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JAPÃO
Premiê espera sair das urnas, hoje, com força suficiente para levar adiante projetos que desagradam à sua própria base
Koizumi usa eleição para fazer reformas
MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO
O premiê Junichiro Koizumi
busca, nas eleições legislativas de
hoje, consolidar seu controle sobre a cena política do Japão por
meio de uma clara vitória de seu
Partido Liberal-Democrático, o
que lhe daria um forte mandato
popular -que considera necessário para aprovar suas tão decantadas (e controversas) reformas.
Pesquisa publicada no diário
"Asahi Shimbun", na última terça-feira, mostrou que o PLD deverá manter sua maioria na Câmara Baixa da Dieta (Parlamento), podendo obter até 270 das 480
cadeiras. Atualmente, o partido
tem 247 assentos. Mas, diz a mesma pesquisa, a legenda também
poderá perder vagas se o comparecimento às urnas for elevado.
Mesmo assim, ao lado do Partido Novo Komeito e do Partido
Novo Conservador, que integram
o governo, o PLD deverá obter ao
menos as 252 cadeiras necessárias
para controlar as comissões parlamentares importantes, segundo
especialistas ouvidos pela Folha.
Koizumi aposta tudo em seu
projeto de reformas, que, aliás, já
era sua bandeira de campanha em
2001, quando conquistou a presidência do PLD e se tornou premiê. Contudo alguns analistas
põem em dúvida sua intenção de
introduzir as mudanças mais dolorosas, como a do sistema bancário e a dos fundos de pensão.
"Koizumi tem forte aprovação
popular desde 2001, mas tem
apoio frágil na Dieta, mesmo entre seus colegas do PLD. Estes
sempre tiraram vantagem do esquema de conchavos existente no
Japão há décadas. Uma vitória
clara de seu partido lhe dará força
para enfrentar a velha-guarda do
PLD, mas nada garante que ele venha a cumprir sua promessa de
realizar reformas dolorosas", analisou Jon Mills, do Centro Ásia da
Universidade Harvard (EUA).
O maior problema japonês é sua
cambaleante economia, que, há
mais de uma década, apresenta
uma grave morosidade. O quadro
agravou-se nos últimos anos, com
uma insistente deflação -que
não cede mesmo com taxa de juros de 0% ao ano. Os preços caíram 7,6% desde 1997, de acordo
com a revista "The Economist".
"A falta de liderança política
tem relação com o fracasso do Japão no que concerne a sair da estagnação econômica. E um ataque mais claro aos problemas do
sistema bancário teria sido benéfico", analisou Tadashi Anno, da
Universidade Sophia, de Tóquio.
Koizumi vem prometendo mudar a situação desde que assumiu,
mas ainda não pôde introduzir a
parte central das reformas -privatização das rodovias, corte de
gastos com obras, redução dos
subsídios agrícolas e liquidação
de créditos duvidosos dos bancos.
Ocorre que, para tanto, ele precisa do apoio de seus colegas parlamentares, sobretudo dos de seu
partido. "O PLD se eternizou no
poder porque mantém uma intrincada rede de distribuição de
benefícios a agricultores e a pequenos comerciantes das zonas
urbanas. No entanto, ao lado dos
problemas do sistema bancário,
esse esquema engessa a economia", avaliou Mills.
"Se realmente quiser alterar essa
situação, Koizumi terá de enfrentar os caciques do PLD, que bloqueiam suas reformas. Ele vem
buscando fazer isso, porém trata-se de algo muito complexo."
Perda de confiança
Ao lado da perda de confiança
dos investidores, que se traduz
em quedas na Bolsa de Tóquio, há
uma diminuição da confiança dos
cidadãos japoneses. Sem vislumbrar uma saída para a crise, eles
pouco consomem e preferem
poupar para um futuro incerto. A
taxa de poupança japonesa é uma
das mais elevadas do planeta.
A estagnação japonesa foi alvo
de vários estudos, mas isso não
trouxe nenhuma solução milagrosa. Como disse Robert Immerman, especialista em questões japonesas da Universidade Columbia (EUA), o país não soube fazer
a transição que resultou num
boom do setor de serviços em boa
parte dos países desenvolvidos.
O que eram seus principais
trunfos dos anos 60 até o final dos
80, fase em que a indústria japonesa chegou a ameaçar a hegemonia da americana, tornou-se um
ponto fraco. Estruturas de comando "pesadas" facilitam a concepção do planejamento estratégico de um enorme conglomerado (keiretsu), porém são ineficazes no mundo moderno da tecnologia da informação, que demanda agilidade e flexibilidade.
A máquina produtiva japonesa
continua a gerar riquezas -é a
segunda potência econômica do
mundo. Mas ela tem dificuldade
em reorientar-se para enfrentar a
competição internacional e exerce pouca influência positiva sobre
o cambaleante sistema financeiro.
Não se trata, portanto, do fim da
"potência nipônica", mas da morte de um sistema político-econômico: o modelo, que floresceu até
o início da década passada apesar
da corrupção e do paternalismo
partidário, perdeu o fôlego.
O Japão possui as forças necessárias para voltar a ter dinamismo
econômico no que se refere à educação de sua população, à tecnologia de ponta e à riqueza acumulada. Todavia essas forças são estranguladas por um sistema de
poder e de tomada de decisões incapaz de administrar a transição.
Koizumi, cuja principal vitória
até agora foi fazer com que os japoneses se interessassem pela política do país, promete atacar as
causas da crise. Mas precisará
conquistar apoio dentro de seu
próprio partido, o que não será fácil, visto o teor de suas reformas.
A oposição, por sua vez, luta para parecer diferente do establishment político. Ao menos no que
diz respeito a seu manifesto de
campanha -outra novidade no
Japão-, contudo, suas propostas
são bastante similares às de Koizumi. "A oposição precisa mostrar que tem um projeto e que não
quer apenas bloquear as iniciativas governamentais", disse Mills.
Mesmo assim, cansados da gerontocracia do PLD (apesar de
Koizumi ter "vendido" a idéia de
que o partido agora é "reformista"), os 40% ainda indecisos poderão dar um voto de confiança
ao Partido Democrático do Japão,
a maior formação oposicionista.
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