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São Paulo, domingo, 04 de maio de 2003

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DIPLOMACIA

Prisões minam estratégia de ajudar oposição anti-Fidel, mas exilados se dividem sobre qual deve ser a resposta americana

Repressão cubana embaralha ação dos EUA

ROBERTO DIAS
DE NOVA YORK

A ofensiva do regime cubano contra seus dissidentes caminha rapidamente para se tornar um problema para a Casa Branca.
Segundo analistas, a situação para o governo de George W. Bush ficou mais confusa após Fidel Castro ter ordenado, no mês passado, o maior ataque em décadas contra seus opositores.
As ações do regime cubano incluíram a execução de três acusados de sequestrar uma lancha para fugir da ilha e a prisão de 75 dissidentes, que foram julgados e condenados a penas de até 28 anos. Fidel diz que precisou combater uma tentativa dos EUA de derrubá-lo. Na semana passada, acusou a CIA de tentar matá-lo.
"É um retrocesso incrível, diminui o esforço dentro dos EUA no sentido de acabar com as sanções e coloca os EUA numa situação muito difícil", diz Brian Alexander, que sabe bem do que fala: até o mês passado, era diretor-executivo da Cuba Policy Foundation, entidade de lobby no Congresso contra o embargo americano a Cuba vigente há 40 anos. Toda a diretoria da entidade renunciou em protesto contra Fidel.
Alexander funcionava como braço operacional de uma corrente que defendia a ampliação dos laços com a ilha. A tese é a seguinte: a queda do regime cubano deve ser feita de forma moderada, com aumento do fluxo de dinheiro para a ilha (como ocorre nas remessas dos exilados, que já chegam a US$ 1 bilhão) e livre trânsito de americanos (com os populares vôos charters saídos dos EUA).
Para esse grupo, os dissidentes dentro da ilha são um núcleo a ser alimentado pelos EUA. Isso era feito por Washington, que enviou representantes para encontrar pessoas que agora foram presas. "É uma estratégia muito importante do Departamento de Estado", disse Walter Mead, do Council on Foreign Relations.
O problema dos EUA é justamente o que fazer agora com o núcleo dissidente interno, já que boa parte está na prisão. É nesse espaço que pode florescer a linha-dura dentro dos EUA, historicamente defendida pelos cubanos exilados na Flórida, de não confiar em rebeldes internos.
A equação não é tão simples, porém, por causa da mudança de opinião entre os exilados, para a qual chama a atenção Susan Purcell, vice-presidente da Americas Society. "Uma maioria significativa agora quer se engajar com os cubanos na ilha. Não há opções para fazer algo diferente", diz.
O caminho para a Casa Branca fica ainda mais escorregadio por causa de um evento marcado para o ano que vem para o qual, a história recente mostra, a Flórida é vital: a eleição presidencial.
"Cuba é um assunto de política externa de baixa prioridade, mas é um tema de alta prioridade na política doméstica", diz William Rogers, secretário-assistente de Estado dos EUA no governo Jimmy Carter (1977-1981). "Temos visto como a Flórida tem sido importante para as votações e como as visões sobre Cuba influenciam isso", afirma ele.
Além disso, a Casa Branca ainda tem de decidir como encaixar na crise cubana ao menos duas importantes políticas suas.
A primeira é a nova doutrina de segurança nacional, que pode se confrontar com uma estratégia já usada por Fidel: provocar a emigração em massa de cubanos, pelo mar, até a Flórida. "Ele gostaria de fazer isso de novo, livrar-se dos dissidentes", diz Brian Latell, diretor do Centro para Estudos Estratégicos Internacionais. Só que, afirma Purcell, tal opção acabou. "Os EUA podem alegar ameaça à segurança nacional. Ele não sabe se os EUA iriam agir ou não", diz.
Outro problema reside no distanciamento de Washington em relação à América Latina, o que dificulta o apoio na política para Cuba. Em votação recente sobre direitos humanos na ONU, os principais países da região ficaram contra a opinião dos EUA.
Sem apoio diplomático, com os exilados divididos e uma eleição pela frente, pouco haveria a fazer além de coisas singelas, como fortalecer a propaganda na ilha, simbolizada pela Radio Marti.
Se Bush tiver uma carta na manga, poderá mostrá-la no próximo dia 20, quando a independência cubana é comemorada -nos dois últimos anos, ele usou a data para falar sobre o regime.


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