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"Fazendo Sentido", que saiu nos EUA, investiga como o formato, a paginação e a ilustração de uma obra têm papel central na construção do significado do texto
A consciência gráfica da escrita
Making Meaning - "Printers of the Mind"
and Other Essays
360 págs., US$ 24,95
de Donald F. McKenzie. Org. de Peter D. McDonald
e Michael F. Suarez.
University of Massachusetts Press (EUA).
Onde encomendar
Livros em inglês podem ser encomendados, em
SP, na livraria Cultura (tel. 0/xx/11/3285-4033).
Roger Chartier
especial para o "Le Monde"
Donald F. McKenzie foi professor de crítica textual na Universidade de Oxford. Ele morreu
brutalmente em 1999, aos 68
anos. Pertencia a uma disciplina austera,
a bibliografia, entendida como o estudo
material dos livros impressos, e é sem
dúvida por isso que sua obra permaneceu tanto tempo menos
visível que outras. Hoje,
graças a dois ex-alunos,
Peter McDonald e Michael F. Suarez, 11 de seus
ensaios estão facilmente
acessíveis em "Making
Meaning - "Printers of the
Mind" and Other Essays"
(Fazendo Sentido).
O trabalho de McKenzie
primeiramente revolucionou a disciplina bibliográfica em si, ao combinar a
descrição morfológica
dos objetos impressos
com um estudo histórico
dos arquivos dos impressores -quando eles subsistiram, o que infelizmente é raro antes do século 19. Ao confrontar os
registros das contas e a
produção conservada por
vários ateliês tipográficos,
McKenzie reconstruiu as práticas dos
mestres impressores e de seus operários
na época do antigo regime tipográfico,
entre os séculos 16 e 18.
Aos "printers of the mind" inventados
pelos modelos abstratos da bibliografia,
ele pôde opor o trabalho efetivo dos
compositores e prensistas, ocupados
com a produção de várias obras ao mesmo tempo e mobilizados tanto pela impressão de trabalhos citadinos ou "job
printing" (cartazes, ingressos, formulários etc.) quanto pela de livros.
Mas para McKenzie o estudo do trabalho tipográfico e das restrições que governam a produção impressa nunca foi
um fim em si. Ele deve permitir, antes de
tudo, aprofundar o conhecimento das
obras e sua apropriação. Afastando-se
dos discursos críticos que afirmaram a
morte do autor e depois a do leitor, ele
lembrou que os sentidos das obras também dependem de seus dispositivos impressos: formato, paginação, divisão,
pontuação, ilustração.
Esses dispositivos exercem um papel
essencial na construção do significado
do texto e traduzem uma multiplicidade
de intenções e decisões, próprias dos diferentes atores envolvidos no processo
de publicação: o autor, os copistas, o livreiro-editor, o mestre impressor, os
compositores, os revisores.
Donald McKenzie sugere assim uma
possível tipologia da consciência (ou da
inconsciência) gráfica dos escritores, cujas figuras extremas são, de um lado, o
total desinteresse pela publicação impressa da obra, abandonada à opção e
aos hábitos daqueles que trabalham no
ateliê de impressão, e, de outro, a vontade de um rígido controle sobre a forma
material dada ao texto.
Antes de lecionar em Oxford, McKenzie havia sido professor em Wellington,
em sua Nova Zelândia natal. Lá ele dirigiu uma companhia teatral, fundou uma
editora que imprimia os poetas contemporâneos e teve um papel fundamental
no desenvolvimento da Biblioteca Nacional. Mais importante
ainda, colocou sua competência científica a serviço das vítimas da colonização.
Em um estudo hoje retomado na reedição inglesa de "Bibliography and
the Sociology of Texts"
(Cambridge University
Press, 1999), ele demonstrou que o Tratado de
Waitangi, de 1840, pelo
qual os chefes maoris teriam supostamente abandonado sua soberania à
coroa inglesa, na verdade
repousava sobre uma série de profundos equívocos. Os signatários ingleses e indígenas do tratado
davam sentidos diferentes
às palavras (o termo maori traduzido como "soberania política" pelos primeiros significava somente "administração dos territórios" pelos segundos), aos
objetos escritos e aos gestos. Para os indígenas, que haviam entrado em contato
com a cultura escrita somente 15 anos
antes, o documento assinado representava apenas um vestígio pobre e incompleto de compromissos mais complexos,
enunciados pela palavra viva.
McKenzie salientou assim que a soberania britânica era o resultado de uma
violência simbólica, perpetrada graças à
manipulação de uma irredutível distância cultural. Donald F. McKenzie era um
sábio rigoroso e generoso. Ele nunca separou o trabalho de conhecimento da
exigência de justiça.
Roger Chartier é historiador francês, autor de
"Práticas da Leitura" (Estação Liberdade).
Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves.
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