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MÔNICA BERGAMO
Ana Ottoni/Folha Imagem
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BIQUÍNI, SÓ PRETO A cartunista diz usar só bíquinis negros porque não quer chamar a atenção no vilarejo de cem pessoas onde vive no Uruguai; "meus cabelos já são demais"
Mulheres alteradas vão às compras
Quando não está desenhando
mulheres que reclamam de
celulite ou discutem a diferença que faz na vida aquele sapato, a cartunista argentina
Maitena reclama da celulite,
embasbaca-se diante de shorts
que a deixam com "pernas lindas" e não consegue entrar numa loja sem sair com uma sandália, como fez nas três que visitou em São Paulo com a Folha.
"Mulheres alteradas sou eu",
poderia dizer a cartunista, parodiando a divisa do escritor francês Gustave Flaubert (1821-1880). Age como as personagens que desenha. "Mulher, como dizem os homens, é tudo
igual", debocha. O sucesso e o
olhar impiedoso sobre o seu sexo, porém, diferenciam Maitena.
Aos 41 anos, ela é um dos
maiores fenômenos do humor
latino-americano. Seus livros já
venderam 1 milhão de exemplares e suas tiras são publicadas
em 18 países (da França ao México, da Holanda à Grécia). Nada mal para uma cartunista que,
em 1992, planejava abandonar o
desenho e abrir um restaurante.
Ela até já havia tido um em
Santelmo, em Buenos Aires, em
1982, chamado La Antiga Tasca
de San Fermin. Teve também
um quiosque de cigarros e foi
dona de um bar no Uruguai,
numa praia chamada La Pedrera: "Eu era uma péssima empresária. Bebia tudo o que deveria
vender". Fama, ela só havia alcançado no obscuro circuito de
quadrinhos underground, no
qual publicava histórias eróticas
em revistas como "El Vibora",
de Barcelona. Dinheiro, à época,
era pouco mais que miragem.
Até que "Mulheres Alteradas" estourou na Espanha em
1997. Há dois anos, ela abandonou Buenos Aires e foi morar
em La Pedrera, num vilarejo onde vivem cem pessoas, com
uma filha de quatro anos e o
marido e agente, Daniel Kon.
Seus dois filhos mais velhos, de
23 e 21 anos, continuam em
Buenos Aires. Enquanto fazia
compras, ela falou sobre o que
diferencia homens de mulheres,
teorizou sobre sua obsessão por
sapatos e esboçou um tratado
geral da celulite.
Alteradas x estressados
"Somos alteradas porque
fazemos muitas coisas ao
mesmo tempo. Temos muitas
frentes de combate abertas: no
trabalho, com o corpo, com o
amor, com os filhos, como mãe,
como amigas. Queremos fazer
muitas coisas, e não se pode
fazer tantas coisas bem. Algo
sempre sai mal. É por isso que
sempre estamos correndo. É
por isso que sentimos culpa
quando não cuidamos bem dos
filhos. Se descuidamos do
corpo, sentimos
culpa. Se não
somos boas
amantes, nos
sentimos umas
bruxas. A mulher
alterada não é histérica.
Histérica é aquela que seduz e
depois não quer. As mulheres
que eu desenho são mulheres
que querem ser tocadas,
querem casar e ter filhos.
Os homens se estressam, e isso
é pior. Nós, mulheres, somos
mais expressivas, choramos
mais, gritamos mais, rimos
mais, colocamos tudo para fora.
Os homens engolem tudo e têm
mais acidez, ficam doentes. É
por isso que os cabelos dos
homens caem. Nas mulheres cai
tudo, menos os cabelos."
Machismo
"Alguns homens
estúpidos me
acusam de feminista. Mas
não me interessa o que pensam
os homens estúpidos. Meus
leitores homens são todos
inteligentes e sensíveis. Os outros
que fiquem vendo televisão."
Ode ao feminismo
"Às vezes sou dura com as
mulheres, mas há uma
gota de ternura nas minhas
críticas. Sou dura porque sou
crítica comigo mesma e com as
mulheres em geral. E, às vezes,
sou um pouco machista e não
gosto disso. Lamentavelmente,
fomos todos educados por uma
geração de pais e mães
machistas, e é difícil acabar com
isso. Como mãe, tenho atitudes
machistas com meus filhos.
Quando eram adolescentes e
não voltavam de uma festa, o
que me preocupava era minha
filha, não meu filho. Isso é
machismo. A garota às vezes
sabe se cuidar melhor do que o
menino. Quando a garota tem
três namorados que telefonam a
toda hora, a mãe fica
preocupada. "Você é muito fácil,
não pode..." Mas quando o filho
tem três namoradas, ela fica
orgulhosa: "Muito bem...".
Quando uma garota deixa o
quarto bagunçado, a mãe fica
louca: "Arruma seu quarto,
menina não pode ser
bagunçada". E um homem
tampouco. É um tipo de
machismo que todas temos."
Tratado geral da celulite
"Câncer só algumas
mulheres têm, mas
celulite todas têm, cedo ou
tarde. É por isso que minhas
personagens se preocupam
mais com celulite. É horrível. É
algo que se apodera do seu
corpo como um "alien". É um ser
estranho que te invade, que
transforma a tua carne.
Todos os homens dizem que
não ligam para celulite, mas na
praia olham só para as que não
têm celulite. Não sejam
mentirosos. Celulite é uma
grande injustiça da natureza.
Por que os homens não têm
celulite? As únicas mulheres que
não têm celulite são os
travestis."
Somos machistas
"Se não tivesse existido o
feminismo, todas nós
estaríamos passando roupa.
Acho que o feminismo foi o
movimento político mais
importante do último século
por causa das mudanças sociais
que gerou. Foi mais importante
que o socialismo. Graças a ele, as
mulheres puderam ser
socialistas. Antes, as mulheres
não eram nada. Quando as
meninas de 20 anos dizem que o
feminismo é só uma
antiguidade, tenho vontade de
dizer: "Vocês não podem cuspir
contra o ventilador". É muito
fácil criticar o feminismo
quando se tem todas as
liberdades que o movimento
conquistou."
@ - bergamo@folhasp.com.br
MARIO CESAR CARVALHO (INTERINO)
COM CLEO GUIMARÃES E ALVARO LEME
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