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Bombardeio arruína vida de garoto
ESPECIAL PARA A FOLHA
Estava em Bagdá quando um
homem que andava de mãos dadas com um menino me chamou
a atenção. Quando me aproximei,
vi que era mais uma vítima da invasão do Iraque, o que se confirmou quando comecei a questionar Ali, pai do pequeno Ayad.
Surpreso pela minha atitude e
feliz por eu ser brasileiro, ele concordou em me receber em sua fazenda, em Hilla, para registrar o
cotidiano do menino. Passei dois
dias na casa de Ayad, que chorou
quando eu fui embora.
Oficialmente, a Guerra do Iraque acabou. Mas, para Ayad Ali
Karim, 12, nascido na Guerra do
Golfo (1991) e gravemente ferido
durante a invasão liderada pelos
EUA em 2003 de seu país, a vida
continua uma batalha. Ele é prisioneiro de uma horrorosa cicatriz mental e física, sofrida num
bombardeio americano.
Nascido em Bagdá -enquanto
seu pai, Ali Karim, 42, lutava na
Guerra do Golfo como soldado da
Guarda Republicana de Saddam-, Ayad viu-se no front 12
anos mais tarde, enquanto helicópteros americanos atacavam a
lavoura onde ele brincava.
No mesmo ataque à fazenda de
seus pais, seu tio Mohammad
perdeu parte de sua perna direita,
e sua avó, Telba, teve suas duas
pernas atrofiadas pelos estilhaços
das bombas enquanto tentava
ajudar Ayad, já ferido.
Aquele dia, em abril de 2003,
deixou Ayad cego do olho direito,
queimado seriamente no rosto e
com a vida completamente alterada. "Ele teve de sair da escola porque os outros amigos riam dele",
disse seu pai.
"Ayad sabe falar, mas não consegue mais ler. Ele também parou
de nos ajudar em nossa fazenda.
Agora, ele passa todo o tempo
brincando com a irmã e o primo
ou dormindo até mais tarde. Mesmo com esse problema no rosto,
às vezes, ele dorme fora de casa,
sob o sol, após acordar. É muito
difícil convencê-lo a rezarmos
juntos", completa seu pai.
Profundas feridas psicológicas
também arruinaram a vida de
Ayad. Como relata a mãe, Nazahra Anaid, 53: "Recentemente, ele
ficou nervoso comigo e tentou me
matar primeiro com uma faca de
cozinha e, depois, com o rifle AK-47 do meu marido, só porque eu
queria fazê-lo acordar cedo".
(MAURÍCIO LIMA)
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