São Paulo, quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Geórgia se prepara para enfrentar crise civil e humanitária

Para o International Crisis Group, Ossétia do Sul foi "dilacerada"; tensões étnicas na região inviabilizam imposição imediata da paz

Líderes usam termos como "limpeza étnica" para calçar suas ações; ONG documenta saques e violência por parte de milicianos pró-Rússia


Pavel Wolberg/Efe
Refugiados georgianos passam por tropas russas em Gori; medo da etnia alheia detonou êxodo

QUENTIN PEEL
DO "FINANCIAL TIMES"

A Rússia insiste que o único motivo para ter enviado centenas de tanques e milhares de soldados ao território secessionista da Ossétia do Sul e, depois, ao território da Geórgia, era impedir uma "limpeza étnica" e uma catástrofe humanitária. Moscou acusa as Forças Armadas da Geórgia de causarem 1.600 mortes entre os civis locais e expulsar 30 mil refugiados para a Rússia, em um ato que o chanceler russo, Sergei Lavrov, chama de "genocídio".
O "deliberado extermínio de uma raça" não é o que aconteceu ou está acontecendo na Geórgia, mas o conceito de limpeza étnica é vital no argumento da Rússia para justificar sua "intervenção humanitária", ao equipará-la com a ação da Otan, aliança militar ocidental, em Kosovo, em 1999.
Não há dúvidas de que milhares de refugiados buscaram na a Rússia proteção contra as incursões militares da Geórgia contra as forças da Ossétia do Sul, e centenas podem ter sido mortos, embora não haja dados independentes sobre vítimas.
Agora, a Geórgia está alegando que uma "limpeza étnica" em reverso está em curso, com milicianos da Ossétia do Sul atacando aldeias habitadas por pessoas de etnia georgiana e expulsando seus moradores.
"Trata-se de uma catástrofe humanitária que se desenrola diante dos olhos do mundo, e não em um lugar muito distante", disse o presidente georgiano Mikhail Saakashvili. "Está acontecendo na Europa." Ele apelou por um imenso esforço humanitário da parte dos EUA e da União Européia a fim de ajudar na crise de refugiados.

Extrapolação
O Alto Comissariado da ONU para Refugiados estima que 100 mil pessoas fugiram dos dois lados do conflito. A agência não usa termos inflamatórios como "limpeza étnica".
Mas está claro que, na colcha de retalhos étnica da Ossétia do Sul, com aldeias majoritariamente georgianas e aldeias onde ossetianos predominam, é isso que está acontecendo. O medo dos georgianos levou os ossetianos para o norte, e agora milícias ossetianas forçam os georgianos a fugir para o sul.
O primeiro relatório independente compilado no local, publicado ontem pela ONG Human Rights Watch, cita "aldeias georgianas ainda queimando com incêndios ateados por milicianos da Ossétia do Sul", e testemunhas de saques feitos pela milícia. Também menciona relatos de aldeões ossetianos que fugiram dos soldados da Geórgia nos primeiros dias do conflito.
Falando em particular, altos funcionários russos admitem ser impossível impor a paz imediata devido às relações étnicas voláteis na região. "As pessoas estão fugindo por medo", diz a ONU. "Há postos de controle russo nas estradas. O medo faz com que as pessoas se movam."
"A relação entre Rússia e Geórgia jamais caiu a ponto tão venenoso. Mas são as relações nas regiões em conflito que sofrerão mais", diz Magdalena Frichova, do International Crisis Group, no site da BBC. "A Ossétia do Sul foi dilacerada."
Ambos os lados trocam acusações de atrocidades em massa. Em escala mundial, o número de mortos e refugiados é baixo. Mas para a Geórgia, um país de 4,6 milhões de habitantes, os números são imensos, e as conseqüências, devastadoras.


Tradução de PAULO MIGLIACCI

NA FOLHA ONLINE
www.folha.com.br/082212

especial sobre a Ossétia do Sul


Texto Anterior: Putin assume comando de longo projeto de vingança contra o inimigo Saakashvili
Próximo Texto: Ásia: Líder de Khmer Vermelho vira réu no Camboja
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.