São Paulo, quarta-feira, 05 de outubro de 2011

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ROBERTO ABDENUR

Norte vira sul, sul vira norte


A ideia de que um norte ditaria os rumos do comércio e das finanças outrora se impunha


Atrás da escrivaninha do ministro de Estado, no Itamaraty, há réplica, em tapeçaria, de um dos primeiros mapas a delinear o litoral das Américas. Sua peculiaridade: mostra o sul do planeta em cima, o norte embaixo.
Essa inversão cartográfica de 500 anos atrás agora se reproduz na reconfiguração do mapa da economia internacional em curso. A ideia de que um norte -EUA, Europa, Japão- ditaria os rumos do comércio e das finanças outrora se impunha.
Não só aquele norte se julgaria destinado ao predomínio. Também entre os que se sentiam sul -ou Terceiro Mundo- ideologias fatalistas sustentavam o caráter inelutável de sua dependência, de sua marginalidade na ordem internacional.
Supunha-se irreversível a tendência à desvalorização das commodities, à insuficiência de capital e ao deficit nas contas externas. Embora defendendo a tese de uma Nova Ordem Econômica Internacional, em que tivessem mais influência sobre os organismo e normas internacionais de comércio e finanças, tornando-as mais justas e equânimes, os países do Terceiro Mundo ainda estavam -e se sentiam- amplamente distantes dos padrões de vida dos então países industrializados.
Era pequena sua participação nas trocas internacionais e mesmo como destino de investimentos diretos e aplicações em Bolsas. Países como China, Brasil e Índia se debatiam com altos níveis de instabilidade e vulnerabilidade externa. Agora, sobretudo desde a crise de 2008, evidencia-se inversão da situação.
Enquanto nos EUA grave impasse político arrisca precipitar ainda mais forte retração, na Europa emerge a crise da dívida soberana, à melhor maneira do que com frequência ocorria com os hoje emergentes: entre os quais os Brics (Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul), tornados de repente decisivos atores nas finanças, no comércio e nas organizações e grupos multilaterais.
Essa mudança na relação de forças, embora ainda vá tardar um pouco até permitir aos Brics papel decisivo em organizações já estabelecidas, como o FMI (Fundo Monetário Internacional), o Banco Mundial e a Organização Mundial do Comércio, já teve início. Fato extremamente relevante foi a institucionalização do G20 em substituição ao G8 como o principal foro não só para enfrentar a crise desatada em 2008, mas também para proceder aos poucos a uma abrangente reconfiguração do sistema econômico internacional, de modo a nele abrigar, com o peso que lhes corresponde, os Brics e outros países emergentes.
A globalização pôs fim ao confronto norte-sul, que, embora preconizasse uma melhor ordem econômica internacional, pressupunha a continuação do predomínio daquele norte.
E, de repente, vêm à tona os erros e mesmo irresponsabilidades das antes supostamente virtuosas nações do norte. São os Brics que se aprestam a socorrer a sofrida União Europeia (e, entre eles, a China dá "bronca" nos EUA pela má gestão de sua economia). Parodiando Glauber Rocha com seu "o sertão vai virar mar, o mar vai virar sertão"; agora o norte vira sul, o sul vira norte... O mapa, afinal, estava correto.

AMANHÃ EM MUNDO
Clóvis Rossi



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