São Paulo, domingo, 05 de setembro de 2004

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Ao menos 156 crianças morreram; Putin diz que país demonstrou fraqueza e promete medidas mais duras contra o terrorismo

Número de mortos em Beslan chega a 366

DA REDAÇÃO

Pelo menos 156 crianças morreram entre as vítimas do banho de sangue que pôs fim ao seqüestro na escola de Beslan (Ossétia do Norte) por terroristas que exigiam a saída das forças russas da Tchetchênia, república de maioria muçulmana. O número de mortos subiu de mais de 200 para 366 e há mais de 500 feridos, segundo os últimos dados divulgados pelo governo russo. De acordo com Sergei Fridinsky, procurador apontado para acompanhar o caso, "o total de mortos deve subir, mas não muito mais".
Em discurso em Moscou, o presidente russo, Vladimir Putin, admitiu falhas no governo, pediu uma mobilização nacional para enfrentar o terrorismo e disse que várias medidas serão tomadas para manter a integridade das fronteiras do país, incluindo a criação de um sistema mais eficiente de gerência de crises e o reforço geral dos órgãos ligados à manutenção da lei. Ele não citou os separatistas tchetchenos diretamente.
Putin pediu que o Parlamento russo altere a Constituição e endureça a legislação antiterror. Afirmou ainda que o terrorismo internacional lançou uma "uma guerra em grande escala" contra a Rússia. Anteontem, funcionários do governo russo sugeriram participação financeira da Al Qaeda na ação em Beslan.
Segundo Putin, devido ao colapso da ex-União Soviética, o país estava enfraquecido e sem condições de responder à altura. "Não mostramos uma compreensão da complexidade e perigos dos processos em curso no nosso país e no mundo", disse. "Não soubemos reagir adequadamente. Mostramos fraqueza, e povos fracos são derrotados", declarou, ao avaliar que as fronteiras russas estão "desprotegidas de leste a oeste" e que há corrupção nas agências de segurança.
O presidente russo viajou para Beslan na madrugada de ontem, onde visitou feridos no massacre, ordenou o fechamento das fronteiras da Ossétia do Norte e decretou luto de dois dias no país.
O chefe da FSB (ex-KGB, a polícia secreta soviética) na Ossétia do Norte, Valery Andreyev, afirmou que 36 terroristas, incluindo os líderes, foram mortos na batalha pela retomada do ginásio de Beslan -dez seriam árabes. Logo após a ação, um porta-voz do governo ossétio disse que três terroristas haviam sido capturados e que quatro haviam escapado.
Em Beslan, enquanto centenas de feridos por queimaduras e tiros lotavam o hospital da cidade, parentes se aglomeravam no cinema local, transformado em centro de informações. "Estou procurando minha mulher o dia inteiro e não consigo achá-la. Ninguém diz nada", contou o jovem Ruslan. Dezenas de pessoas tentavam encontrar parentes entre as listas de sobreviventes no hospital.
Equipes de socorro recolheram 235 corpos na escola ontem, 143 de crianças, segundo o Ministério da Saúde ossétio. Em meio à dor, homens prometiam vingança: "Os pais vão enterrar seus filhos e, após 40 dias [o luto dos cristãos ortodoxos, maioria na Ossétia], irão pegar em armas atrás de vingança", disse Alan Kargiyev, 20.
Moradores reunidos no centro de informação culpavam as autoridades locais pelo desastre na ação de socorro, mas vários preservavam Putin. "São os militares, a polícia, as forças especiais, estes corruptos, incapazes de lutar e reagir, que mataram nossas crianças", disse Timur, 30.
Uma mulher chorando perguntava para um funcionário ossétio: "Onde estavam as ambulâncias que vocês prometeram?". Outra perguntou se os operários inguches que reformaram a escola nas férias não poderiam ter posto explosivos no local. Há um disseminado preconceito contra esta etnia entre os ossétios.
O discurso de Putin, entretanto, deixou muitos moradores indiferentes. "Putin não manda nada aqui. O que querem que ele faça? É um problema dos caucasianos", afirmou Artium, um dos homens que acompanhavam a cena.
Segundo autoridades russas, a maioria dos reféns morreu no ginásio com a queda do teto, no qual os seqüestradores puseram cargas explosivas, e no fogo cruzado entre os terroristas e forças de segurança. Segundo o chefe da FSB, os seqüestradores em Beslan tinham armas e explosivos escondidos no prédio da escola. "Isso pode significar que eles já estavam preparados de antemão."
O governo russo tratou como "blasfêmia" o pedido da União Européia de "explicação" sobre a ação das tropas russas em Beslan. O pedido, feito anteontem pelo presidente de turno do organismo, o holandês Bernard Bot, foi considerado ultrajante pela Chancelaria de Moscou.


Com agências internacionais


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