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Festa gay usa Beckham e vela para afastar polícia
Precaução existe mesmo após renúncia de Fidel, "novos tempos" para homossexuais
Com militância de Mariela,
filha de Raúl Castro, gays já
podem dispensar o sal
grosso, mas baladas ainda
acontecem longe da cidade
DA ENVIADA A HAVANA
A sorveteria Coppelia, eternizada pelo filme "Morango e
Chocolate" (1993), já não é
mais a mesma. Casais gays dividem as mesas numa Cuba que,
desde a época do filme até alguns meses atrás, não era tão
gentil com os homossexuais.
"Agora são outros tempos",
diz a jovem cubana Lis, 25 anos,
numa lanchonete em frente à
sorveteria, com o amigo gay
Alejandro (eles preferem não
dizer os sobrenomes). Os novos
tempos a que ela se refere começaram na renúncia de Fidel
Castro, que passou o governo
ao irmão, Raúl Castro, em fevereiro deste ano. "Com a Mariela
[Castro, filha de Raúl, militante
do movimento gay] falando por
nós, estamos mais livres."
Liberdade para andar na rua,
sim, mas nem tanto. O ator e
fundador dos Satyros Ivam Cabral passeia pela mesma calle
23, no bairro Vedado, quando
vê policiais dando um aviso:
"Este é um ponto de homossexuais, só para que você saiba.
Mas, se quiser ficar aqui, pode".
No sábado, dia 21, Cabral está
de volta à rua, com mais alguns
integrantes dos Satyros. Aguardam juntos porque é de lá, da
calle 23, na esquina da sorveteria Coppelia, que saem táxis
com muitos gays de Havana nas
noites de quinta a domingo: vão
para "las fiestas ilegales" -ou
clandestinas, chamadas assim
pela forte repressão que as festas gays sofreram durante muito tempo por parte do governo.
Ao contrário das raves semiclandestinas, em que DJs se
apresentam em campos de futebol longe de Havana, as tais
festas têm menos jeito de balada, e mais de evento cultural.
"Em Cuba, tudo é possível", diz
o cubano Ahmed (sobrenome
não revelado), 24, que levará os
brasileiros até a festa.
Para ir, é preciso estar acompanhado de um cubano como
Ahmed e conhecer um dos taxistas que sabem o endereço.
"Eu não sei, mas fiquem tranqüilos. Com a Mariela [Castro]
a polícia não faz mais nada", diz
Ahmed. O táxi custará 2,50
CUCs (cerca de R$ 4,20) por
pessoa até o local, a cerca de 30
minutos da cidade.
"As festas são longe porque,
quando começaram, temíamos
a polícia. Agora, acabam sendo
lá mesmo", explica Ahmed.
Mesmo assim, quando passa
pela polícia, o taxista diminui a
velocidade -no carro, as pessoas fazem silêncio e só o som
do grupo cubano Los Insurectos" continua alto.
Pegación!
Na entrada da festa, há um altar: uma santa, vela e... um pôster de David Beckham. "É para
proteger a festa da polícia. Antes da Mariela, colocávamos
mais coisas, sal grosso, incenso...", conta ele.
Depois de um corredor de luz
amarelada com mais cartazes
(de Enrique Iglesias e Ricky
Martin), chega-se ao caixa, que
lembra o de uma festa de república universitária: uma mesa
de madeira e uma caixa de sapatos. Para entrar, são cinco
CUCs (R$ 5) para turistas e dois
pesos (R$ 0,12) para cubanos.
Há algumas mesas instaladas
diante de um palco pequeno,
decorado com um globo de espelhos no teto e uma cortina de
tiras coloridas de cetim e paetê.
Atrás do setor de mesas, em pé,
os homens -não passam de dez
as mulheres da festa- se acumulam, mais distantes do palco, abraçados ou dançando.
"Eles sabem que estão numa
festa gay, certo?", pergunta Ahmed, referindo-se a alguns atores dos Satyros. "Porque aqui é
pegación!", diz em portunhol,
que aprendeu por já ter vindo
ao Brasil visitar o grupo.
À meia-noite, começa o
show. "Aplausos para a mais
temperamental das mulheres
de Havana: Império!", anuncia
um locutor. "Hola! Hola! Agradeço a todos que pegaram um
avião para estar aqui, trem ou
carro. É uma honra", diz Império, uma transexual de vestido
longo branco-e-preto.
"Perra! Perra! [Cachorra!]",
surgem gritos na platéia. Ela ri
e começa a cantar em inglês. É
seguida, então, por outras que
também apresentam músicas
do pop norte-americano -incluindo, claro, Madonna.
O grande momento para os
brasileiros da platéia é quando
a atriz Phedra D. Cordoba vai
ao palco. Mesmo depois de 54
anos longe de Cuba, ela é a única das transexuais da noite que
usou uma música cubana no
show. Dançou, no palco, uma
salsa.
(AF)
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