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O DECLÍNIO DO IMPÉRIO
Para especialistas, novas tecnologias formam uma geração que não se contenta com as loirinhas
Disputa envolve game, internet e TV paga
DA REPORTAGEM LOCAL
Em 1983, quando a então modelo Xuxa Meneghel estreou como apresentadora do "Clube da
Criança", na TV Manchete, a única preocupação das emissoras
eram os canais concorrentes.
A Globo corria atrás da descoberta da Manchete, que era assediada pelo SBT, que tentava contratar a nova carinha da Record. E
a programação infantil se resumia
à compra de desenhos enlatados e
a um vaivém de loirinhas e de seus
cachês cada vez mais gordos.
Do tempo em que o Atari chegava ao Brasil até hoje, a fórmula
para conquistar a audiência infantil tornou-se bem mais complexa. Para especialistas, a televisão aberta passou a disputar a
atenção dos baixinhos e dos
anunciantes com internet, canais
pagos e a enxurrada de games.
"Houve uma época em que as
manhãs das TVs eram basicamente preenchidas por programas de auditório com loiras. A
chegada da TV paga e de outras
mídias ajudou a mudar esse panorama. A criança de hoje não é
mais a mesma que ficava somente
exposta à TV aberta. E esse novo
cardápio de mídias pulverizou os
anunciantes", diz Dora Câmara,
diretora do Ibope Mídia.
Na Band, Marlene Mattos demonstra estar de olho na mudança de comportamento da nova geração. "Tenho muita preocupação com as crianças que já nascem e são apresentadas ao computador, à internet. Elas são bombardeadas por um excesso de informação que é nocivo", diz.
Luís Erlanger, diretor da Central
Globo de Comunicação, afirma
que a programação infantil da
emissora tem de se modernizar
constantemente. "Esse público
passa por freqüentes mudanças e
sofre diferentes influências."
A Record não fala oficialmente
sobre o assunto, mas a concorrência com outras mídias foi um fator
decisivo para acabar com o programa de Eliana e restringir a
oferta de infantis a desenhos nas
manhãs de sábado e domingo.
O faturamento de merchandising da apresentadora é alto, mas
a parte repassada à emissora, nem
tanto. As loiras faturam por conta
própria, com produtos que levam
seus nomes, e cobram salários cada vez mais altos. Conseqüentemente, tornam-se negócios não
tão atrativos para os canais.
Diante disso, fica cada vez mais
difícil fechar a conta da produção
dos programas, já que grandes
anunciantes de produtos infantis
passaram a dividir a verba com
outros meios de comunicação.
Na direção da Record, a avaliação é que, apesar de a massa de
audiência não ter migrado para os
canais pagos, eles têm "roubado"
importantes anunciantes da TV
aberta. É a minoria dos baixinhos
que assiste à TV paga, mas é justamente a fatia dos filhos de quem
mais pode comprar brinquedo.
Além disso, a publicidade começa a demonstrar preocupação
com a qualidade dos programas
de TV. Assim como tem fugido do
jornalismo "mundo cão", tornou-se mais seletiva com a programação infantil. Na semana passada,
Orlando Lopes, presidente da Associação Brasileira de Anunciantes, em discurso no MaxiMidia,
falou sobre a responsabilidade social de investir em bons infantis.
"Abaixo o custo por mil", disse,
em referência à expressão publicitária que considera o preço do
anúncio em relação à quantidade
de telespectador que vê o programa. Segundo ele, mais do que se
preocupar com números, quem
vende produto infantil deve procurar qualidade na televisão.
Desenhos
Os desenhos animados-mesmo os mais antigos- continuam
em alta.
O sucesso de audiência dos exibidos nas manhãs do SBT, que,
sem âncora loira ou morena, bate
até o ibope de Xuxa, ajudou a Record a concluir que não valia mais
a pena bancar o infantil de Eliana.
Para Beth Carmona, presidente
da TVE do Rio e da ONG Midiativa, as novas animações são mais
estimulantes para as crianças
acostumadas a games e internet
do que às gracinhas das loiras.
"Se, por um lado, há crítica a desenhos japoneses, por outro sabe-se que eles têm uma linguagem
não linear que trabalha muito o
raciocínio e a curiosidade das
crianças. Utilizam a fragmentação
de idéias e exigem que o telespectador faça associações."
Apesar do sucesso fenomenal
da nova safra de desenhos, Carmona acredita que ainda haja espaço para a teledramaturgia infantil, vide o sucesso da regravação do "Sítio do Picapau Amarelo", na Globo. "Apesar do ritmo
dos videogames, acreditamos na
possibilidade de retomar o bom
contador de histórias, de lendas",
afirma ela, que prepara na TVE o
lançamento de "Menino Maluquinho" para 2005, entre outros
produtos de teledramaturgia.
De gente grande
Sintoma ou não da falta de criatividade na programação infantil,
as atrações mais assistidas por
crianças de quatro a 11 anos, de
acordo com o Ibope, são dirigidas
a adultos, como o "Jornal Nacional", as novelas e os humorísticos
da Globo.
Numa lista dos 30 programas
mais vistos por essa faixa etária
em agosto, fornecida à Folha pelo
instituto, apenas três são realmente dirigidos a crianças:
"Criança Esperança", da Globo
(11º lugar), "Os Flinstones" (21º) e
"Festolândia" (29º), do SBT.
Dora Câmara afirma que o resultado está atrelado ao fato de os
pais mandarem no controle remoto durante o horário nobre.
(LAURA MATTOS)
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