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Crítica/dança
Do genial ao comercial, NDT 2 firma grande momento da dança
Companhia holandesa traz hoje a São Paulo coreografias que se destacam pela qualidade de movimentos e construção cênica
INÊS BOGÉA
CRÍTICA DA FOLHA, DO RIO
Em turnê pelo Brasil, o
Nederlands Dans
Theatre 2 apresenta
três peças: "27'52" (2002), do
tcheco Jiri Kylián; "Sob a Pele"
(2006), do brasileiro Henrique
Rodovalho; e "Spit" (2007), do
israelense Ohad Naharin.
Kylián, que foi diretor do
NDT de 1978 até 1999, marca a
cena da dança com coreografias
que sempre deixam extasiado
quem vê: pela qualidade do encadeamento dos movimentos,
pela capacidade de comunicação e pela construção cênica.
Em "27'52" (a duração da
coreografia), o lirismo dos encontros, a angústia da manipulação erótico-amorosa e a experiência do sofrimento batem e
rebatem a verdade de que "não
somos mais do que um ser humano", como diz um dos textos
falados ao longo da obra.
O cenário minimalista usa o
linóleo (piso especial para dança) tanto para recobrir o palco
de branco e preto como para
criar faixas que descem em varas, e ainda para enrolar ou cobrir os dançarinos. São três casais dramatizando a manipulação das mulheres e a tentativa
de escaparem, presas em si
mesmas e nos limites móveis
dos homens no palco, sutentadas pelo que em si resiste e ao
mesmo tempo se entrega.
Grande momento: o duo final,
em que o homem e a mulher, de
torso nu, enrolam-se num único corpo, riscando o palco em
metamorfoses infinitas.
A música dissonante de Dirk
Haubrich foi composta a partir
de dois temas de Mahler (1860-1911) e se vale ainda de textos
de autores como Baudelaire e
Dalai Lama.
Trabalho inédito de Rodovalho, "Sob a Pele" começa com
diverso solos, em que a dança
segue a melodia, e não propriamente o pulso da música; são
gestos lentos, cortantes, espaçados, densos. O movimento típico de Rodovalho (coreógrafo
do Quasar), com acentos que
reverberam por todo o corpo,
aqui estão mais controlados,
como se os desejos tivessem
que ser mantidos em segredo.
Em alguns momentos, faz-se
expressiva a não menos característica ironia, seja pelo movimento repetido do quadril, seja
pela postura encurvada do torso de quem não teve a atenção
que queria. Roupas, gestos e
música -do jongo à bossa nova- sublinham o que há de
fragmentado nesse universo
em busca de perfeição.
Fechando a noite, "Spit", de
Naharin, diretor do Batsheva
Dance Company, é uma colagem de quatro peças do seu repertório. Infelizmente, a coreografia sofre um pouco, aqui, pela falta de continuidade entre
as várias partes. Por exemplo,
"Black Milk" foi dançado há alguns anos pelo Balé da Cidade
de São Paulo; quem viu há de se
lembrar da coesão e da força
dessa peça, que aqui se diminui
num entretenimento distante
da intenção original.
Mas, se o programa começa
com uma peça genial e termina
com essa colagem mais comercial, nem por isso deixa de ser
um grande momento da dança.
O nível técnico dos dançarinos
é o mais alto que há; ver uma
obra de Rodovalho dançada por
essa companhia representa um
orgulho nacional; e o impacto
dos melhores momentos do
NDT 2 é algo que se guarda, depois, para toda a vida.
A crítica INÊS BOGÉA viajou ao Rio a convite da Antares
NDT 2
Quando: hoje e amanhã, às 20h30
Onde: teatro Sérgio Cardoso (r. Rui
Barbosa, 153, tel. 0/xx/11/3288-0136)
Quanto: de R$ 50 e R$ 100
Avaliação: ótimo
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