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ABEL BARROS BAPTISTA
O autor
Machado de Assis é muitíssimo
superior a Guimarães Rosa, e
dou para isso razão fortérrima: o
próprio Rosa o reconheceu.
Há uns anos, certa pessoa, que
não ganhou reputação pela
inteligência, olhou-me nos olhos
e de dedo em riste falou isto:
"Pois fique o senhor sabendo
que eu considero Guimarães
Rosa muitíssimo superior a
Machado de Assis". Estremeci. E
talvez vacilei. Mas por pouco
tempo.
Era o caso de, na altura, eu ter
relacionamento meio
privilegiado com senhora
brasileira dada ao espiritismo,
não obstante estudos de pós-graduação na USP. Fácil, ela
chamou o próprio Rosa e
perguntou para ele: "Puxa! seu
Rosa, o senhor se acha mesmo
superior a Machado?".
E a resposta veio claríssima:
"Deixa de besteira, moça! Foi
bobagem assim o que lhe
ensinaram na universidade?
Tem nenhum quem superior a
Machado, maior que ele só o um
Shakespeare! Capaz também
que Deus, mas duvidando e
andando, viu? Duvidando e
andando".
A obra
Ressalvo que não votei em
nenhum autor; mas sempre
reconheço que, se me
recusassem comida antes que eu
elegesse, decerto elegia
"Memórias Póstumas de Brás
Cubas", em parte por motivo que
não divulgo, e no resto apenas
oferecendo em fundamento este
poema de Ricardo Reis:
"Quero dos deuses só que me
não lembrem./
Serei livre -sem dita nem
desdita,/
Como o vento que é a vida/
Do ar que não é nada./
O ódio e o amor iguais nos
buscam; ambos,/
Cada um com seu modo, nos
oprimem./
A quem deuses concedem/
Nada, tem liberdade."
ABEL BARROS BAPTISTA é professor de literaura na Universidade Nova de Lisboa, em Portugal, e autor de "O Livro Agreste" e "Autobibliografias" (ambos pela ed. da Unicamp).
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