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São Paulo, domingo, 17 de agosto de 2003

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CRÍTICA

A TV precisa melhorar desde sempre

BIA ABRAMO
COLUNISTA DA FOLHA

"A televisão brasileira já está em condições de dosar melhor as suas mensagens sociais, equilibrando o entretenimento saudável com a função educativa que figura também, e principalmente, entre os seus atributos. De outra forma ela estaria desperdiçando seu extraordinário poder de influenciar a massa (...)." O trecho é de editorial publicado em dezembro de 1971, no "Jornal do Brasil" com o título "Qualidade na TV".
O gancho, como se diz no jargão jornalístico, eram os apelos do então ministro das Comunicações, Higino Corsetti, pelo aprimoramento da programação de TV. O ministro reunira-se com representantes das emissoras para "assegurar uma transmissão de alto nível" por ocasião da estréia da TV a cores no Brasil, marcada para 31 de março do ano seguinte. Não por acaso, data do oitavo aniversário do golpe de 64 -a expansão da rede de TV foi projeto caro aos governos militares.
Mais de 30 anos se passaram, a tecnologia avançou muitas léguas para além da transmissão em cores, mas as discussões sobre qualidade na TV moveram-se apenas alguns milímetros. As noções que norteiam o editorial continuam em voga. Em primeiro lugar, era e ainda parece ser um consenso a idéia de que a TV, de maneira geral, precisa melhorar. É como se à TV fosse concedido uma espécie de benefício da dúvida -aquilo que eu estou vendo é uma porcaria revoltante ou de uma repetição entediante, mas não é a verdadeira TV, é apenas o que fizeram com ela. A TV de verdade estaria num outro patamar, de "nível" mais elevado.
Em segundo, vincula-se qualidade a objetivos educacionais. A TV boa, de qualidade, seria aquela que educa, que ensina alguma coisa para o espectador. É curioso que, dos produtos da indústria cultural, por alguma razão é à TV que cabe essa expectativa de ocupar o papel de educadora -o que equivale, na outra ponta, a atribuir uma importância demasiada à sua influência, boa ou má.
Por fim, tanto 30 anos atrás quanto hoje, há uma enorme dificuldade de estabelecer um ponto de vista: a TV é péssima, todos concordamos. Mas de que ponto de vista se está observando a qualidade? Estético? Cultural? Educativo? Formal? Tecnológico? Da responsabilidade social?
É preciso definir melhor o que queremos -ou não- da TV. Ela deve ser um meio de comunicação e entretenimento? Deve dividir a função de educador com a família e com a escola? Deve ser a vitrine da cultura nacional? Deve ser uma máquina de fazer lucros para empresas privadas que exploram uma concessão pública? Deve ser a nossa Hollywood, na falta de um cinema de massas?
PS: Devo a descoberta do editorial do "Jornal do Brasil" ao excelente site TV Pesquisa (www.tv-pesquisa.com.puc-rio.br), um acervo de textos publicados na imprensa desde 1967 e atualizado diariamente.


@ - biabramo.tv@uol.com.br


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