|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
MÔNICA BERGAMO
Prefeituráveis no divã
O ex-ministro José Serra (PSDB) parece seduzido pelo pessimismo e dá a impressão
de estar cumprindo uma obrigação. Já o
ex-prefeito Paulo Maluf (PP) concorre pela enésima vez por ser um "compulsivo", por
ser o "incapaz de parar". A prefeita Marta Suplicy (PT) é "exagerada", mas este é um dos elementos do "gozo do poder". E a ex-prefeita Luiza Erundina (PSB) tem "a psiquê dos gerentes".
Em comum, os quatro primeiros colocados
(segundo a última pesquisa Datafolha) tinham
a corrida à Prefeitura de São Paulo. E, agora, a
análise psicológica feita a pedido da Folha pelo
psicanalista Jacob Pinheiro Goldberg, doutor
em psicologia, com trabalhos na área de psicologia política. "Não fiz uma
análise da personalidade, pois isso seria adivinhação, mas sim do personagem", disse ele.
Goldberg tratou "da figura ou da figuração
composta pelos marqueteiros e até pelos próprios políticos". Para ele, não há impedimento
ético na tarefa, uma crítica comumente feita. "A
ética não só permite esse gênero de análise como até o exige, porque se não é o psicólogo, se
não é o sociólogo, o estudioso do comportamento humano que vai auxiliar o eleitor nesse
entendimento da figura pública, quem será?"
"A impressão que dá é a de que
José Serra está cumprindo um
dever e, em determinados instantes, passando uma certa atitude de "desgusting" [de estar repugnado]. Como quando, por
exemplo, pega os adesivos que
colocam nele e os arranca."
"Embora tenha começado a
sua carreira como líder estudantil, presidente da UNE, por
isso num processo idealista e
sentimental muito forte, com o
passar do tempo e com suas experiências acabou fazendo uma
opção "low profile" [discreta],
que lembra um escoteiro."
"Ele veste o caráter quase beneditino, sacrificial, o sacerdócio. Parece ser seduzido pelo
pessimismo. Há um mau humor que eu diria que fica mais
presente do que a antipatia alegada por seus opositores."
"Em termos de atitude de potência e impotência do político,
Serra fica numa posição embolada entre os dois. É uma daquelas personagens que está sempre com um risco de ficar
aquém, ao contrário do Paulo
Maluf, que corre o risco de ficar
sempre além, até do real."
"A Marta Suplicy faz esse novo
papel feminino, no qual não
tanto no caso do [senador petista] Eduardo Suplicy, [ex-marido], mas muito mais no caso do
Luis Favre [atual marido], o
consorte é que é obrigado a fazer o papel de rainha-mãe."
"Que personagem é essa que,
além de tudo, é psicanalista e
deve saber o que está fazendo,
que faz um casamento, afrontando, aparentemente, uma
porção de estruturas e rigidez
de conduta? Numa cidade como
essa, ela mantém laços cordiais
com o ex-marido, casa com um
sujeito que é estrangeiro..."
"A própria indumentária é
um caso de organização de aparência. Lembra o escritor Oscar
Wilde, que dizia que só as pessoas superficiais não dão importância à aparência. A Marta
carrega duro na "gestalt"."
"Quando ela fica numa posição defensiva exagerada e, por
ser exagerada, contraproducente, não é gratuito não. É um dos
elementos do gozo do poder.
Em termos de carisma, faria
uma certa deferência para a
Marta como "show-woman"."
"Luiza Erundina tem muito a
ver com uma líder tribal. É uma
mulher que tem um histórico a
cumprir, até mesmo o histórico
de inserção do nordestino em
São Paulo. Tem as características e as idiossincrasias do provincianismo. É uma mulher do
interior do Brasil, como boa
parte da população daqui."
"Diferentemente de Marta e,
Maluf, ela não acontece. A Marta, apareça onde aparecer, num
velório ou numa festa, mesmo
antes de ser candidata, é um
evento. O Maluf até cumprimentar paciente de UTI foi. Já a
Erundina é o não-happening."
"Sua candidatura é a do acerto
de contas feminino, mas que
não tem o caráter passional da
de Marta, e sim o de contabilidade fria. A sensação que ela dá
é a seguinte: lucro e déficit. Ela
está ali com lápis vermelho e
azul e marcando. É mais pragmática, menos impulsiva."
"Têm a psiquê dos gerentes, a
falta de carisma dos gerentes.
Basta perguntar para qualquer
grande empresário, se tivesse de
contratar entre esses quatro um
gerente, qual deles seria?"
"Paulo Maluf é um caso extremado de onipotência. Se amanhã achar que deve galgar o
monte Everest, ele vai sair andando e tentar subir. Se no meio
do caminho desistir ou faltar
força, vai culpar a montanha."
"Fico até em dúvida se Paulo
Maluf quer ser candidato ou se
ele está se obrigando a ser candidato por ser uma compulsão,
por ser um compulsivo. É a necessidade permanente do moto-contínuo do show. Quer dizer, é o artista que é incapaz de
saber o momento de parar."
"Eu o fico imaginando numa
situação em que é absolutamente comprovada qualquer acusação em relação a ele. Maluf fica
como o personagem de "Alice
no País das Maravilhas", o
Humpty Dumpty, para o qual as
coisas são como ele quer que sejam, as palavras têm o significado que ele quer que tenham."
"Ele se refere a si mesmo como outra pessoa. Diz: "O Maluf
construiu esse viaduto". É muito
curiosa essa satisfação que ele
tem de ser, ao mesmo tempo, o
protagonista e o auditório da
sua própria biografia."
O DONO DO DIVÃ
Política é tema de psicanalista
Fabiana Beltramin/Folha Imagem
|
O psicanalista e especialista em psicologia política Jacob Pinheiro Goldberg, em seu consultório, em SP |
Em 17 de março de 1985, no
auge da crise de saúde de Tancredo Neves, a Folha publicava
reportagem com o título: "Psicólogo requer melhor comunicação com o poder". O psicólogo era o mineiro Jacob Pinheiro
Goldberg, que já naquela época
se dedicava à psicologia política
e a às vezes conturbada relação
entre os homens de cargos públicos e a sociedade.
Desde então, ele lançou vários
livros sobre o assunto, sendo os
mais recentes "Monólogo a
Dois" (Centro de Estudos da
Mentalidade, 2002) e "Cultura e
Agressividade" (Landy, 2004).
Nas últimas semanas, a Folha
publicou duas análises semelhantes à sua. Na primeira, em 7
de junho, o psiquiatra Jerrold
M. Post, que presta serviços à
CIA, perfilava líderes mundiais.
Na segunda, de 5 de julho, o psiquiatra Justin Frank explicava o
que escreveu em seu livro,
"Bush on the Couch" (Bush no
divã), em que analisa o presidente norte-americano.
Texto Anterior: Filmes e Tv paga Próximo Texto: Televisão: Patrão pede economia a Gugu, Hebe e Ratinho Índice
|