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Morte de ilegais bate recorde em fronteira dos EUA
TIMOTHY EGAN
DO "NEW YORK TIMES",
EM COVERED WELLS, ARIZONA
No gargalo do contrabando humano que acontece aqui no deserto de Sonora, imigrantes ilegais
vêm morrendo em número recorde quando tentam cruzar do México para os EUA, depois da proposta do governo Bush para anistiar imigrantes ilegais que é vista
por muitos como um ímã.
"A temporada da morte", definição de Robert Bonner, comissário da Patrulha de Fronteira americana, para os meses quentes do
ano, mal começou, e 61 pessoas já
morreram na região fronteiriça
do Arizona de 1º de outubro para
cá, segundo o Ministério do Interior mexicano -três vezes o total
do ano anterior.
A Patrulha de Fronteira, que só
computa os cadáveres que localiza, diz que o número de mortos é
de 43, mais do que em qualquer
outro ano no mesmo período.
Leon Stroud, da patrulha, diz ter
visto 34 corpos no ano passado.
No jargão da Patrulha de Fronteira, um carro abandonado e um
migrante morto são a mesma coisa -um "10-7"-, mas Stroud
diz que não consegue se acostumar com as mortes.
"A coisa mais difícil foi me sentar com um menino de 15 anos ao
lado do corpo do pai dele", diz
Stroud, texano fluente em espanhol. "O pai dele era cozinheiro.
Era gordo demais para tentar cruzar a fronteira. Fizemos uma fogueira e tentamos consolar o garoto. Foi difícil".
Se o ritmo atual se mantiver, este terá sido o mais mortífero ano
no mais movimentado corredor
de contrabando humano dos
EUA. "A situação não tem precedentes", disse o reverendo John
Fife, presbiteriano de Tucson que
participa ativamente dos esforços
humanitários na fronteira. "Há
dez anos quase não havia mortes
na fronteira sudoeste do Arizona.
O que eles fizeram foi criar esse
corredor da morte. É darwinista
-só os mais fortes sobrevivem".
Por anos, a morte dos que tentavam cruzar a fronteira acontecia
em geral à noite, por atropelamento, em rodovias perto de
áreas urbanas. Mas agora, com
mais recursos técnicos e mais policiamento, os imigrantes ilegais
se vêem forçados a tentar a travessia no sul do Arizona, um dos lugares mais inóspitos do planeta.
Eles morrem por causa do sol,
calcinados no chão áspero do deserto de Sonora, onde a temperatura do solo chega a 55C antes
ainda de começar o verão. Morrem congelados, nas alturas das
pedras frias das montanhas Baboviquari, em noites sem lua. Morrem vítimas dos bandidos que os
atacam, morrem devido a defeitos
em seus carros, e morrem por
problemas cardíacos.
O montanhoso deserto de Sonora, entre Yuma, no oeste, e Nogales, no leste, é o principal ponto
de entrada ilegal ao longo dos
3.120 km de fronteira com o México, diz a Patrulha de Fronteira.
Até o final de abril, as detenções
de pessoas tentando cruzar a
fronteira pelo deserto ao sul de
Tucson aumentaram em 60% em
relação ao ano anterior. Quase
300 mil pessoas foram apanhadas
tentando entrar nos EUA pelo deserto desde 1º de outubro.
Depois de quatro anos de queda, as detenções -usadas pela
Patrulha de Fronteira como referência para determinar o volume
de contrabando humano- aumentaram em 30% ao longo do
ano passado em toda a fronteira
sul, com 825.305 presos entre 1º
de outubro e o final de junho.
A travessia aqui, que envolve
superar apenas uma cerca simples de arame farpado, é seguida
por uma caminhada de dois ou
três dias por 80 km de antigas trilhas em meio ao deserto, até a estrada mais próxima, que fica na
reserva indígena da nação Tohono O'odham. A maior parte das
pessoas viaja com menos de sete
litros de água, em jarras plásticas.
O deserto fica recoberto de lixo
garrafas plásticas vazias, roupas
abandonadas, papel higiênico.
"Meus pés doem, tenho sede,
mas vou tentar de novo, assim
que descansar", disse Edmundo
Saenz Garcia, 28, detido na reserva certa manhã, já perto do final
de sua jornada. Os dedos de seus
pés estavam inchados como salsichas e recobertos de bolhas. Ele
usava botas de caubói.
Garcia disse ter ouvido sobre o
novo plano de imigração de Bush,
que concederia vistos de trabalho
a milhões de imigrantes ilegais e a
pessoas que provem ter emprego
nos EUA, e não entendia por que
tinha sido detido.
Os grupos que se opõem às
fronteiras abertas dizem que o aumento no número de travessias e
mortes foi causado pela proposta
de Bush, bloqueada no Congresso
e de aprovação improvável neste
ano. Mas o plano criou interesse
no México, afirmam.
A fronteira sul agora está mais
vulnerável do que em qualquer
período histórico recente. "Criamos um incentivo para que as
pessoas assumam riscos insensatos", disse Mark Krikorian, diretor do Centro de Estudos da Imigração, grupo de pesquisa que se
opõe ao aumento da imigração.
"Na prática, estamos dizendo
que, se elas superarem aqueles
obstáculos, poderão ficar aqui."
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