São Paulo, quinta-feira, 19 de junho de 2008

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"Hamlet é um mutante", diz Aderbal

Para diretor de nova montagem, "deveria haver tantos Hamlets quanto McDonald's'

Espetáculo estréia amanhã, em São Paulo, com Wagner Moura no papel-título; a seu lado, estarão dois colegas do filme "Tropa de Elite"

LUCAS NEVES
DA REPORTAGEM LOCAL

"Sai um Big Mac, uma batata média e um punhado de Hamlets!" O "cliente" a fazer o pedido imaginário bem poderia ser Aderbal Freire-Filho, diretor da montagem do clássico shakespeariano que estréia em São Paulo amanhã, para quem "deveria haver tantas encenações de "Hamlet" quanto lojas de McDonald's".
De que valeria espalhar franquias da tragédia? "Para entender um pouco melhor a vida, a nossa natureza, os monstros que temos. Hamlet é um mutante: sucede ao homem instintivo e precede o racional. Reflete o homem da Renascença, que estava querendo equilibrar emoção e razão", explica ele.
Para encarnar o príncipe dinamarquês tomado por impulsos de vingança após a morte do pai e a coroação subseqüente do tio (Cláudio, interpretado por Tonico Pereira), Aderbal tem em mãos Wagner Moura, também produtor e co-autor da tradução (com o diretor e Barbara Harrington): "Sabia desde "Dilúvio em Tempos de Seca" [primeira parceria teatral dos dois, em 2004] que ele teria a generosidade de se atirar no abismo de um personagem como Hamlet. Wagner tem essa extraordinária combinação de inteligência e emoção. Consegue ser inteligente sem deixar de ser carnal."
Em entrevista à Folha em março passado, ele dissera querer mostrar a peça "como se fosse pela primeira vez". Agora, destrincha seu método: "Não vou conseguir fazer uma lavagem cerebral nas pessoas. Só quero que não vejam frases como "ser ou não ser" gravadas numa placa de bronze. Quero partir de situações, personagens e ações para que as palavras nasçam como conseqüência. Assim, elas serão novas".

Tradução sem "tributo"
Com cenografia econômica e figurinos despojados, a montagem de Aderbal pretende ir direto ao ponto -traço que também define a tradução. "Não pagamos tributo às capas de tradução postas ao longo do tempo. Não quisemos deixar nada de que não tivéssemos um entendimento perfeito, mas tampouco coloquializamos a linguagem de Shakespeare. Ela é poética sem ser rebuscada", afirma ele.
Em cena, Wagner Moura estará ladeado por dois atores com quem contracenou em "Tropa de Elite". Fábio Lago, o Baiano da fita policial, aqui vive Laertes, filho de Polônio (conselheiro do rei Claúdio). Já Caio Junqueira, o Neto do cinema, agora encarna Horácio, melhor amigo do protagonista. Lago, conterrâneo de Moura, diz que o colega o chamou para fazer a peça no meio de uma pelada "dos baianos contra o time do [ator] Pedro Cardoso".
"O Laertes seria um playboy da época: veste-se bem, gosta de um requinte. É um cara reto, íntegro, mas cai na lábia do rei Cláudio [que o convence a matar Hamlet num duelo de espadas]. Nunca fiz um personagem tão complexo no teatro", diz.
O convite a Junqueira foi feito em circunstâncias mais formais, num avião, à época do lançamento de "Tropa".
"Tradicionalmente, o Horácio serve de platéia a Hamlet, é coadjuvante. A nossa idéia foi trazer mais calor, vivacidade a ele. Agora, é o documentarista, o cronista da peça. Vai registrar as cenas com uma câmera, e as imagens serão projetadas num telão [no fundo do palco]. Isso faz com que interaja mais com a ação: é ele quem levará a história de Hamlet ao mundo", define o ator.


HAMLET
Quando:
estréia amanhã (para convidados); sex. e sáb., às 20h; dom., às 18h; até 28/9
Onde: teatro Faap (r. Alagoas, 903, São Paulo, tel. 0/xx/11/3662-7233; classificação: 14 anos)
Quanto: R$ 80


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