estes ganham lá seu dinheirinho fazendo propaganda dentro
dos programas, com um cinismo
que borra completamente as
fronteiras entre o editorial e o comercial, a ponto de se ligar a TV e
não se saber o que exatamente
está acontecendo, se é programa
ou anúncio.
Não dá nem para falar em entretenimento, uma vez que o empenho em meramente divertir,
nada além disso, é por demais
anêmico. Trata-se mais de
preencher o tempo com gritaria,
animação genérica e, cá e lá, um
toque de mundo bizarro. E tudo
isso em câmera muito lenta -o
que torna a lembrança do precursor de todos eles, o Chacrinha, mais aguda, por contraste.
Numa dada tarde, em sábado
recente, as alternativas eram eletrizantes: concurso de mulatas,
na Globo; reportagem sobre a
entrega de um aparelho de surdez, no SBT; cantores mirins fazendo playback de sucessos radiofônicos, na Record; e a visita à
casa de uma ex-namorada de
Chitãozinho, na Bandeirantes.
OK, vá lá que um programa
desses exista e faça sentido, o
mundo é diverso etc., mas por
que o horário é tomado por programas do mesmo tipo? Claro, há
algumas diferenças, a produção
lá é mais profissional do que a de
cá, o apresentador X é um tantinho mais carismático ou menos
cínico do que o apresentador Y.
Pode-se argumentar que "Caldeirão do Huck" é mais rico do
que o "Sabadaço" e, portanto, as
celebridades de um são mais célebres do que as do outro, a exploração da "benemerência" em
"Falando Francamente" talvez
seja mais imoral do que a dos pequenos cantantes no programa
do Raul Gil, mas, no fundo, no
fundo, eles fazem mais ou menos
a mesma coisa: exibem, com toques de perversidade, um mundo tolo, vazio e, sobretudo, muito modorrento.
E-mail: biabramo.tv@uol.com.br
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