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AMÉRICA LATINA
Presidente eleito toma posse nesta quarta-feira; promessa de "mão firme" deve intensificar o conflito
Colômbia espera por Uribe e mais guerra
ROGERIO WASSERMANN
DA REDAÇÃO
Há quatro anos, os colombianos
aguardavam com esperança a
posse do presidente Andrés Pastrana, eleito com uma promessa
de alcançar a paz por meio do diálogo e terminar com uma guerra
civil que já durava três décadas e
meia. Pastrana fracassou, e a intensidade da guerra só fez aumentar nesses quatro anos. Agora, os
colombianos esperam novamente a posse, na quarta-feira, de um
novo presidente que promete
acabar com a guerra.
Ao contrário de Pastrana, porém, Álvaro Uribe, 50, quer terminar com a guerra com mais guerra. Com o lema "mão firme, coração grande", Uribe foi eleito já no
primeiro turno, em maio, prometendo "autoridade" para combater os grupos rebeldes.
"O panorama para a Colômbia
é muito complicado para os próximos meses, porque o nível de
violência deve aumentar muito",
avalia o analista Adam Isacson,
coordenador do Projeto Colômbia do Centro de Política Internacional, de Washington.
As perspectivas para o país são
ainda mais sombrias quando se
toma como base a atual situação.
Cerca de 40 mil colombianos
morreram somente nos últimos
dez anos por conta do conflito. A
Colômbia é o país campeão mundial de sequestros -em 2001 foram 3.041, mais de 8 por dia.
O narcotráfico, outro problema
que aflige o país desde a década de
80, incorpora-se cada vez mais à
guerra, utilizado pelos grupos ilegais como fonte de financiamento. Nem mesmo a ajuda americana de US$ 1,3 bilhão conseguida
por Pastrana para combater o tráfico deu resultado -as plantações de coca continuam crescendo, e a oferta da droga aos mercados consumidores é estável.
Na semana passada, o Congresso americano autorizou o uso
dessa ajuda para o combate à
guerrilha e aos grupos paramilitares de direita, antevendo a intensificação do confronto.
Desde fevereiro, quando o processo de paz iniciado por Pastrana
no final de 1998 foi rompido, as
Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), principal
guerrilha do país, intensificaram
suas ações, com ataques à infra-estrutura, atentados à bomba e
ameaças a autoridades. Os analistas vêem essa ofensiva como uma
tentativa de se fortalecer diante da
perspectiva de um embate mais
violento no futuro governo Uribe.
Tanto o futuro presidente como
a guerrilha dizem estar abertos ao
diálogo, mas as condições que impõem são consideradas inviáveis.
"Não vai haver negociação nem
no curto prazo nem no médio
prazo, porque, apesar de ambos
se dizerem dispostos a negociar,
as condições que impõem são difíceis de aceitar", afirma o senador Antonio Navarro Wolff, eleito
com a segunda maior votação na
eleição parlamentar de março.
Navarro tem experiência no assunto. Ex-dirigente do grupo
guerrilheiro M-19, ele participou
das negociações de paz com o
presidente César Gavíria, em
1990, que transformaram o grupo
em partido político.
Zona desmilitarizada
Em um comunicado divulgado
em sua página na internet, poucos
dias antes da eleição presidencial,
as Farc admitiam a possibilidade
de voltar à mesa de negociações
com o próximo presidente, mas
exigiam para isso que o governo
deixasse de chamá-las de "terroristas" ou "narcoterroristas", que
promovesse um combate aos paramilitares de direita e que desmilitarizasse dois Departamentos
(Estados) ao sul do país.
A concessão de uma zona desmilitarizada foi justamente uma
das maiores críticas ao processo
de paz formulado por Pastrana.
Segundo os críticos, a área de 42
mil km2 (equivalente ao território
da Suíça) concedida por Pastrana
às Farc no sul do país era utilizada
pelos guerrilheiros como campo
de treinamento, esconderijo de
reféns e área de cultivo e processamento de drogas. A área acabou
sendo retomada pelo Exército em
fevereiro, quando o sequestro de
um senador pela guerrilha precipitou o fim do processo.
O próprio Uribe também já admitiu negociar com os rebeldes,
mas impõe condições igualmente
duras, como um cessar-fogo prévio e o fim do envolvimento da
guerrilha com sequestros e narcotráfico, o que deixaria o grupo
sem fontes de financiamento.
No primeiro discurso como
presidente eleito, na noite do pleito, Uribe sugeriu uma negociação
com a mediação da ONU (Organização das Nações Unidas).
Apesar da resposta positiva das
Nações Unidas, mesmo aliados de
Uribe se dizem pessimistas quanto à possibilidade de um diálogo.
"Parece muito difícil que no
prazo de alguns anos Uribe chegue a uma negociação como a que
chegou Pastrana, porque a situação agora é de intensificação do
conflito", diz o senador Rafael
Pardo, ex-ministro da Defesa.
Navarro e Pardo discordam
frontalmente sobre as perspectivas da Colômbia com a "mão firme" prometida por Uribe. "A
mão dura não vai dar resultado. O
que veremos é as Farc adotando
cada vez mais a pura tática guerrilheira, numa guerra desigual que
não se vence militarmente", diz
Navarro. "Creio que assim nos
aprofundaremos cada vez mais
no pântano no qual já estamos
metidos", afirma.
Para Pardo, a opção de Uribe
não é "utilizar a força ou não utilizar a força". "Não há alternativas.
O que a Colômbia precisa agora é
de autoridade, pré-requisito para
qualquer negociação futura", diz.
Segundo ele, o que os colombianos podem esperar dessa política
é "uma presença maior da força
pública, de maneira contínua e
permanente, em todo o território
nacional, para reocupar os espaços que foram tomados pelos grupos armados ilegais".
Aumento do efetivo
A futura ministra da Defesa,
Marta Lucía Ramírez, adiantou
na última semana algumas das
propostas que pretende seguir para aumentar o poderio militar no
combate aos grupos armados ilegais: aumento nos gastos na área,
financiado pela criação de um novo imposto, e o aumento no efetivo das Forças Armadas, seguindo
a sugestão do governo dos EUA
de incorporar reservistas.
Para o general da reserva Álvaro
Valencia Tovar, ex-comandante-geral das Forças Armadas, um aumento no efetivo não basta. "Aumenta-se a mobilidade, pode-se
ocupar regiões abandonadas, mas
nunca será o bastante para derrotar a guerrilha, porque o território
nacional é muito extenso. Além
disso, a guerrilha se esconde nas
montanhas, região que domina e
onde a luta é mais difícil", diz.
Em sua avaliação, o aumento
dos gastos deve ser financiado por
ajuda externa, para não correr o
risco de quebrar o caixa do governo e piorar ainda mais a situação
de pobreza e desigualdade que
serviu de caldo de cultura para o
avanço da guerrilha.
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