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Secretaria anula concurso após denúncia
Resultado da competição que atribuiu R$ 5,6 milhões para 12 longas de ficção é suspenso; jurados voltam a se reunir na segunda
Cineastas pressionaram secretário a impugnar resultado por relação de um dos jurados com dois dos filmes vencedores
DA REPORTAGEM LOCAL
A Secretaria Municipal de
Cultura anulou o resultado de
seu concurso de patrocínio de
longas-metragens de ficção,
após identificar "vícios no processo de avaliação dos projetos", conforme afirma em nota,
divulgada ontem.
Um grupo de cineastas denunciou ao secretário que um
dos jurados, o distribuidor
Jean-Thomas Bernardini, tinha vínculos com dois dos 12
vencedores. Os prêmios, anunciados no último dia 14, totalizavam R$ 5,6 milhões.
O júri do concurso foi convocado a se reunir novamente na
segunda, exceto Bernardini.
Distribuição
A Imovision, empresa de
Bernardini, tem contrato de
distribuição com dois dos vencedores -"O Lixo Nosso de Cada Dia", de Philippe Barcinski,
que recebeu prêmio de R$ 600
mil, e "Trabalhar Cansa", de
Marco Dutra e Juliana Rojas,
premiado com R$ 300 mil.
A definição do valor do prêmio atribuído a cada vencedor
-até o teto de R$ 700 mil- cabia ao júri, presidido pela poeta
Renata Palottinni e integrado
pelo escritor João Silvério Trevisan, pelo diretor da Cinemateca Brasileira, Carlos Magalhães, e pelo jornalista Alcino
Leite Neto, da Folha, além de
Bernardini.
De acordo com o edital que
estabelece as regras do concurso, "os membros da comissão
de seleção não poderão ter
quaisquer vínculos profissionais ou empresariais com as
propostas apresentadas ou de
parentesco com os proponentes" (item 4.2.2).
Bernardini afirma que a secretaria tinha conhecimento
de seus contratos com os filmes vencedores. "Eu não me
propus [a ser jurado]. Fui chamado e ainda insistiram. Entre
55 filmes, ou um distribuidor
tem algum ou não é um distribuidor. Avisei a secretaria dos
filmes com os quais eu estava
envolvido", diz.
Procurada pela Folha, a Secretaria de Cultura decidiu se
manifestar apenas em nota oficial (leia no quadro abaixo) e
informou que o secretário Carlos Augusto Calil falaria sobre o
episódio apenas na terça-feira,
quando deve ser divulgado o
novo resultado.
Francês radicado no Brasil
há duas décadas, proprietário
também do cinema Reserva
Cultural e responsável pelo
lançamento no país de filmes
como "Dogville" (Lars Von
Trier) e "Amantes Constantes"
(Philippe Garrel), Bernardini
afirma que sua ligação com os
filmes concorrentes em nada
influiu em seu julgamento.
"Francamente, que eu distribua o filme ou não, não influencia nem para o bem nem
para o mal. Quem ganhou não
tem que me agradecer e quem
perdeu não tem que reclamar
de mim. Defendo um tipo de cinema e uma ética da qual não
vou abrir mão agora. Eles me
fizeram trabalhar e agora meu
nome está envolvido num escândalo. É constrangedor."
Palottinni afirma que desconhecia o vínculo entre o distribuidor e os concorrentes.
"Quando presidi o júri, não tinha notícia de que havia um jurado que tivesse qualquer envolvimento com os projetos.
Isso não me foi informado. A
mim, Bernardini me parece
uma pessoa correta, mas, se
houve essa irregularidade, e isso cabe à parte administrativa
da secretaria apurar, vamos ter
que refazer os resultados", diz.
Preterido
Além da presença de Bernardini no júri, outros aspectos do
concurso foram questionados
por cineastas preteridos na disputa que, segundo a Folha apurou, pressionaram o secretário
para impugnar o resultado.
Luiz Alberto Pereira afirma
não ter feito parte do grupo,
mas diz: "O concurso estava todo irregular. Se não fosse anulado, seria caso de [recorrer ao]
Ministério Público". O fato de
quatro vencedores terem suas
tramas ambientadas em outros
Estados fere, na opinião dos
que protestaram, a exigência
do edital de "vínculos culturais
com a cidade de SP".
"Se meu projeto não fosse
ser rodado aqui e eu visse um
concurso que pedisse vínculo
cultural com a cidade, eu nem
me inscreveria", diz Pereira.
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