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Poder de compra
não eleva nível de
satisfação, diz autor
DE NOVA YORK
Dinheiro realmente não traz felicidade -essa é a tese que norteia a discussão do novo livro de
Gregg Easterbrook, "Progress Paradox" (paradoxo do progresso).
O autor -premiado jornalista,
colaborador do "New York Times" e do "Washington Post",
entre outras publicações- diz
que um padrão de vida mais elevado, maior nível de renda dos
países ricos e mesmo o triunfo de
instituições democráticas não se
traduzem numa escalada do grau
de felicidade nos países ricos.
"De um modo objetivo, podemos dizer que, hoje, todas as pessoas vivem melhor que na geração anterior", disse ele, em entrevista à Folha. Mas Easterbrook,
50, culpa a mídia pelo mal-estar
atual. Para ele, há um "culto à insatisfação". "Boas notícias não
vendem jornal. A sociedade ocidental vive hoje numa cultura que
enfatiza as reclamações."
Folha - No seu livro, o sr. avalia
que os progressos materiais alcançados pelos países ocidentais não
têm sido acompanhados pelo crescimento do nível de contentamento individual das pessoas. Por quê?
Gregg Easterbrook - A sociedade
ocidental vive hoje numa cultura
que enfatiza as reclamações. A
mídia dá demasiada importância
a fatos que alimentam a raiva das
pessoas. Apesar de a vida hoje ser
melhor do que no passado, as pessoas estão tão focadas nos problemas que não conseguem ver isso.
Folha - O sr. poderia detalhar como a mídia exerce um impacto tão
negativo no grau de felicidade?
Easterbrook - A mídia constantemente só reporta as notícias
ruins, o que é compreensível porque essas são as notícias que a sociedade tem mais urgência em
ouvir. Boas notícias não vendem
jornal. Como a mídia ficou muito
mais eficiente em reportar notícias ruins em todo o mundo, as
pessoas assistem a uma constante
veiculação de desastres. Num
mundo com 6 bilhões de habitantes, sempre alguma coisa errada
vai acontecer. Esse tipo de divulgação provoca a sensação de que
tudo está errado no mundo. Mesmo nos países em desenvolvimento, as coisas têm melhorado
para a maioria das pessoas.
Folha - Mas a mídia não tem a
obrigação de informar sobre os fatos ruins?
Easterbrook - Claro que não podemos esperar só notícias agradáveis. Não queremos apenas jornalistas sorridentes dizendo que tudo vai bem. O mundo está cheio
de injustiças e problemas. A questão é que, como a mídia tem mostrado, parece que não há nada de
positivo em andamento.
Folha - Esse mal-estar é um "privilégio" das sociedades dos países
desenvolvidos?
Easterbrook - Eu acredito que,
quanto mais as economias dos
países em desenvolvimento prosperarem, mais veremos esse tipo
de fenômeno ocorrer. As pessoas
também acabarão por ficar mais
concentradas nas reclamações.
Primeiro, há um estágio no qual
as energias estão concentradas no
sucesso material e na sobrevivência: comer, vestir etc. Uma vez
atingidos esses objetivos, há mais
tempo para ficar aborrecido e insatisfeito, e aí entra a mídia.
Claro que não ter acesso à saúde
ou à alimentação é terrível. No entanto as pessoas cometem um erro ao acreditar que bens materiais
trazem felicidade. Estudos nos
EUA mostram que, entre pessoas
que têm uma rendimento anual
de US$ 10 mil, o incremento da
renda aumenta o grau de felicidade na mesma medida. Acima disso, o aumento da aquisição de
bens materiais não é proporcional
à evolução do grau de satisfação.
Folha - Quando a satisfação pessoal e a melhoria do padrão de vida
tomaram trajetórias diferentes?
Easterbrook - Os estudos psicológicos sobre o tema começaram
nos anos 50. Desde então, vemos
que não há um declínio no grau
de satisfação das pessoas, mas o
aumento dos padrões de vida não
é acompanhado por um aumento
da felicidade. Os sinais são claros.
Em todos os países desenvolvidos, a depressão toma uma dimensão de epidemia.
Folha - O que a mídia poderia fazer para atenuar esse grau de insatisfação?
Easterbrook - A mídia tem de
achar um meio de informar as
boas notícias sem parecer uma
Poliana. Tem de equilibrar a carga
de notícias ruins com o que há de
positivo. Quando vemos um país
como o Brasil, é importante que
os jornalistas se questionem: "Esses problemas são grandes em
comparação com quais países?".
Convém lembrar as previsões de
explosão demográfica e catástrofes ambientais feitas para o país. O
quadro hoje no Brasil é outro.
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