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"Apenas cumpro ordens", diz marine
ESPECIAL PARA A FOLHA
Cinco de junho, 14h30, 41C,
sem vento. Após quatro horas e
meia de espera e um pedaço de
melancia, fui autorizado a entrar
na base militar perto de Fallujah.
Éramos eu e um fotógrafo croata de outra agência dividindo uma
das casas com mais marines. Dois
sobressaíam. Um fuzileiro médico, que se alimentava só com produtos para aumentar a massa
muscular e tomava várias cápsulas, dividia o quarto comigo. Veterano de batalhas, não hesitou
em dizer: "Querem lutar com a
gente? Vamos matar todos".
Ele era cristão. Quando eu o deixava usar a internet em meu computador (uma lata de atum por 15
minutos), ele copiava trechos da
Bíblia para enviar à mulher. Ele
dizia que queria sair do Iraque
porque sentia muita falta dela.
"Ela é uma mulher maravilhosa.
Olha, Maurício, ela me enviou um
perfume. Você quer ver?" Ele
abriu a mochila e sacou uma calcinha vermelha.
Outro fuzileiro, um sargento de
nível médio e franco-atirador,
perguntou-me se eu tinha fotos
de iraquianos mortos, enquanto
fazia exercícios em uma barra colocada na porta do quarto.
Respondi que não tinha quase
nada, somente de palestinos do
conflito do qual eu acabara de
chegar, na faixa de Gaza. "Palestinos não me interessam. Eu quero
iraquianos", disse ele, sereno.
Mais tarde, outro atirador, fã do
Sepultura, começou a mostrar as
fotos dos iraquianos que havia
matado. Além de dois vídeos de
reféns decapitados, ele tinha três
vídeos de mortes e batalhas.
Um dos registros era dele em
ação. Em pouco menos de dois
minutos, cinco disparos. Cinco
iraquianos a menos. Perguntei:
eram civis ou da insurgência? Ele
disse que eram inimigos. "Ontem
matei 30 com 34 tiros. É meu trabalho." Pergunto: você já matou
civis? "Não, só mato quem estiver
armado para tentar nos matar.
Mas sempre acaba sobrando para
um ou outro. Eu não faço perguntas, somente cumpro ordens."
Eu estava com fome e a última
pergunta, para não perder o almoço, foi: o que seria mais difícil,
Iraque ou Coréia do Norte? "Aqui
é muito pior, morrem muito mais
marines, soldados e jornalistas
como você."
(ML)
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