São Paulo, domingo, 11 de agosto de 2002

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A Argentina em busca de um candidato

Para analistas, os argentinos esperam que seu futuro presidente aumente os gastos do setor público para gerar empregos, isto é, querem ver mais Estado na economia

GUSTAVO CHACRA
DA REDAÇÃO

JOÃO SANDRINI
DE BUENOS AIRES

Os argentinos estão em busca de um candidato para presidente nas eleições de março de 2003, alguém que traga mudanças, com propostas totalmente diferentes dos governantes anteriores.
O futuro presidente, na avaliação de analistas políticos ouvidos pela Folha, deve estar mais preocupado em aumentar os gastos públicos, criar empregos e investir na indústria nacional. "Os argentinos querem o Estado mais presente na economia", afirma a analista Graciela Rommer, diretora do instituto de pesquisas Rommer & Associados.
Após seguidos ajustes econômicos e cortes nos gastos públicos - que, para os argentinos, apenas aumentaram a pobreza e o desemprego-, os eleitores "querem distância de candidatos que preguem políticas neoliberais", acrescenta Rommer.
Hoje, o índice de desemprego é de 21,4%. Mais da metade da população está abaixo da linha de pobreza. Uma desgraça para um país que nos anos 20 e 30 era um dos mais ricos do mundo.
Esses eleitores, no entanto, não levam em conta os riscos de retorno da hiperinflação que assolou o país no fim da década de 80 e início dos anos 90.
Os eleitores ainda não sabem se o governante ideal deve ser favorável ao Mercosul ou à Alca (Área de Livre Comércio das Américas). A maior parte dos candidatos é favorável a negociar a Alca em bloco, junto com o Brasil. A única exceção é o ex-presidente Carlos Menem, 72, claramente favorável a uma aproximação ainda maior com os EUA, se possível com dolarização da economia.
Entre os empresários argentinos, de acordo com pesquisa da Rommer & Associados, 75% apóiam a Alca. Mas 65% concordam com os candidatos e acham que ela deva ser negociada em bloco com o Brasil.

Peronista ou militar
Nesse perfil de candidato ideal dos argentinos se encaixam Elisa Carrió, 45, do ARI (Argentinos por uma República de Iguais), de centro-esquerda, e o trotskista Luis Zamora, 54, tido como um dos poucos políticos honestos do país. Se a eleição fosse hoje, Carrió derrotaria qualquer que fosse o adversário no segundo turno, em abril. Mas os analistas lembram que é preciso ver se, no momento das eleições, os peronistas estarão unidos, o que os fortaleceria.
Carrió e Zamora enfrentam ainda vários obstáculos para chegar à Presidência. O mais importante deles: não pertencem a nenhuma agremiação de expressão, de acordo com o analista político Ricardo Rouvier. Conforme reza um ditado argentino, "para ser presidente do país é necessário ser peronista ou militar".
Nas últimas décadas tem sido assim. Os únicos que vieram de fora, e ainda assim de um partido que era forte antes de cair na desgraça atual, foram Raúl Alfonsín (1983-89) e Fernando de la Rúa (1999-2001), ambos da União Cívica Radical (UCR). Os dois fracassaram e renunciaram.
De la Rúa pregava que a Argentina iria deixar os dez anos de menemismo e entrar em uma nova era. Mas o ex-presidente afundou carregando junto o mais célebre ministro do menemismo, Domingo Cavallo, que dirigiu a economia argentina nos últimos meses do governo De la Rúa.
Com a UCR fraca, os outros adversários sem uma estrutura partidária e os militares quietos em seus quartéis desde a aventura frustrada nas Malvinas em 1982, a importância da disputa interna do Partido Justicialista (PJ, peronista) aumenta ainda mais. O escolhido do partido deve se tornar um dos favoritos à vitória.
Na disputa estão o ex-presidente Carlos Menem (1989-99), o governador de San Luis, Adolfo Rodriguez Saá, 54 (que foi presidente por pouco mais de uma semana no ano passado), o governador de Santa Cruz, Néstor Kirchner, 51, e o governador de Córdoba, Juan Manuel de la Sota, 52.
Já desistiu o governador de Santa Fé e ex-piloto de Fórmula 1, Carlos Reutemann. Cada semana um dos candidatos é o favorito. Primeiro foi Reutemann, que, como disse a revista "Notícias", "se acovardou". Em seguida foi Menem. Mas as denúncias de corrupção abalam sua candidatura. Ele tem mais de 80% de rejeição entre os argentinos. Segue, porém, na terceira posição, com 11%. "Menem sofreu uma condenação moral", diz Oscar Raúl Cardozo, colunista do "Clarín".
Agora fala-se em Kirchner e De la Sota. Os dois contariam com o apoio do presidente Eduardo Duhalde, mas ainda não conseguiram conquistar a população. Por fora corre Rodriguez Saá, com um discurso populista.
O candidato das elites econômicas é o ex-ministro da Economia Ricardo López Murphy, 54, de centro-direita. Mas suas chances são quase nulas, dizem analistas.


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