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Grupo catarinense discute relações de poder em peça
Ações prosaicas definem "cabrestos" em "O Pupilo Quer Ser Tutor", que chega a SP em agosto
Cia. Teatro Sim... Por que Não?!!! e o diretor Francisco Medeiros consultaram várias traduções para seguir à risca idéia do autor Peter Handke
LUCAS NEVES
ENVIADO ESPECIAL A
SÃO JOSÉ DO RIO PRETO (SP)
Na preparação para montar
"O Pupilo Quer Ser Tutor", peça do austríaco Peter Handke
que se despede hoje do Festival
Internacional de Teatro de São
José do Rio Preto -e chega a
São Paulo, no Sesc Consolação,
dia 1º/8-, a companhia catarinense Teatro Sim... Por que
Não?!!! e o diretor convidado
Francisco Medeiros consultaram o original alemão e traduções em francês, italiano, espanhol e português de Portugal.
O preciosismo é especialmente curioso por se tratar de
um texto que apenas encadeia
rubricas do autor. Durante
quase uma hora, os dois atores
em cena não entabulam nenhum diálogo sequer. "Era preciso saber exatamente o que
Handke falava, seguir aquilo da
maneira mais rigorosa possível", justifica Medeiros.
E o que o dramaturgo fala
sem verbalizar é do poder e dos
laços criados a partir dele. A cada ação prosaica, como descalçar os sapatos ou cortar as
unhas do pé, o tutor (que pode
ser um pai autoritário, um empregador intimidador, um seqüestrador afeito à tortura psicológica, quem sabe) renova o
cabresto sobre o outro.
Não há coerção explícita nem
ordens eloqüentes: bastam o
olhar petrificado, a altivez e o
silêncio sem fim do mais experiente para que tudo seja arrumado, limpo, guardado no casebre do interior alemão.
"O corpo tem importância
fundamental neste espetáculo,
já que não existe sustentação
verbal. O que vemos é um discurso das ações físicas que escapa ao realismo. Até tivemos
de inventar uma categoria para
caber nos roteiros de teatro
[dos jornais]: mimodrama
[pantomima dramática]", diz
Medeiros.
Roteirista de Wenders
Esse "teatro de suspensão"
proposto por Handke, que escanteia a linearidade e dilata o
tempo, tem um ascendente
bem conhecido no cinema: o
austríaco é co-autor do roteiro
de "Asas do Desejo" (1987), em
que Wim Wenders acompanha
dois anjos à cata de almas desamparadas na Berlim pré-queda do Muro.
Nos dois trabalhos, importam mais a criação de climas e
as sutis alternâncias emocionais do que o enredo; a dissertação poética toma o lugar da
narração tradicional, objetiva.
Apesar de o texto ter cenas
que evidenciam a humilhação a
que é submetido (ou a que aceita se submeter?) o pupilo, Medeiros afirma que não cabe demonizar seu algoz.
"Tomamos [a equipe da peça] o cuidado de não separar de
um jeito maniqueísta. Não conheço ninguém que nunca tenha se confundido com o poder. Pupilo e tutor estão em todos nós."
O jornalista LUCAS NEVES
viajou a convite da organização do festival
NA INTERNET
cacilda.folha.blog.uol.com.br
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