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CRISTOVÃO TEZZA
O autor
Chega a ser uma crueldade
escolher entre Machado de Assis
e Guimarães Rosa, duas
referências absolutas da
linguagem e da literatura
brasileiras.
Mas são também dois projetos
ficcionais distintos, duas visões
de mundo marcantemente
diferentes. E é com base nelas
que faço minha escolha pessoal
-se fosse o caso limite,
digamos, de levar apenas a obra
de um deles para uma ilha
deserta.
Prefiro Machado de Assis,
porque sinto nele um Brasil, ou
um mundo novo, que se abre
inteiro; a obra de Machado
antecipa um país mental que
nem sequer existia e que
continua se fazendo aqui e
agora.
Enquanto Guimarães Rosa nos
fala de um universo que se
fecha, um Brasil que se encerra,
um fim de caminho que
encontrou nele o seu poeta
maior.
Não por acaso, Machado
continua alimentando os
escritores; seu mundo literário
não se circunscreve a um tema
ou a uma linguagem; há uma
transparência no seu olhar que
nos dá passagem. Já a força
temática e lingüística de
Guimarães é tamanha que pobre
daquele que, entrando no seu
mundo, tente lhe seguir os
passos. Machado é um mapa;
Guimarães, um oráculo.
A obra
Na duríssima escolha entre
"Dom Casmurro" e "Memórias
Póstumas de Brás Cubas" -que
para mim concentra o melhor
Machado de Assis-, fico com o
primeiro, por essa combinação
perfeita entre o narrador não
confiável, o mundo se
constituindo de impressões num
quebra-cabeças que depende
apenas da solidão do nosso olhar
e, de certa forma, a fundação
brasileira do "cidadão moderno",
sem tábua a se agarrar.
Mas reconheço que "Brás Cubas"
tem certamente uma maior
importância histórica, pelo
impacto de sua originalidade e
pela antecipação praticamente
completa de tudo o que Machado
faria depois. Além disso, há um
alcance social nas "Memórias
Póstumas" que continua
batendo no Brasil.
CRISTOVÃO TEZZA é escritor, autor do romance "O Filho Eterno" (Record).
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