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Um dos grandes clássicos da literatura mundial, "Em Busca do Tempo Perdido", de Marcel Proust, vira história em quadrinhos
PROUST
CASSIANO ELEK MACHADO
DA REPORTAGEM LOCAL
Em uma manhã de novembro,
em 1998, o tradicional jornal francês "Le Figaro" exibiu no alto de uma de suas páginas o enunciado:
"PROUST ASSASSINADO!".
O homicida em questão era o
senhor Stéphane Heuet; a vítima,
o romance "Em Busca do Tempo
Perdido", de Marcel Proust; a
prova do crime era um delgado livro de história em quadrinhos.
Heuet, até então um desconhecido ilustrador, acabava de publicar o primeiro volume de sua
adaptação da maior obra literária
francesa do século 20 para o universo das tirinhas. E ganhava de
presente do diário parisiense, na
primeira crítica do projeto, as
avaliações de "prodigiosamente
vazio", "blasfemo" e "cruel".
O tempo, objeto maior da escrita de Proust (1871-1922), acabou
por absolver o desenhista. Os dois
principais jornais do país, o "Libération" e o "Le Monde" (abre
aspas: "notável introdução à leitura de Proust"), acolheram o projeto, os franceses compraram 180
mil exemplares do álbum, os quadrinhos foram vendidos para
uma dúzia de países.
Chegou a vez do Brasil. A editora Jorge Zahar está lançando esta
semana o primeiro exemplar do
"Em Busca do Tempo Perdido"
quadriculado, adaptado do volume "No Caminho de Swann".
Se uma das idéias do projeto era
poupar o tempo -sempre o tempo- de leitores preguiçosos em
enfrentar os sete grossos tomos
originais da obra de Proust, é bom
deixar aqui um lembrete. A adaptação está prevista para ser concluída, na França, só em 2020.
Em entrevista à Folha, Stéphane
Heuet explica o porquê. "Demorei mais de três anos para fazer o
primeiro álbum. Para isso, li dezenas de vezes o romance, vasculhei
todos os estudos feitos sobre ele,
visitei todos os lugares mencionados na obra", diz o "adaptador".
A parte mais trabalhosa, afirma
o desenhista, foi a última. Heuet,
46, que chegou a ser marinheiro e
que nunca fizera uma história em
quadrinhos antes, começou o
projeto com a idéia de simplesmente ilustrar aquilo que Proust
viu, e não as coisas que ele queria
que os leitores imaginassem.
"Comecei querendo fazer um
documentário visual do romance,
pensando nos que já haviam lido
"Em Busca". Mas jornalistas e leitores acabaram enxergando aí um
modo de descobrir o universo de
Proust", comenta Heuet, na entrevista por e-mail. "Fiquei satisfeito e hoje trabalho para os dois
públicos: proustianos ferrenhos e
os que querem ser apresentados."
Nessa busca, o quadrinhista
usou quase sempre trechos literais do romance, mas trechos
muito pequenos.
A clássica cena do narrador
mergulhando o bolinho "madeleine" no chá, "gatilho" das lembranças que conduzem o livro, é
um exemplo. Descrito em volumosas páginas no livro, o fragmento (veja ao lado) é resumido
em menos de 20 frases.
Acompanhando-as, os quadrinhos com "sotaque" semelhante
aos traços do belga Hergé, criador
do personagem Tintin. "Não tenho como negar, ele é meu mestre. No próximo volume farei até
uma homenagem a ele", diz.
EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO
(COMBRAY). Autor: Stéphane Heuet
(adaptação da obra de Marcel Proust).
Editora: Jorge Zahar. Tradução e notas:
André Telles. Quanto: R$ 39 (76 págs.).
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