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"O Signo do Caos", mais recente filme do diretor, estréia hoje na Mostra de São Paulo
Eu acuso
Rogério Sganzerla indica a derrocada do cinema
SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL
O cineasta Rogério Sganzerla,
57, percorreu, em 35 anos de carreira, um caminho que vai do filme-soma ("O Bandido da Luz
Vermelha", 1968) ao antifilme
("O Signo do Caos", 2003).
Os rótulos às criações foram dados pelo próprio autor, habituado
a acompanhar seus lançamentos
no cinema com manifestos, em
que ressalta os significados da
obra, escancara as angústias do
criador e, não raro, critica o que
considera empobrecido ou empobrecedor no ambiente artístico
à sua volta.
Hoje, quando "O Signo do
Caos" estréia em São Paulo, na
programação da 27ª Mostra BR
de Cinema, a disposição de Sganzerla para provocar discussões
não é diferente. A forma de fazê-lo, sim. Com a saúde fragilizada
por um câncer, o cineasta torcerá
de longe (está hospitalizado) para
que a platéia deixe a sessão (no Cineclube Directv, às 22h10) sentindo-se "baratinada" e até mesmo
"deformada pelo filme".
As declarações do diretor registradas neste texto foram colhidas
pelo ator e colaborador do cineasta Roberto Ronchezel, a partir de
perguntas da Folha.
Para Sganzerla, "O Signo do
Caos" é um "antifilme", porque
contrário aos "superfilmes", às
grandes produções que caracterizam o cinema atual e sua derrocada histórica -"Nós não temos
um cinema à altura de nosso século"- e regional -"Aqui em São
Paulo, perdeu-se a sintaxe do cinema e perdeu-se também até a
dignidade do cinema", diz.
O que teria feito o cinema parar
no tempo, segundo Sganzerla, é a
ausência do espírito transformador à maneira dos que fizeram essa arte avançar, como o diretor espanhol Luís Buñuel (1900-1983).
"Estou vendo muita aliteração e
pouca incorporação. Temos bons
cineastas. Eu vejo aí bons filmes,
algumas surpresas, mas é só diluição. Acho que tudo isso foi anunciado por [Stanley] Kubrick
[1928-1999] e pelos maiores cineastas americanos da década de
50. Eles ainda não estavam a serviço dessa diluição controlada pela
burocracia sentimental."
Tema constante das reflexões de
Sganzerla, o cinema é também o
próprio assunto de "O Signo do
Caos". Em imagens em preto e
branco de um corredor com um
alçapão, espaço que se estrutura
como uma alfândega num cais de
porto, censores avaliam e determinam a destruição de materiais
cinematográficos.
O argumento de Sganzerla é inspirado na passagem pelo Brasil,
em 1942, do cineasta norte-americano Orson Welles (1915-1985)
que não conseguiu concluir o longa que vinha filmar, "It's All True"
(É Tudo Verdade).
Em abril deste ano, Sganzerla
falou à Folha sobre o novo filme:
"É uma defesa do cinema. Mas eu
também acuso a figura do curador, aquele que agiganta orçamentos, como sendo o grande intermediário, o grande parasita da
nossa tumultuada indústria cinematográfica".
Nos depoimentos dados nesta
semana, o diretor disse que os
realizadores não devem se culpar
pela situação do cinema. "Os produtores...", dizia, num pensamento assim completado por Helena
Ignez, sua mulher e atriz deste
mais recente e de quase todos os
filmes seus: "Os produtores que se
tornaram reprodutores".
Na estréia de "O Bandido da Luz
Vermelha", a cruzada de Sganzerla era "em direção ao filme brasileiro liberador, revolucionário
também nas panorâmicas, na câmara fixa e nos cortes secos". A
esse uso da linguagem cinematográfica, incomum para a época,
chamou de "cinema fora-da-lei".
Dez anos mais tarde, lançou outro filme ("Abismu - O Abismo")
e outro manifesto: "Terei uma
mensagem a transmitir? Pois seja
essa: em arte, o Brasil, em vez de
andar, carangueja".
Hoje, Sganzerla diz que o rótulo
fora-da-lei, além de coerente com
o seu cinema, "que sempre foi de
ruptura", tentava escapar "da zona rígida e delimitada" de demarcação da mídia. "Quis que eles pudessem não definir a zona que nós
escolheríamos para definir os
nossos propósitos". Com "O Signo do Caos", Sganzerla permanece um cineasta indefinível.
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