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DESGASTE
Picuinhas tomam conta do processo que deveria fortalecer o partido para a disputa presidencial
Unidade democrata está na estaca zero
ADAM NAGOURNEY
DO "NEW YORK TIMES"
Quando os dirigentes do Partido Democrata montaram o calendário de primárias para 2004,
eles produziram uma rápida sequência de consultas que em
teoria permitiria a breve obtenção de um candidato presidencial, capaz de escapar ao desgaste das prolongadas disputas que
aleijaram tantos outros candidatos ao longo da história.
Mas a menos de três semanas
da primeira votação no processo
de indicação, a 19 de janeiro, já
se pode dizer que o partido atingiu seu objetivo somente pela
metade. É possível que os democratas escolham com rapidez
um candidato, seus dirigentes
afirmam. Mas será alguém que
deverá ainda enfrentar disputas
internas e que terá dificuldades
para unificar um partido que está hoje bastante dividido.
Num exemplo de consequências não previstas, um processo
destinado a gerar unidade, um
candidato forte e uma plataforma arrebatadora para enfrentar
o presidente Bush até agora produziu uma campanha que democratas descrevem como espantosamente desagradável e
marcada por picuinhas.
Campanha de ataques
Por mais que campanhas sejam marcadas pela grosseria, isso raramente acontece nos momentos iniciais. E isso jamais
ocorreu no "caucus" (votação
direta em reunião partidária) de
Iowa, um Estado onde, segundo
os democratas, os eleitores punem ou costumavam punir os
candidatos que só criticam.
Howard Dean, que lidera as
pesquisas em Iowa e New
Hampshire, solicitou que o presidente do Partido Democrata
interviesse contra os ataques dirigidos a ele, porque isso poderia
apenas servir de munição para a
Casa Branca, caso ele se torne o
candidato à sucessão de Bush.
O pedido despertou reações
irônicas de alguns de seus concorrentes, entre eles o sarcástico
senador Joseph Lieberman, para
quem Dean seria derretido pelos
ataques da Casa Branca.
Ao mesmo tempo, naquilo
que os democratas descrevem
como uma questão preocupante, nenhum dos candidatos conseguiu até agora, nesse ambiente
político áspero, identificar-se
com o tipo de tema eleitoral arrebatador ou grande proposta
que foram centrais para as campanhas presidenciais vitoriosas
dos últimos 20 anos -embora
Dean tenha crescido graças a sua
posição antiguerra.
Bill Clinton decolou quando,
em 1992, levantou a bandeira de
"oportunidade e responsabilidade", com a promessa de assistência médica para todos, enquanto George W. Bush ganhou
pontos no "conservadorismo
compadecido" que incluía tópicos como a reforma escolar.
"O desagradável desta campanha está na dificuldade de passar
um recado que agrade a muitos", disse Bob Kerrey, ex-senador de Nebraska e que também
disputou a indicação democrata
em 1992.
Essa avaliação chega depois de
um longo ano de briguinhas
preliminares. Agora a batalha
entre nove candidatos atinge um
momento crítico, com o começo
de um novo ano e com a sequência rápida de disputas que os democratas afirmam serem capazes de produzir um candidato
do partido até meados de março.
Por muitos dos critérios,
Dean, que há um ano era zombado por seus concorrentes como alguém que lançou o próprio nome apenas por vaidade,
atinge um momento de mais alta visibilidade como o principal
concorrente do páreo. Ele tem
uma vantagem significativa sobre seus adversários nas pesquisas de New Hampshire, que faz
sua primária uma semana depois do "caucus" de Iowa.
Caso Dean seja bem sucedido
em Iowa e em New Hampshire,
será difícil contê-lo. Dito isso,
Dean, ao tornar-se foco de intensos escrutínios, fez uma série
de declarações que reforçaram
as preocupações de muitos democratas quanto às suas capacidades de enfrentar Bush -incluindo uma sugestão rapidamente descartada de que iria
evitar dar qualquer julgamento
sobre a punição merecida por
Osama bin Laden até o pronunciamento da Justiça (um dia depois disse que o líder da Al Qaeda merecia a pena de morte).
Em Iowa e New Hampshire, os
democratas Dick Gephardt e
John Kerry esperam que as dúvidas quanto à força de Dean
diante de Bush os beneficiem, ao
intranquilizar os democratas
que declararam ter como prioridade máxima evitar a reeleição
do presidente.
Ainda que Dean saia fortalecido dos dois Estados, três outros
democratas parecem ter potencial para crescer à medida que as
primárias se deslocam para o Sul
dos Estados Unidos: o general
reformado Wesley Clark, Lieberman e o senador John Edwards, da Carolina do Norte.
Terry McAuliffe, presidente
dos democratas, descartou as
preocupações quanto ao tom da
campanha. Em entrevista, fez a
previsão de que o partido se uniria em redor do vencedor e que o
candidato terminaria abastecido
com o conjunto de idéias grandiosas necessárias para enfrentar
Bush.
"Ouçam, nos unificaremos",
ele disse. "Todos os candidatos
se unirão. A rejeição profunda a
George W. Bush vai juntar todos
eles."
A seu ver o nome que unificará
o partido será escolhido em no
máximo três meses.
Muitos democratas, no entanto, acreditam que a existência de
tantos candidatos de um lado dificulta a escolha, e de outro abre
cicatrizes que tornam problemática a futura unidade do partido.
"Dean continua essencialmente a fazer uma campanha com
base em ataques, e os demais, exceto Edwards, estão seguindo o
seu exemplo", disse Bruce Reed,
presidente do Conselho de Liderança Democrata.
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